ESCUTANDO OS VAGIDOS DO FETO.
O Conhecimento –
O conhecimento, o saber, que representa muitas coisas, desde poder à diversão, desde viver bem às realidades paralelas, contendo tudo que há no mundo nesta rubrica, porque nem mesmo poderíamos estar discutindo essa ideia se dela não soubéssemos, se não tivéssemos conhecimento de suas múltiplas implicações, pois que o homem, desde sempre, procurou saber, procurou o saber, inclusive para isso desobedecendo ao próprio Deus.
Esclarecedor quanto a esse processo é o poema “Princípio”, que foi anunciado como indo fazer parte das Enéadas, que afinal não integrou, Enéadas, este conjunto de nove novenas em que Blanc de Portugal, tão possuído do nove começa com a palavra Maianga que é um dos nove municípios de Luanda, eis a mística, onde a ignorância local merece o reparo fatal do poeta: ” …cidade sem fontes…” que é para indagarmos: Onde se irá beber? E onde não se bebe não há vida… Africa que cria outra alma no poeta, como o Brasil que ainda outra alma sua, mas vamos ao “Princípio”:
“Tudo era sem nome do que hoje sabemos
Tudo era o que era e não palavras
Signos ou sinais
Não faziam de coisas
A Poesia era e nada mais.
Em tempos que hão-de vir a criação reinava;
a fábrica do mundo resfolegava
E eu
Homem,
Sonhava, dormia e contava (*)
Não escrevendo poemas mas enumerando
Tudo o que era e nada mais.
Vi criar-se o mundo e voltando a hoje
esse futuro é já o meu passado.”
(*) Creio ser cantava e não contava.
A morte –
Temos então que esse “saber conhecer” a que José Blanc de Portugal se refere e nos explica ser ” um método de trabalhar para chegar ao saber puro.” completando: ” Não se trata de uma coisa em si, mas antes de um operador.” E o operador é o que promove o processo, princípio e fim, pois conjuga todo o sistema, e o realiza, o manifesta e o conclui. Maravilha das maravilhas, síntese de entendimento, perfeita compreensão, mas que fica sujeita, como tudo, às circunstâncias, e a circunstância central do homem é seu grau de liberdade para entender, porque somos prisioneiros de muitas limitações no processo de entendimento, e entender exige liberdade, liberdade para aceitar, liberdade para se sintonizar, porque todo o processo lida com energias muito finas, as mais difíceis de alcançar, liberdade de se elevar a altura do conhecimento que se vai revelar, e quando se lida com o desconhecido é absolutamente necessário elevação para aceitar o que virá, e não podemos estar presos a um entendimento restrito, a uma percepção restrita, a uma realidade restrita, essa da cidade que todos os dias construímos. Blanc de Portugal nos lembra; “Uns pensam que a vida acaba com a morte; outros consideram que só depois dessa passagem de estado possuirão o conhecimento que procu(ra)ram durante toda a vida.” E entre uns e outros reside o mistério, essa componente que nublando as coisas, as esclarece, porque seu esclarecimento reside mesmo em sua ignorância. É como a morte, todos que a conheceram não contam os seus detalhes, ou sua forma de ser. Essa afirmação do poeta revela sua fatal e total fidelidade a esse princípio que é o fim de todas as coisas, pois mesmo nas notas que deixou, porque quiz pôr em palavras os sentimentos que o atravessavam no último dia do ano de 1992, o ano da morte de sua companheira de toda a vida, Helena, a mulher que, sabendo ser maior, soube o aceitar e compreender, com suas inquietações, exasperações e desvios, bem como com sua grandeza, sua calma e sua preguiça, numa totalidade que o poeta soube reconhecer, e diz nesta nota, quatro pedacinhos de papel rabiscados com verdades tão eternas, como uma confissão: …” Jamais acreditei em ateus totalmente incrédulos. Tenho a firme certeza de que jamais existiram. Se chamarem aos dois acontecimentos (a morte da companheira e a estréia da neta) de que deixo aqui notícia, chamar-lhe-ão, porventura, mera coincidência. Mas como explicam as origens dessa “coincidência”? Lutamos para compreender que não há mal que não contenha bem. Ou, não haveria bem (e grifa essa palavra) distinguível se não houvesse o que classificamos de mal (e grifa também essa última palavra).” É um entendimento fiel ao “saber conhecer”, porque o aceita de livre vontade, em perfeita sintonia e porque se eleva a altura do conhecimento revelado. Vejamos então sua tradução (através de Shibata) do Sermão sobre o Zen de Tetsungen (1630 – 1682) que são as estrofes 53 e 54 de seu livro assim simplesmente intitulado: “Estrofes”.
