EnglishFrenchGermanItalianPortugueseSpanish
EnglishFrenchGermanItalianPortugueseSpanish

O que faz um filme ser esquecido? Como impedir que isso ocorra? (À guisa de reflexão ativa, mais uma vez, com base num título argentino contemporâneo)

O que faz um filme ser esquecido? Como impedir que isso ocorra? (À guisa de reflexão ativa, mais uma vez, com base num título argentino contemporâneo)

Na quadragésima quarta edição do Festival de Cinema de Gramado, que ocorreu entre 26 de agosto e 03 de setembro de 2016, o longa-metragem argentino “Guarani” (2015, de Luis Zorraquin) recebeu três importantes prêmios: Melhor Longa-Metragem Latino, em 35 mm; Melhor Ator (para Emilio Barreto); e Melhor Roteiro. Apesar dos elogios da crítica e das láureas recebidas, este filme foi insuficientemente visto, confirmando algo que alguns espectadores descrevem como uma “maldição”: obras mui aplaudidas em festivais independentes tendem a não serem tão comemorados, quando conseguem estrear comercialmente. Como podemos impedir que isto lancine a trajetória de obras autoralmente relevantes?

Quase uma década depois, Luis Zorraquin finalizou outro longa-metragem, “Vinchuca” (2024), mas este não alcançou uma recepção tão entusiasmada quanto a de seu filme anterior. Num debate sobre a obra, que participou da seção competitiva de longas-metragens da vigésima quarta edição do CURTA-SE, Festival Ibero-Americano de Cinema de Sergipe, ocorrido em novembro de 2025, o realizador comentou que pressente que a sua obra será esquecida, que este filme tende a desaparecer. O que faz com que ele pense isto?

Iniciamos a averiguação de hipóteses a partir de aspectos extrafílmicos, comentados no supracitado debate pelo realizador e pelo co-produtor brasileiro Bruno Autran, que trouxeram à tona dificuldades de financiamento, advindas de conformações políticas — associadas às restrições de direita – em ambos os países, Argentina e Brasil. Segundo as falas dos responsáveis pelo filme, houve diversas alterações de montagem, entre a primeira conformação do roteiro e a duração final do longa-metragem, que, segundo o diretor, tem a intenção de ser direcionado aos espectadores mais jovens, com vistas à conscientização quanto às sequelas da violência associada ao narcotráfico no cotidiano juvenil.

Protagonizado por um inspiradíssimo ator adolescente, Fernando Vergara — que aprendeu a dançar, para compor o seu personagem, Nelson —, “Vinchuca” é assim intitulado porque associa as habilidades do protagonista na invasão de residências à letalidade do inseto barbeiro, transmissor da Doença de Chagas. O diretor e roteirista estabeleceu uma metáfora entre esta doença e a própria violência do narcotráfico, que atormenta historicamente a América Latina. Numa das sequências iniciais, Nelson brinca com um barquinho eletrônico, num rio, ajudando a repassar substâncias ilícitas de um espaço para outro, intentando, assim, conseguir comprar um novo par de sapatos, para que possa ensaiar os seus passos de dança. Ao ser apreendido pela Polícia, Nelson é treinado por um par de policiais para aproximar-se das filhas de um traficante e, assim, ajudar a desbaratar as suas operações ilegais.

Vivendo com o embrutecido Gustavo (Marcelo Savignone) por alguns dias, Nelson — que se ressente do abandono de seu pai – tenta estabelecer com este policial uma relação paterno-filial, rejeitada pelo mais velho, por causa de traumas familiares pessoais. Quando as filhas do traficante Jara (Rafael Sieg) entram em cena, o filme muda de tom bruscamente, convertendo-se numa trama sobre fugas pouco verossímeis, e evidenciando alterações insatisfatórias no roteiro (co-escrito por Laura Ávila), que têm a ver com gritantes lacunas composicionais. Exemplo: o desleixo quanto aos aspectos relacionados à pandemia da COVID-19, que, numa locução radiofônica, desencadeia a suspensão das aulas escolares, mas, de repente, parecem não ter mais nenhuma repercussão efetiva. Se a fotografia do filme, a cargo de Edu Rabin, é primorosa, a trilha musical de Pedro Sampaio parece competir com as imagens, sendo excessiva e quase onipresente. A direção também revela algumas imperfeições gritantes, que estragam o resultado geral do filme. Isto é motivo para que o negligenciemos? As irregularidades produtivas e os defeitos de execução de uma obra são justificativas suficientes para que uma obra seja esquecida? Cabe a nós, por parte da crítica e enquanto espectadores, garantir sobrevida a produções inicialmente incompreendidas e/ou vitimadas por aspectos exteriores de produção. Se puderem, portanto, vejam e reajam a este filme. E sigamos firmes no propósito político-humanista dos debates artísticos!

Wesley Pereira de Castro.


Fonte da imagem disponível em: https://www.iaavim.gob.ar/wp-content/uploads/2025/09/portada-vinchuca-web.jpg

Descarregar artigo em PDF:

Download PDF

Partilhar este artigo:

Share on facebook
Facebook
Share on twitter
Twitter
Share on linkedin
LinkedIn
Share on email
Email

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado.

LOGIN

REGISTAR

[wpuf_profile type="registration" id="5754"]