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Cinema Paraíso…

Cinema Paraíso…

Há pessoas que acham que ir passar uma tarde numa sala escura em lugar de ir apanhar sol é quase um crime de lesa-majestade! Coitados, em vez de estar a bronzear-se sob este sol brilhante, fecham-se numa sala escura e ainda pagam por cima!

Além de fugir ao calor e às horas proibitivas do sol, sentindo o ar fresco climatizado em dias de verão ou o ar tépido em dias de invernia, o cinema e a câmara escura que é a sala de cinema levam-nos a um ritual quase misterioso a que só têm acesso os privilegiados que o escolhem.

Felizmente, desde pequenina, fui educada a entrar neste ritual mágico de ir ao cinema para assistir a um filme, escolhido por nós, consoante o nosso gosto, o estado de espírito do momento, ou influenciados pela opinião de outrem. Essa opinião pode advir da nossa companhia para o cinema, de um crítico ou de um amigo.

Fui iniciada nesse ritual pelas mãos do maior realizador de fantasia para crianças e adultos: Walt Disney. Fui com apenas 3 anos ao reino da Branca de Neve e dos 7 anões, do Bambi, da Cinderela, e de toda aquela galeria de personagens fantásticas que nos ensinavam logo a distinguir o bem do mal e que os maus devem ser castigados… Quando a experiência tocou 3 anos mais tarde a minha irmã, ela teve uma reação que pôs a plateia toda a rir, ao dizer em voz alta quando entrou: “Ena, que televisão tão grande!”

Depois, seguiram-se os filmes grandes em duração e em comprimento de ecrã, os filmes que então se chamavam de 70 milímetros. Os nossos olhos tinham de andar da esquerda para a direita, quase como num jogo de ténis, para poder abarcar toda a paisagem florida do Tirol da “Música no coração”, do deserto infindável do “Lawrence da Arábia” ou da tundra gelada do “Doutor Jivago”.

Mas interrompo deliberadamente a sequência segundo a qual fui educada por meus pais, cinéfilos inveterados que semanalmente não falhavam uma fita para adultos, ficando nós em casa com alguém a fazer-nos companhia. Ao intervalo, ligavam-nos do cinema para saber se estava tudo bem e, no final, já sabíamos que seríamos compensadas com uma sombrinha ou uns cigarros de chocolate da Regina. Interrompo para salientar um dos filmes da minha vida (que são vários!), aquele que me marcaria para sempre e por várias vezes a minha vida, tendo mesmo decidido de vez a minha escolha profissional: “My Fair Lady” é o filme, baseado no livro Pygmalion do dramaturgo Bernard Shaw, com os fabulosos atores Rex Harrison e Audrey Hepburn. Nunca poderei esquecer a evolução linguística daquela vendedeira de flores de Piccadily Circus com um terrível sotaque cocknee até ao seu pomposo desfile pelas corridas em Ascot, após apuradas lições com o professor-linguista, e aí ter a despropósito retrocedido à sua gíria original, chocando toda a alta sociedade que aí assistia às corridas de cavalos.

Com a maturidade, outros filmes, realizadores ou atores de culto se juntaram ao elenco dos preferidos, fazendo com que não falhássemos a grandes filmes imperdíveis franceses, italianos ou americanos que estivessem mais perto da nossa realidade.

A televisão ganhou peso e com ela surgiu a preguiça de sair para ir ao cinema porque está a chover ou está frio, porque terei de pegar no carro, porque hoje também dá um bom filme nos canais da TV Cabo. Mas algo indefinível se perde, algo do mistério, da magia do “escurinho do cinema”, (“chupando (ou não) dropes de anis,/ longe de qualquer problema/perto de um final feliz”, como cantava a Rita Lee) que, em nossas casas, pode ser constantemente interrompido pela campainha da porta, do telemóvel ou do fogão, desviando levianamente a nossa atenção, sendo ainda pior do que o ruído das pipocas que nos range os ouvidos na sala de cinema! Enfim, é o nosso comodismo que é acentuado pela facilidade de eu poder parar o filme onde quero, quando quero e poder retomá-lo a meu bel-prazer, sentada confortavelmente num sofá.

Mas não me venham com fitas! Tentem ver um dos maiores filmes das nossas vidas (e quantas vidas não serão!) numa sala de cinema ou em casa e verão que, mesmo no conforto do lar, a experiência é quase sacrílega! Podia dar vários exemplos, mas este não esqueço porque é a história de um certo tipo de cinema dentro da 7ª arte que nos faz emocionar por todos os poros e corações. O filme: “Cinema Paraíso”, o realizador: Giuseppe Tornatore. Só a cena final em que se observam todas as cenas de beijos cinematográficos cortadas pela censura que a personagem tem a paciência de colar para ver desfilar constitui por si só uma antologia!

E ainda diz Mário Vargas Llosa que o cinema não faz desenvolver o espírito crítico! Que só o livro o faz…

Onde ia eu? Ah, pois, no paraíso… A assistir a um filme na sala fresca do cinema numa tarde quente estival ou projetado na parede da igreja de uma vilória do interior, numa daquelas noites tépidas de verão… E digam se não entrámos por duas horas no Paraíso, até sairmos atordoados para outras fitas reais, bem longe do happy end…

 

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