Nova declaração de princípios, ou: uma vez jornalista, a voz não se cala. Discorda-se, abafa-se, renega-se, mas a voz não se cala!
Após um alvissareiro contato com os editores deste jornal, voltado à Comunidade Científica de Língua Portuguesa, fui prontamente reacolhido, e estou novamente apto a compartilhar as minhas impressões sobre alguns títulos e eventos, no afã por somar-me à luta diuturna pela defesa de nossos direitos humanos. Através de nosso acesso aos produtos culturais, aprendemos mais, podemos encontrar afetos e ressonâncias em relação àquilo que pensamos e sentimos.
“Não podia aceitar aquele destino como futuro”: africanos querem mudança
Comentário sobre o filme “O menino que descobriu o vento” [The Boy Who Harnessed The Wind] (Longa-metragem. 113 minutos. Reino Unido / Maláui, 2019). Direção: Chiwetel Ejiofor.
O bandido da luz vermelha, o avacalho e o esculhambo (parte 1)*
Eu sei que fracassei. […] Quando a gente não pode fazer nada, a gente avacalha. Avacalha e se esculhamba. (trecho do filme) Em 1968 o realizador Rogério Sganzerla (1946-1994) lançou o filme O bandido da luz vermelha, inserido pelos críticos no conjunto de filmes denominado Cinema Marginal, epíteto recusado pelos realizadores. A dialogar com o […]
La vida loca
Tenho visto que muitas pessoas continuam a sua saga pré-pandémica. Para muita gente, tudo se manteve na mesma, após o regresso à normalidade. Para eles, não há nova normalidade; está tudo igual… Também eu, por vezes, caio nessa esparrela de achar que está tudo na mesma, mas não está; e basta olhar em volta. Há […]
Onze meses de “ele não!”: alienar-se é também um gesto de proteção e/ou resistência?
Não obstante assumir-se como palmeirense, o presidente Jair Bolsonaro posou com a camisa do Flamengo em mais de uma oportunidade, no afã por angariar atenção quanto à sua perfídia continuamente transitiva. E, ao fazê-lo, conseguiu obnubilar inúmeras pautas criminais em aberto, além de investigações envolvendo os seus correligionários.
Porque é cada vez mais importante falar sobre Bacurau!
Como este texto advém de uma revisão crítica sobre o filme, recomenda-se que ele seja lido por quem já assistiu ao mesmo, dado que aspectos centrais do enredo serão analisados, sob um prisma que está longe de esgotar o debate, visto que o filme pode (e deve) ser apreendido sob múltiplas perspectivas.
Por que é importante falar sobre os festivais de cinema (e não apenas sobre suas premiações)?
Independente de ser ótimo, não é arriscado privilegiar um filme que gozará facilmente de sucesso nas bilheterias e premiações técnicas de todo o mundo? Esta decisão considerada mui concessiva não seria tendente à cartelização hollywoodiana? São perguntas que seguem repercutindo após a divulgação da lista de premiados…
A religiosidade exacerbada como legítima crítica social: um estado de exceção em meio à laicidade?
Quando começaram a ser divulgadas as primeiras imagens deste filme, teve-se a impressão de que ele abordaria a tendência impositiva de um protofascismo religioso a partir de uma lógica zombeteira e/ou direcionada, repetindo ficcionalmente o escandaloso jargão que balizou a campanha eleitoral de Jair Messias Bolsonaro: “Deus acima de tudo, Brasil acima de todos”.
“Pelo cinema. Pela cultura. Por uma arte sem censura!”: 47º Festival de Cinema de Gramado
O grande vencedor desta quadragésima sétima edição do Festival, que ocorreu entre os dias 16 e 24 de agosto de 2019, foi o longa-metragem cearense “Pacarrete” (2019, de Allan Deberton), que recebeu oito Kikitos: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz (para Marcélia Cartaxo), Melhor Atriz Coadjuvante (para Soia Lira), Melhor Ator Coadjuvante (para João Miguel), Melhor Roteiro, Melhor Desenho de Som e o prêmio de Melhor Filmes segundo o Júri Popular.
Acerca de um urgente filme sul-coreano:
Devido à solicitação do diretor sobre a necessidade de restringir determinadas informações narrativas, é mister incorrer nalgumas generalizações analíticas acerca deste filme enquanto píncaro de seu estilo. Mas, ao fazer isso, perceber-se-á justamente como os traços autorais deste brilhante cineasta manifestam-se: “Parasita” (2019) é um filme genial!