“53. Çakia (III)
Fugindo um instante à dualidade eternamente
Do visto e do que não se vê/…./
14. VI. 78
54. Çakia (IV)
Do Universo as aparências transformadas
São olhos:
Céus e Terra manifestam
a Lei Essencial (1)
Se um instante e para sempre abandonamos a dualidade
do visto e do que se vê
O mundo da lei sem limites
É a sabedoria
14. VI. 78
(1) Invisível fundamental “
A Lei Essencial à qual o poeta manteve-se fiel até o fim, o “saber puro” a que se referia, fazendo de sua vida o processo “operador”, por isto afirma na Estrofe 46:
“Não foi completa a libertação
mas um dos ínvios caminhos para ela…
lembrar o ontem é retrogradar…
Acabo de ouvir pela TV
a missa de Coja-Arganil:
Ligo-me a um universo por sua vez
parte do Universo Omnipotente Omnipresente
Bem sei que continuo um campo de ruínas
mas campo de ruínas é Roma eterna
e todas as ruínas são base
do chão que habitamos ou espezinhamos
O teu coração está onde puseste o teu tesouro”…
A vida –
Poderá haver coisa que, ao memo tempo seja tão limitadora, porque nos prende à realidade, e seja também mais inebriante, porque nos propões todas questões, que a vida? E depois de falar dos tempos, que anagrama com a fé do momento, sexta novena das Enéadas, pois que todos existimos em momento próprio, segue com “o tempo de trovões distantes” para revelar: “A LUZ IGNORADA”.
” Verde, verde, a paisagem verdemente foge
e o céu pesado alumiado a trovoadas
esconde o sol apaga o fogo e arrefece o sangue.
Macio o tempo de trovões distantes.
Esquece-me, esquece-me ave infanda.
Os navios d’água entram nos portos
abertos no céu a golpes de faísca
e numa luz maior
o negro da pega fatal
bebeu a luz inteira.
Falou:
– Que queres te dê eu que não conheças?
Disse:
– A luz que deixares quando te fores.
Foto de capa D.R. Ana Maria Portugal (retrata José Blac de Portugal)
3 respostas
Foto de capa de autoria de Ana Maria de Portugal, já publicada várias vezes no facebook.
Gosto da apreciação que Helfer Do Coutto faz sobre a poesia do meu pai mas não admito que aqui seja publicada qualquer obra “dita inédita” sem a utorização da família.
Que isto fique claro!
Nonguém escreve obra ou parte dela, que ainda nem sequer tem direitos de autor!
Nunca autorizei ninguém a piblicá- la.
Todos sabem que só publicarei algo meu depois da reedição completa da obra do meu pai.
Cara Ana Maria Portugal, pedimos desculpa pelo incómodo e pelo inconveniente. Iremos solicitar ao autor que adapte o artigo, eliminando a transcrição da referida obra não autorizada. Se tal não for possível, iremos proceder à eliminação do artigo. Lamentamos o transtorno e esperamos a sua compreensão, porque acreditamos que o autor agiu boa fé, a fim de valorizar e divulgar a obra de José Blanc de Portugal. Destacamos que somos um projeto sem fins lucrativos cujo objeto é a divulgação do pensamento em Língua Portuguesa, convidamo-la a acompanhar a nossa página. Iremos proceder em conformidade, no decorrer desta semana. Atentamente, Equipa Editorial
Ana Maria, como foi você que me deu o texto do Sr. Seu pai, peço que me dê também a autorização de o publicar, para que este não se perca. Os textos devem estar publicados para que cumpram a vontade de seus autores, ou seja, que se dêem a conhecer. O que não retira por duas gerações (70 anos) o Direito dos herdeiros. Respeitando seu zelo, gabando sua luta para manter viva a memória de seu pai, peço que entenda essa publicação como um esforço meu em preservar a memória de José Blanc de Portugal. Atentamente, Helder Paraná Do Coutto.