“Não sou eu que dirijo os teus sonhos”: “tu te elevas ao receber o amor de uma pessoa morta?”


Em “Não Sou Eu”, Leos Carax compartilha bastante: a despeito de seu título negativo, trata-se de um filme positivamente confessional, em que ele ousa insinuar a possível colaboração nazista de seu pai, Georges Dupont, e se compara ao polonês Roman Polanski, já que ambos são “cineastas e baixinhos”, sem obliterar que este realizador é condenado pelo estupro de uma menor de idade, na década de 1970. Por mais que o diretor afirme a sua predileção pelos planos “já vistos”, esta autobiografia não convencional surpreende pela criatividade, ainda que não esconda o parentesco com a filmografia de Jean-Luc Godard [1930-2022], de quem Leos Carax é admirador confesso.
“Loucura, loucura, loucura, loucura, loucura. Doença, doença, doença… Caixa d’água!”: é lícito que um realizador escreva elogiosamente acerca de sua própria obra?


Sem ter a intenção de responder ao que foi perguntado, mas de estimular o debate sobre a capacidade de um diretor tornar-se espectador apaixonado daquilo que efetivou, trazemos à tona o célebre exemplo do cineasta Neville D’Almeida, que, ao ser questionado sobre qual seria o seu filme favorito de todos os tempos, não titubeia: “Rio Babilônia” (1982, de Neville D”Almeida). E ele explica os porquês de amar tanto o próprio filme, no sentido de que, quando o revê, assiste a exatamente aquilo que desejou filmar. Faz sentido a apreciação, portanto? Para muitas pessoas, isso seria um indicativo de extrema vaidade. Qual seria a maneira menos problemática de demonstrar afeto por algo correspondente àquilo que foi intentado, em âmbito artístico/discursivo?
“Antigamente, eu conhecia todo mundo; hoje em dia, quase ninguém”: o que será que mudou, depois que acabou a pandemia?


Ainda que ‘Tempo Suspenso” (2024, de Olivier Assayas) funcione como uma válida autocrítica acerca de como o diretor e seus amigos desenvolveram comportamentos obsessivos a partir da reiteração midiática do pavor de contágio, os diálogos não são tão inspirados quanto noutras produções do realizador: o desfecho é deveras anticlimático, resvalando numa lógica meramente explicativa de como funcionam as heranças familiares, que vai na contramão do que é exposto no impressionante “Horas de Verão” (2008), para ficar num contraponto imediato, quase invertido, em seu espelhamento contextual.