“Se rezar, passa?” Nem sempre. Mas, no cinema brasileiro, cada tentativa é válida”
Tal qual ocorre em qualquer país, um dos passos mais recomendados para consolidar a nacionalidade de uma indústria cinematográfica é investir nas biografias de pessoas famosas. Ainda que isto não assegure qualidades autorais, os filmes que reconstituem eventos já conhecidos do público tendem a chamar a atenção de grandes platéias, além de consolidar as carreiras de alguns intérpretes.
Contra a censura da guerra, o equilíbrio do prazer
Neste que é seu terceiro longa-metragem como diretor, Tavinho Teixeira revela-se bastante autoral, a ponto de resgatar o mesmo ator e personagem principal de seu filme anterior, “Batguano” (2014). Tal qual ocorre naquele filme, em “Sol Alegria”, Everaldo Pontes interpreta um envelhecido e anti-heróico homem-morcego, e profere um dos aforismos mais marcantes desta obra: o processo, definitivamente, ainda não está terminado!
Quando o DNA do Estado e o DNA do Cinema não se coadunam…
Em lugar do quase arquetípico protagonismo feminino, temos aqui uma reflexão sobre as interdições produtivas sofridas pela diretora Ana Carolina. Mas sem apelar para a tentação do alter-ego: aquele que aparece no filme como “o diretor” tem pouco a ver com a cineasta. Desgosta de cinema brasileiro, por mais paradoxal que pareça!
Para além (ou aquém?) dos quiproquós chanchadescos…
Por conta do modo depreciativo com que a imprensa da época referia-se às comédias rápidas e carnavalescas da década de 1950, muitos filmes qualitativos foram obnubilados sobre o rótulo subgenérico de “chanchadas”. Mas, felizmente, vários pesquisadores descobriram recentemente as benesses insignes da filmografia de Watson Macedo (1918-1981), cineasta bastante importante na manutenção industrial do cinema brasileiro.
Mais ‘auto’ que ‘ficção’: “teus olhos é que mudaram; o filme continua o mesmo!”
Há algo de extremamente redundante no modo como o Pedro Almodóvar conduz o seu enredo enviesadamente autobiográfico em “Dor e Glória” (2019): repete-se bastante em relação aos rasgos mnemônicos que já surgiram em filmes anteriores e porta-se de maneira excessivamente autoindulgente quando atreve-se a ser confessional. É um filme cansado!
“Fizemos um acordo: eu filmava o trabalho; ele filmava a diversão!”
Ainda que descrevam uma rotina de labuta que consome mais da metade das horas de cada dia (incluindo os domingos), os toritamenses enumeram vantagens financeiras preferíveis em relação à estabilidade empregatícia. Acham ótimo que não recebam um salário fixo, mas alguns percebem que estão apartados dos benefícios previdenciários, sobretudo no que tange às possibilidades de aposentadoria. Com o enrijecimento das regras supracitadas, os malefícios só pioram…
A fome é a maior imoralidade de todas – mas esta, infelizmente, a censura deixa passar!
Se, em Hollywood, a autocensura do livre-mercado passou a desaparecer com a assimilação gradativa de aspectos contraculturais enquanto chamarizes vendáveis para produções benquistas pela crítica especializada, no Brasil, a situação era inversa: desde 1964, o país estava sob o jugo de uma ditadura militar, que intensificou a sua crueldade assassina em 13 de dezembro de 1968, com a promulgação do infame AI-5.
A cura a partir da perda: um embate depressivo do (anti)colonialismo antropofágico
“Amélia” (2000) foi lançado sem muito alarde de bilheteria. Logo converteu-se num dos xodós críticos daquele ano, o que infelizmente não impediu que a diretora Ana Carolina tivesse muitas dificuldades na obtenção de recursos para a feitura de seus projetos posteriores, sobre os quais falar-se-á em oportunidades vindouras…
A ausência sentida, quando advinda de uma morte anunciada
Deparamo-nos, neste filme, com uma demonstração prática de questionar o próprio cotidiano do realizador, enquanto ele imerge na feitura de uma obra cinematográfica: onde começa a vida e onde termina o filme (ou vice-versa)? O próprio diretor responde, numa entrevista: “eu não consegui terminar o filme. Ele era maior que eu. Eu apenas o interrompi!”.
“Antes de seguir em frente, eu tenho que voltar atrás”: ou de quando a História é também íntima!
Famosa por realizar documentários em primeiríssima pessoa, Petra Costa tomou este mesmo procedimento como ponto de partida para sua mais recente obra. Entretanto, por algum motivo, ela abandona justamente o recurso narrativo que lhe é tão caro e faz com que esta obra soe datada pouco tempo após o rebuliço crítico que vem causando. Como é típico da Netflix, aliás.