“Eis o que eu desgosto nas bichas: elas não conseguem ficar apenas na amizade!”: um lamento sobre esnobados do Oscar 2025

Protagonizado pelo astro Daniel Craig, que interpreta uma versão ficcionalizada do escritor William S. Burroughs [1914-1997], autor do romance homônimo original, “Queer” fala sobre um período em William Lee refugiou-se no México, em busca de amor e das possibilidades telepáticas de uma planta alucinógena encontrada no Equador. Viciado em heroína, William Lee passa as tardes flertando com desconhecidos (um deles é o cantor Omar Apollo, que não tem pudor em se desnudar por completo), nas ruas latino-americanas, e fica obcecado por um jovem soldado expatriado, Eugene Allerton (Drew Starkey). Este alega não ser homossexual, mas permite que William lhe faça sexo oral, além de autorizar parcialmente as suas demonstrações excessivas de afeto. Até que o mais velho convida o mais novo para viajar consigo através de alguns países da América do Sul…

É preciso um intervalo num filme com mais de três horas de duração para constatar que “este país [EUA] está podre”? (Algumas observações sobre a safra Oscar 2025)

Tudo em “O Brutalista” (2024, de Brady Corbet) é tão ambicioso quanto o projeto arquitetônico em que os personagens se envolvem, e que desembocará num epílogo estranhíssimo, que desagradou diversos espectadores, pela maneira opulenta com que expõe uma espécie de autocrítica em relação ao que é retratado: há como justificar o sobejo de vaidade, mediante efetividade das obras produzidas? Talvez o filme pergunte muito mais do que responda, não obstante ele incorrer em constrangedores instantes quase telenovelescos…

Se o dissenso é tão importante, por que a dificuldade em aceitar críticas divergentes? [Ou: quem recebe um prêmio, nem sempre é o melhor em competição!]

Abordamos o caráter metonímico de um importante festival local, o CURTA-SE, Festival Íbero-Americano de Cinema de Sergipe, que, em sua vigésima terceira edição, ocorrida entre os dias 13 e 15 de janeiro de 2025, movimentou a cinefilia do menor Estado do Brasil. Não obstante a exibição de filmes interessantes, o anúncio da premiação, na derradeira noite do evento, deixou alguns espectadores frustrados, no sentido de que os seus favoritos não foram laureados, o que, mais uma vez, acontece: premiações levam em consideração critérios subjetivos – e, tal como acontece no Oscar, no Festival de Cannes ou em qualquer mostra artística, a lista de premiados traz consigo algumas reações revoltosas, principalmente quando os prediletos são menosprezados. Diferentemente da lógica esportiva, nesse tipo de situação, os critérios são bastante complicados…

“My English is not good. But my soul is better”: alguns comentários sobre a premiação do Globo de Ouro, em 2025…

A frase aspeada, neste título, foi pronunciada pela atriz brasileira Fernanda Montenegro, em 24 de janeiro de 1999, quando ela manifestou o seu contentamento pelo Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro, entregue ao já clássico “Central do Brasil” (1998, de Walter Salles). Mais de vinte e cinco anos depois, na mesma premiação, Fernanda Torres, filha da referida personalidade, recebe, na noite de 05 de janeiro de 2025, o prêmio de Melhor Atriz Dramática pelo filme “Ainda Estou Aqui” (2024, de Walter Salles). O diretor é o mesmo, em ambos os longas-metragens, o que chama a atenção para uma questão referente à influência de determinados cineastas em premiações internacionais.

