Todos somos ótimos gestores quando existe fluxo de caixa suficientes para fazer face aos compromissos assumidos. Quando os colaboradores estão motivados, quando temos fornecedores adequados às nossas necessidades, quando os clientes estão fidelizados à nossa marca…, mas… e quando falha
Não duvido das capacidades de cada um, mas nas arduidades e vicissitudes do paradigma em que uma organização se insere, o imprevisto faz parte da rotina. Como lidar com isto? Em tempos, numa conversa com alguém que gere uma empresa, que antevê um momento mais delicado, a minha pronta pergunta foi “… e agora?” a qual a resposta foi “um dia de cada vez.”.
Assimilei a resposta sem muita contestação. Passados uns dias refleti sobre a situação. Na verdade, a pergunta não foi de todo a mais correta, até porque para o leitor mais atento eu referi “…que antevê um momento mais delicado…”. Este gestor ainda não está a passar por um período de crise, mas prognostica. Será possível? Pode nem influenciar de todo a conduta e perpetuação desta organização no mercado, mas a realidade é que está a ser equacionada e, de certo, medidas protetivas estão a ser tomadas de forma antecipada para minimizar ou quem sabe nem se sentir o seu efeito. De certo que seria mais fácil “empurrar com a barriga” e esperar para ver se realmente acontecerá. Se não acontecer: ótimo, estava a ser alarmista, se acontecer então logo se vê. Típico, não?
Existirão alguns mecanismos que um gestor possa adotar de forma a proteger a sua organização perante condições adversas que poderão surgir no futuro? Pretende-se com este artigo refletir sobre esta situação, verificar como um gestor pode preparar e que meios tem à sua disposição para uma rápida resposta.
Por definição, crise é uma mudança brusca ou alteração de um evento. A nível económico é representada por um momento em que a economia reflete um conjunto de indicadores negativos.
Portugal, reflexo da crise financeira global de 2007/2008, passou por um período de crise financeira de 2010-2014. Este período ficou marcado por acentuadas assimetrias, cortes nos serviços prestados pelo Governo ou mesmo cortes nos salários. A título de exemplo, entre 1 de janeiro e 26 de dezembro de 2012, foram declaradas 18627 falências de empresas e particulares, o que representa 52 casos por dia (Público, 2014).
Atualmente, o Banco de Portugal afirma que a economia portuguesa está enquadrada numa “envolvente económica e financeira globalmente favorável”. Refere igualmente que persistem riscos e constrangimentos específicos ao crescimento da economia portuguesa no médio e longo prazo – demográficos, tecnológicos e institucionais – aos quais acrescem os elevados níveis de endividamento dos agentes económicos (Observador, 2019). Já o Fundo Monetário Internacional (FMI) deixa um aviso que os governos de todo o mundo têm de preparar as suas finanças públicas para próxima crise económica (Público, 2019). Estamos perante um abrandamento do crescimento económico, atingindo uma maturidade de um ciclo. Prevê-se uma contração da economia. Perante este cenário questiono: como uma empresa/ empresário pode-se preparar para algo desta natureza?
Quando penso em mecanismos para lidar com a crise, mentalmente faço uma analogia com o corpo humano. Olhando para o corpo humano como uma empresa, temos os vários departamentos a funcionar em perfeita sintonia para que a empresa (nós, o nosso corpo) funcione em pleno. O departamento gástrico digere alimentos e fornece energia, o departamento cardiorrespiratório, o tão valioso oxigénio e por aí adiante.
Quando caímos, e fazemos uma ferida, o nosso corpo enche-se de adrenalina para prontamente respondermos à situação, só mais tarde, num período de calmaria é que poderemos sentir a dor. No entanto, mesmo sentido dor, o nosso corpo já se está a mobilizar para reparar os danos, ativa mecanismos de defesa e combate corpos estranhos. O sangramento é estancado e a mobilidade recuperada. Sempre com a ativação da dor, para nos lembrar que é uma zona fragilizada, mas em recuperação. Se refletirmos sobre isto, vemos como é fantástico o mecanismo de atuação perante estas situações. Agora devemos questionar: foi tudo preparado na hora, ou já existia um “protocolo” de atuação biológico para estas situações. Continuando a analogia, atualmente fala-se muito no exercício físico e adoção de práticas saudáveis no nosso quotidiano para evitar surpresas desagradáveis.
Será que nas organizações podemos atuar desta forma. Poderemos ser proactivos em vez de reativos? Sim, chama-se estratégia.
Um dos pilares básicos da gestão é a estratégia da organização. Um correto planeamento estratégico torna as organizações mais competitivas. A noção das envolventes é essencial para o sucesso de uma empresa. Isto implica uma análise qualitativa e quantitativa do mercado. Sem uma orientação estratégica bem definida, com objetivos claros, os gestores não conseguem alocar os seus recursos de forma otimizada. Uma boa estratégia permite à organização proteger-se das ameaças do mercado aproveitando as oportunidades e atuando em consonância com os seus pontos fortes.
Estratégia tem sua origem na palavra grega στρατηγία: stratēgia, que no sentido lato corresponde a um método para alcançar um objetivo. O termo estratégia foi inicialmente utilizado como um termo militar, que traduzia a arte de planear e executar operações de guerra. Com o passar do tempo, este termo passou a ser utilizado também em outros contextos, como por exemplo nas organizações.
