“Quando passar o estado de choque, será algo atroz!”, ou de como a ansiedade cinéfila provoca atropelos…


Se a trama de “Sirât” aprisiona o potencial desta obra em certas convenções narrativas, no que tange à temática da reconciliação e na lida lisérgica com os sentimentos de luto e perante as injustiças contemporâneas, soa muito problemático que o roteiro – escrito pelo próprio diretor, em parceria com o argentino Santiago Fillol, seu colaborador habitual – acate as justificativas pretensamente despolitizadas daqueles personagens, através do pretexto simplista de que “já estamos vivenciando o fim do mundo”, conforme eles dizem em reação à transmissão apocalíptica de uma emissora de rádio.
É válida uma cobertura de festival baseada em apenas metade da programação vista? Por que torcemos por obras específicas em premiações?


Neste texto, comentamos algumas experiências vivenciadas na quinquagésima oitava edição do Festival de Cinema Brasileiro de Brasília, que ocorreu entre 12 e 20 de setembro de 2025. Esta última data corresponde à noite de premiação, em que serão conhecidos os filmes eleitos pelos jurados e público presente nas diversas seções competitivas do evento. Porém, a lista de laureados não esgota o interesse no que foi visto, pois quase uma centena de produções, entre curtas e longas-metragens, foi exibida na edição atual deste festival, vários deles em mostras paralelas e não competitivas.
Se o dissenso é tão importante, por que a dificuldade em aceitar críticas divergentes? [Ou: quem recebe um prêmio, nem sempre é o melhor em competição!]


Abordamos o caráter metonímico de um importante festival local, o CURTA-SE, Festival Íbero-Americano de Cinema de Sergipe, que, em sua vigésima terceira edição, ocorrida entre os dias 13 e 15 de janeiro de 2025, movimentou a cinefilia do menor Estado do Brasil. Não obstante a exibição de filmes interessantes, o anúncio da premiação, na derradeira noite do evento, deixou alguns espectadores frustrados, no sentido de que os seus favoritos não foram laureados, o que, mais uma vez, acontece: premiações levam em consideração critérios subjetivos – e, tal como acontece no Oscar, no Festival de Cannes ou em qualquer mostra artística, a lista de premiados traz consigo algumas reações revoltosas, principalmente quando os prediletos são menosprezados. Diferentemente da lógica esportiva, nesse tipo de situação, os critérios são bastante complicados…
“Eu estava muito ocupada. Por isso, desenhei em cinco minutos”, ou: o que esperar de um novo ano?


De que adianta ficarmos quantificando os filmes que vemos, os livros que lemos, ao invés de efetivamente apreciá-los? Tudo bem que, na maior parte das situações, isso advém de exigências externas, vinculadas ao agendamento midiático. Mas… Será mesmo que não dispomos de outras opções procedimentais, na execução daquilo que nos compete funcionalmente, em obrigações hebdomadárias, como a desta coluna, por exemplo? No filme “Look Back” (2024, de Kiyotaka Oshiyama), há uma situação em que uma personagem reclama que está entediada de tanto conceber mangás: “passo o dia inteiro desenhando-os e, mesmo assim, estou sempre longe de terminá-los. Prefiro voltar apenas a lê-los!”. Mais uma vez, não é casual que as interrogações estejam tão abundantes neste texto: elas converter-se-ão em ações.
Título não autorizado nº2


Urge recomendarmos um filme romeno que aborda algumas questões através de um necessário filtro político, evidenciando que tudo o que fazemos – até mesmo na esfera privada – possui repercussões públicas, podendo desencadear violências e agressões: dirigido pelo estreante Eugen Jebeleanu, Câmp de Maci [2020, traduzido internacionalmente como “Poppy Field” (“Campo de Papoulas”)] traz à tona reflexões morais que ultrapassam a identificação imediata com as causas homossexuais. Fala sobre um tipo de repressão que, a partir do fingimento “corretivo”, destroça toda a sociedade.
Algoritmos da podolatria no fim de eras: a paixão melancólica enquanto estilo cinefílico confessional!


Se Quentin Tarantino efetivamente glamoriza a violência, isto ocorre enquanto obediência a convenções particulares de gênero cinematográfico e não como reflexo de um testemunho moral. E nisso reside uma das grandes forças da obra-prima de maturidade e reflexão cinéfila realizada por este grande reinventor hollywoodiano: a consecução – não necessariamente voluntária – de um preceito sugerido pelo filósofo Gilles Deleuze [1925-1995] quanto ao enfrentamento do fascismo midiático.
Provoca(a)ções: O que é isso de crítica construtiva?Talvez…


Quando falho, sinto um desamor por mim próprio, uma falta de valorização pessoal, uma desmotivação para continuar um caminho que só a mim pertence.
Deontologia da crítica anti-recomendativa: a perfídia em forma de mau documentário!


A despeito de quaisquer juízos de valor sobre o delicado tema do abuso sexual de menores – e, infelizmente, tudo leva a crer que o cantor realmente tenha cometido vários dos crimes dos quais foi acusado – este filme opta pelos mais nojosos estratagemas de condução espectatorial. Técnica e eticamente, “Deixando Neverland” soçobra em seu tom revanchista e em sua pusilânime unilateralidade expositiva de fatos anteriormente negados em julgamentos públicos.
Quando ver um filme torna-se uma necessidade sociológica ou a falibilidade proposital das convenções de gênero como evento (auto)crítico


Ao final da sessão, não faltarão hordas de espectadores e/ou críticos que apressar-se-ão em “explicar” os significados ocultos do versículo bíblico reiteradamente apresentado ao longo da projeção, o décimo primeiro versículo do capítulo 11 do livro de Jeremias, que prediz: “portanto, assim diz o Senhor: eis que trarei mal sobre eles, de que não poderão escapar; e clamarão a mim, mas eu não os ouvirei”. O que este vitupério acrescenta à nossa leitura alardeada de um dos filmes mais fascinantes deste ano recém-iniciado?
A arte de Eugène Green, ou os filmes que devem ser vistos por quem está se sentindo cansado…


Em sua utilização tramática de um rigoroso cabedal artístico, o cinema maiúsculo de Eugène Green talvez apresente um recorte mui privilegiado da ‘intelligentsia’, oportunamente (auto)criticado em “A Ponte das Artes”. Mas ele não é excludente. Muito pelo contrário, ele convida, ao inebriar-nos. Fica a proposta discursiva, portanto.
Reflexão (auto)crítica – ou por que precisamos falar sobre a Netflix, mas não somente sobre a Netflix!


Não é necessário assistir ao filme para sabermos como ele terminará e/ou será conduzido enredisticamente: ao promulgar uma rejeição chistosa da suposta falta de criatividade dos roteiros mais tradicionais do cinema estadunidense, esta peça fílmica obedece-os rigorosamente, obtendo um sucesso arrebatador e imediato, ainda que o filme não tenha sido programado para estrear nas salas de cinema.