“Eu não entendo a geração de vocês, é tudo TikTok, Instagram…”: uma metonímia para o cinema norte-americano, em 2024

Se, na maior parte de suas duas horas e dezenove minutos de duração, “Anora” (2024, de Sean Baker) possui um ritmo frenético e consciencioso do término anunciado de seu transe efusivo, no desfecho, ele revela-se uma obra incrivelmente adulta, tal qual o faz-tudo armênio Toros (Karren Karagulian) requer para si mesmo, à guisa de alcunha, ao expor para Ani as incongruências das promessas feitas por Ivan, na ocasião do supracitado casamento. Mesmo que o filme não seja a obra-prima que muitos anunciaram, “Anora” conquista-nos pelo respeito direcionado a personagens que noutras obras hollywoodianas, seriam julgadas por seus atos afobados.

“— Quando um homem não enfrenta a guerra, ele é um covarde… — Se mais homens fossem covardes, não existiriam guerras!”: vamos falar sobre a temporada hollywoodiana de premiações cinematográficas?

Enquanto não saem as indicações oficiais ao Oscar 2025, e alguns fãs dos filmes listados digladiam-se como se estivessem representando torcidas de futebol – o que, em nossa opinião, é inadequado no cotejo entre obras de arte –, outro longa-metragem que surge como potencialmente favorito na categoria Melhor Filme Internacional é o italiano “Vermiglio” (2024, de Maura Delpero) que, tal qual “Ainda Estou Aqui”, estreou no Festival de Cinema de Veneza. Enquanto o filme brasileiro foi premiado com a láurea de Melhor Roteiro, “Vermiglio” recebeu o Leão de Prata (ou Grande Prêmio do Júri), além de outros prêmios setoriais – como “Melhor Filme Italiano” em competição, por exemplo.

Temos um Melhor Filme do Ano? (Um texto enquanto despedida subjetiva – ao menos, por enquanto)

Nas mais de três horas de duração de “RRR: Revolta, Rebelião, Revolução”, o espectador não tem tempo para ficar entediado: o filme é tecnicamente irrepreensível e fascinante em suas pulsões genéricas assaz exageradas. As intervenções musicais são acachapantes e os momentos de embate são estrondosos: o filme é superlativo em termos fotográficos, sonoros, directivos, actanciais e discursivos (vide o modo imponente como a bandeira indiana surge, em mais de uma seqüência). Os efeitos visuais são esplêndidos – havendo um aviso inicial de que os animais que aparecem em cenas de lutas foram inseridos digitalmente. Trata-se de uma grata surpresa, que, no momento em que escrevo estas linhas, configura-se como o melhor filme contemporâneo visto em 2022.

Final de ano cinéfilo (ou de quando as nossas lembranças e sonhos confundem-se com os filmes que vemos)…

“Aftersun” (2022), longa-metragem de estréia da escocesa Charlotte Wells, foi um dos filmes mais incensados em 2022, tendo recebido algumas láureas no Festival de Cannes e na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, entre outros prêmios. Além de ter seus direitos de exibição adquiridos pelo serviço de ‘streaming’ Mubi, este filme estreou em salas de cinema no derradeiro mês do ano, de modo que será lembrado nas listas individuais de muitos cinéfilos.

Acerca dos gritos de “Fora, Bolsonaro!” no Festival de Cinema de Gramado: quando a Arte vence, há resistência!

Os discursos dos premiados foram unânimes no repúdio ao atual presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que desvaloriza a diversidade cultural do país em suas intervenções de extrema-direita. A quase totalidade dos profissionais que foram focalizados pelas câmeras que transmitiam o evento foram flagrados difundido o seu apoio ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva, o que é metonimizado através de um gesto com as mãos, que imita a letra L.

“Quando eu paro de pensar no futuro, eu volto ao presente”: sobre as verdades que precisam ser vistas, ouvidas e sentidas!

Quem pôde participar da conferência de imprensa que anunciou a programação do festival É Tudo Verdade, assistiu em primeira mão a “Diários de Mianmar” (2022), documentário creditado ao Coletivo Cinematográfico de Mianmar (antiga Birmânia), e que foi recentemente premiado no Festival Internacional de Cinema de Berlim. A opção pela ausência de créditos individuais tem a ver com as perseguições sofridas por quem ousa documentar os abusos de poder cometidos pelo general Min Aung Hlaing, que tomou definitivamente o poder no país, através de um golpe de estado, em 01 de fevereiro de 2021.

