Nota introdutória
Neste texto de edição de Outubro que coincide com dia 13 de Outubro, dia Internacional de Redução de Riscos de Desastres; não se pretende explorar conceptualmente numa praxe académica os conceitos de ciências de riscos, mas faz-se um empréstimo para ilustrar o drama que se vive na região centro de Moçambique estando a provocar problemas societais que, se mal geridos podem conduzir a uma crise humanitária profunda. Entende-se por região centro de Moçambique as províncias de Sofala, Manica, Tete e Zambézia.
Primeiro, vale apenas definir-se cientificamente os conceitos de “bacia de riscos” como a região ou território onde há convergência de dois ou mais riscos que até podem vir a manifestar-se ao mesmo tempo originando crises complexas ( Rebelo, 2003 Apud Dagnino & Junior, 2007). E o “sistema de riscos” é utilizado para enfatizar quando um risco é fortemente interligado a outros no espaço e/ou no tempo (Perrow, 1983 Apud Dagnino & Junior, 2007). A situação actual da zona Centro de Moçambique e principalmente as províncias de Manica e Sofala encontra um ajuste destes dois conceitos que seguidamente se tenta demonstrar.
Algumas constatações de riscos condicionantes para uma crise humanitária na zona centro
Fortemente afectado pelo Ciclone Idai, temporais e inundações fluviais de forma cíclica
A região centro comporta vários rios importantes do ponto de vista hidrográfico em Moçambique. Os que mais afectam a região do ponto de vista de inundações e colocam em risco as populações e seus bens são rio Zambeze, Licungo, Save, Pùngué e Rovubwe. Estes rios de uma frequência de inundabilidade de 1 a 10 em média; querendo dizer que a região anualmente tem casos de cheias/inundações como mostra a figura 01.
Figura 01: Desastres por região (período 1956-2008) Queface 2009 apud INGC, 2009
Apenas no ano de 2019, antes do mortífero ciclone Idai a região já tinha sido afectado pelas inundações do rio Licungo na Zambézia, Save e Púnguè em Sofala, Zambeze e Rovubwe em Tete. Enquanto as populações se recuperavam das inundações foram afectadas pelo ciclone Idai que passado mais de 1 ano ainda se encontram num processo de reconstrução pelo impacto que teve.
Região com alta dependência de recursos naturais e regularidade pluviométrica
Os recursos naturais (florestas, pesca, fauna bravia, etc), a agricultura familiar de pequena escala são as actividades que garante o sustento das comunidades locais e geram muita renda informal nas famílias em quase toda a região centro e a província de Manica ainda com maior produção de citrinos e produtos de avicultura. Estas actividades têm época própria porque depende especificamente do período chuvoso.
Zona afectada por conflitos militares pós-eleitorais nas últimas três eleições (2014, 2019 e 2020)
Esta zona vem sofrendo com todas condições agro-ecológicas, recursos naturais e recurso mineiras factores que podiam ou podem colocar esta zona mais desenvolvidas e com comunidades mais imponderadas.
Os conflitos militares impedem o desenvolvimento das comunidades, inibem investimentos e colocam o nível de desenvolvimento desta região bastante lento.
Com as três constatações referenciadas acima fica óbvio que esta zona se trata de uma “bacia de risco” que se associam e podem conduzirem a uma crise humanitária se por exemplo os conflitos políticos militares prevalecerem, por que os eventos extremos estes sim vão se repetir (inundações, seca/estiagem e ciclones/tempestades)
Sugestões para reduzir a crise humanitária na zona centro de Moçambique
A passagem da emergência para o desenvolvimento deve ser tratada como uma fase transitória, designada “recuperação” (GFDRR & PNUD, 2014). É evidente que a região está em via de uma crise humanitária devido aos eventos extremos e os conflitos políticos militares estando neste momento com populações deslocadas das suas zonas de origem e local de trabalho normal. Com todas as adversidades vidas na região sugere:
1. Encontrar uma plataforma urgente para cessar os ataques militares na região. Esta plataforma deve estabelecer uma paz sustentável durante e pós-eleições, porque esta região tem sido palco de qualquer revindicação eleitoral e coloca a região fragilizada. É preciso que as acções humanitárias não devem ser limitadas ao alívio. A reabilitação e recuperação são parte integrante da acção humanitária e devem ser dadas a atenção necessária e recursos suficientes. A acção humanitária deve ir para além da resposta de emergência e ser entendida como parte de uma estratégia de paz e estabilidade e de desenvolvimento a longo prazo (Africana, 2016).
2. Envolver as comunidades como actores principais para resolução dos próprios problemas, porque vezes sem conta as comunidades recebem doações, ajudas humanitárias e projectos de empoderamento comunitário que muitas vezes não se enquadram com o seu contexto. Isso deriva pelo fraco envolvimento das mesmas na construção das soluções.
A gestão de riscos é da responsabilidade de todos habitantes de um território (Dgedge & Chemana, 2018) os outros devem vir se associar a acções de preparação, resposta e recuperação das comunidades e não para distribuir “mantimentos”.
Figura 02: Esquema de sugestões para minimizar a crise humanitária na zona centro de Moçambique
3. Capitalizar o uso sustentável dos recursos naturais e minerais por parte das comunidades de modo a tirarem maior proveito para reduzir os níveis de desemprego e pobreza na região; isso evitará uma provável manipulação das comunidades para se associar a conflitos militares e também irão construir habitações melhoradas capazes de suportar os eventuais fenómenos climáticos.
4. Encontrar uma plataforma de governação de riscos na região que possam incorporar os aspectos culturais e étnicos para reduzir as assimetrias centro-sul/sul-centro.
Referencias
Africana, U. (2016). Posição comum Africana (PCA) sobre a eficácia da ajuda humanitária. Addis Ababa.
Dagnino, R. D. S., & Junior, C. S. (2007). Risco Ambiental: Conceitos E Aplicações. CLIMEP – Climatologia e Estudos Da Paisagem, 2(2).
Dgedge, G., & Chemana, C. (2018). Os comités locais de gestão do risco de calamidades e a educação sobre inundações no Baixo Limpopo, Moçambique. Revista Internacional de Riscos, II, 123–132. https://doi.org/10.14195/1647-7723_25-2_10
GFDRR, & PNUD. (2014). A recuperação de cheias recorrentes 2000-2013 MOÇAMBIQUE Estudo do Caso para o Quadro de Recuperação de Desastres. Retrieved from https://www.gfdrr.org/sites/default/files/publication/report-mocambique-recuperacao-cheias-recorrentes-2014_0.pdf
INGC, I. N. de G. de C. (2009). Estudo sobre o impacto das alterações climáticas no risco de calamidades em Moçambique Relatório Síntese. Retrieved from www.ingc.gov.mz