Aproveitando que estamos em época de Feira do Livro de Lisboa, quero falar-vos – precisamente – de livros; de livros, da escrita, dos leitores e dos escritores…
Gostaria muito que este meu discurso fosse doce, apaixonado e inebriante, como alguns que tenho lido, mas não sei se o será. Quando me pergunto porque penso assim, a resposta surge-me numa interrogação:
Será porque o amor, e paixão pelos livros, até ao momento, não é correspondido?
Mas porque falo, eu, em amor não correspondido?
Um livro é escrito por um escritor, mas até ser lido não se cumpre; um livro só se cumpre com a leitura e, por consequência, com um leitor. E, também por consequência, um escritor só se realiza com a leitura dos seus livros e com o despertar de emoções que as suas histórias geraram. Até este ciclo se completar, o livro pouco mais é do que um texto e o escritor não passa de um redator, um rabiscador, alguém que investiu anos a garatujar uma história que apenas poderá viver nas emoções de quem a leia.
Por isso, o amor de um escritor pela escrita só será correspondido pelo amor do leitor por essas mesmas histórias…
Terá o leitor consciência disto?
Eu acho que maioria dos leitores não tem. A maioria dos leitores não concebe a torrente de emoções que nos atravessa – a nós, escritores – quando escrevemos aquilo que eles leem; e, muito menos, a quantidade de vezes que refizemos um determinado parágrafo para que ele soasse daquela maneira e retinisse, em quem o lesse, daquela forma específica. Não me estou a queixar… Isto faz parte do processo e da paixão da escrita; dar forma ao texto para que quem o leia possa ter a melhor das experiências. E isto é, também – e, até, principalmente -, respeitar o leitor.
Não acho que esse respeito seja recíproco.
Às vezes, tenho a sensação de que a maioria das pessoas – e leitores incluídos – acha que escrever livros é fácil; afinal, todos – ou quase todos – sabem escrever. E, por consequência desta crença, escapa-se-lhes a intensidade quântica de emoções que une aquelas letras, palavras, frases, parágrafos e capítulos numa rede etérea que toma a forma de uma história e que os arrebata da realidade através de um livro
Um livro é um objecto mágico que nos teletransporta para outras vidas, realidades e – às vezes – mundos; e tudo se passa na nossa cabeça. E o escritor é o mago que torna isso possível… O mundo dos livros devia rodar à volta do escritor; quanto mais não seja, porque sem escritores não há livros.
Por vezes, penso que esta realidade poderá mudar; porque – inevitavelmente – todos os amores não correspondidos terminam; terminam como estertor de uma brasa incandescente num jorro de água, quando se encontram outros amores… Mas depois, quando penso nisso, quando pondero na possibilidade de deixar a escrita por não me sentir amado da mesma forma que amo, penso que isto não passa do eco de uma revolta juvenil, porque – por muito que procure – não encontro esse outro amor onde me possa queimar.