“Qual é o formato de teu pénis?” ou de como os (pós)adolescentes norte-americanos tornam-se empreendedores do amor!

Reconfigurando elementos e recursos narrativos que foram adotados em “Embriagado de Amor” (2002) e “Vício Inerente” (2014), obras que alguns cinéfilos consideram atípicas em sua coerente filmografia, “Licorice Pizza” passa-se no Vale de São Fernando, região de Los Angeles em que o diretor cresceu e que ficou famosa pela produção de filmes pornográficos. Estamos em 1973, e os longas-metragens de sexo explícito começam a invadir as salas tradicionais de cinema. É nesse cenário que conhecemos os dois protagonistas.

“Nada é justo neste mundo!”: alguns breves comentários sobre os indicados ao Oscar 2022 (com ênfase num filme iraniano esnobado – e outrora favorito)

Para muitos espectadores, a não indicação do filme iraniano “Um Herói” (2021, de Asghar Farhadi) foi surpreendente, já que ele foi lembrado em diversas listas de melhores do ano, além de ter recebido o Grande Prêmio no Festival de Cannes. Vale ressaltar que este cineasta já recebeu dois prêmios Oscar de Melhor Filme Internacional, pelo excelente “A Separação” (2011) e pelo mediano “O Apartamento” (2016).

“Quando meu pai morreu, eu não queria nada além da felicidade de mamãe”, ou a masculinidade enquanto promessa de violência!

Neste seu mais recente filme, adaptado de um romance de Thomas Savage publicado em 1967, a diretora opera uma guinada centrípeta, de modo que as ações dos personagens – ou, mais precisamente de um coadjuvante que revela-se o imperioso protagonista, ao assumir-se como narrador – são direcionadas à apropriação do ambiente doméstico, numa imponente fazenda de Montana, em 1925. Devido à sua extrema habilidade e à percuciência no desenvolvimento das relações entre os personagens, Jane Campion recebeu o prêmio de Melhor Direção no Festival Internacional de Cinema de Veneza, além de tornar “Ataque dos Cães” (2021) um dos filmes favoritos dos cinéfilos neste ano.

“Teu espanhol é suficiente bom para a poesia”: ruídos cinematográficos através dos tempos (e espaços) cosmopolitas da Arte

Sobre o mais recente filme de Apichatpong Weerasethakul, convém acrescentar que, de fato, a sua proposta extremamente sensorial requer um espaço de exibição adequado à total imersão do espectador. Se há uma produção cinematográfica que faz jus, hoje em dia, ao célebre ditado do filósofo Heráclito de Éfeso [540 a.C. – 470 a.C.], que prediz que “nenhum homem pode banhar-se duas vezes no mesmo rio, pois, na segunda vez, o rio já não é o mesmo, nem tampouco o homem”, esta é, sem dúvida, “Memória”. Em tese, isso vale para qualquer situação artística, mas o despejo de genialidade que o diretor aplica neste filme valida tal menção hiperbólica: afinal, ele consegue dirigir até mesmo as nuvens!

Em qual situação “um distintivo é mais assustador que uma arma”? Pensaram no racismo?

A biografia do líder dos Panteras Negras no Estado de Illinois é contada numa narrativa que mescla o gênero policial com os rompantes de drama familiar. O protagonista é personificado com uma intensidade mui aplaudível, de maneira que todo e qualquer prêmio que Daniel Kaluuya receber por este papel é deveras merecido. Mas a contrapartida actancial de Lakeith Stanfield é ainda mais drástica: afinal, ele interpreta alguém que está interpretando um papel, de modo que o agente do FBI Roy Mitchell (Jesse Plemons) chega a comentar, após observar o seu comportamento gregário: “tua interpretação merece um Oscar”.