No âmbito empresarial, consiste no conjunto de decisões e ações elaboradas antecipadamente, de forma exploratória, mas sustentável, para atingir um fim. É o caminho a seguir para atingir os objetivos. Implica um objetivo bem definido que confira intenção dessa estratégia. São várias as definições de estratégia no âmbito empresarial, apresentando-se com diferentes focos de atuação. A noção das envolventes é essencial para o sucesso de uma empresa. Isto implica uma análise qualitativa e quantitativa do mercado.
Uma empresa deve ser gerida através da criação de estratégias e programas de ação sustentáveis para dar resposta ao contexto externo. O sucesso de qualquer organização depende da sua competitividade. O autor Maçães (2017) refere que o processo de gestão estratégica é um sequência de cinco etapas.
A primeira resume-se ao diagnóstico da situação atual. Nesta é identificada a missão e estabelecidos os objetivos e estratégias da organização. A segunda etapa consiste na análise estratégica. Esta fase deve ser precedida de uma análise do meio envolvente permitindo identificar os fatores externos à organização e internos que possam influenciar o seu desempenho. Os meios mais comummente utilizados são a análise SWOT e 5 forças competitivas de Porter. A terceira etapa corresponde à formulação da estratégia. É nesta fase que se desenvolve e avaliam as alternativas estratégicas. As estratégias são selecionadas de acordo com a sua adequação às oportunidades do mercado. Há espaço para corrigir fraquezas e proteger-se das ameaças. A quarta etapa é a implementação da estratégia. A estrutura organizacional é ajustada ao meio envolvente. Por fim, a quinta etapa que consiste na avaliação e controlo dos resultados.
Citando novamente Maçães “A gestão estuda-se e os bons gestores fazem-se aplicando na prática a teoria. O sucesso das organizações depende da boa gestão e uma boa gestão passa pela tomada de decisões acertadas.”. Tão importante é o saber, como é importante aplicar o saber no nosso quotidiano.
Foi feito referência à análise SWOT. A sua facilidade de aplicação e interpretação permitiu que fosse amplamente utilizada no setor empresarial. Contribuiu para a génese deste instrumento de gestão a publicação do livro Business Policy, da autoria de quatro professores da Harvard Business School (HBS). Nesta obra ficou patente que estratégia mais não era que o resultado de um processo contínuo de avaliação e seleção de alternativas, de entre as suscetíveis de assegurar a melhor adequação entre os pontos fortes e fracos da organização com as oportunidades e ameaças provenientes do meio envolvente. Surge assim a matriz SWOT, que se traduz num instrumento de análise estratégica que relaciona pontos fortes (strenghts) pontos fracos (weakness) de uma organização, com as oportunidades (opportunities) e ameaças (threats) provenientes do seu meio envolvente.
Ao comparar o ambiente interno da organização com o meio envolvente (contextual e transacional), permite aferir o grau de relação entre eles e simultaneamente evidenciar as causas de eventuais desajustamentos. Ao nível da gestão, permite uma maior segurança na tomada de decisão, conhecer o mercado, entender melhor a concorrência, antecipar movimentos estratégicos externos e indicar alternativas de ação. O recurso a esta matriz permite averiguar se existe um correto ajustamento entre pontos fortes da organização e oportunidades de mercado e simultaneamente ver quais os pontos fracos e transformá-los em pontos fortes, bem com transformar ameaças em oportunidades. (Nabais, 2017).
Se a estratégia de uma organização for desenhada tendo em conta as envolventes externas terá maior probabilidades de ser sucedida num período de crise. Crise tem início, meio e fim e tem um formato diferente, influenciado pela conjuntura do momento. Se soubermos esses timings será mais fácil saber quando investir ou reduzir. Com estes dados fica mais fácil analisar a situação, criar mecanismos de proteção e agir no tempo certo.
Tal como o nosso corpo tem mecanismos que são ativados em situações de mudança brusca, uma empresa também os pode ter. Uma estratégia atempada e adequada, poderá representar a perpetuidade de uma organização num mercado. Uma certeza eu tenho, devemos esperar o melhor e prepararmo-nos para o pior. Prevenir é o melhor remédio.
Referências
Maçães, M. (2017). Planeamento, estratégia e Tomada de Decisão. (C. Editora, Ed.). Lisboa.
Nabais, C. (2017). Dicionário de Gestão. (E. Plátano, Ed.) (1a Edição). Corroios.
Observador. (2019). Banco de Portugal piora projeções de crescimento para 2019 com PIB a crescer 1,7% – Observador. Retrieved July 8, 2019, from https://observador.pt/2019/03/28/banco-de-portugal-piora-projecoes-de-crescimento-para-2019-com-pib-a-crescer-17/
Público. (2014). Tribunais declaram 52 falências judiciais por dia | Crise | PÚBLICO. Retrieved July 8, 2019, from https://www.publico.pt/2012/12/28/economia/noticia/tribunais-declaram-52-falencias-judiciais-por-dia-1578836
Público. (2019). FMI pede aos governos que se preparem para a próxima crise | Finanças públicas | PÚBLICO. Retrieved July 8, 2019, from https://www.publico.pt/2019/04/10/economia/noticia/fmi-pede-estados-preparem-proxima-crise-1868751
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