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You’ve Got Mail

You’ve Got Mail

Os tempos modernos trouxeram-nos muita informação…

Bom; há quem discorde. Há quem diga que não foi bem informação aquilo que a internet nos trouxe, mas sim dados – data, como se diz agora; e a diferença principal é que com a informação podemos trabalhar e com os dados não. Os dados não são informação, mas algo com o qual se pode construir informação. E isto pode dizer-nos muita coisa…

Os dados com os quais somos bombardeados, hoje – e de forma sistemática -, sempre que procuramos por alguma coisa na World Wide Web, quando não são informação acabada – e raramente são –, são como os ingredientes de uma receita de culinária. Quem sabe cozinhar, sabe que os mesmos ingredientes podem servir para fazer diferentes pratos; e o mesmo se passa com os dados: servem para cozinhar diferentes informações.

Mas como é que isto aconteceu?

Perdoem-me o simplismo com que vou explicar isto, porque é evidente que o processo foi muito mais complexo e espaçado no tempo; mas acho que o podemos resumir assim… Isto aconteceu, porque a libertação operada pela internet tornou possível a toda a gente com um PC, ou com acesso a um PC, divulgar os seus pensamentos e crenças. E com o tempo, tornou-se necessário a essas pessoas – todos nós, no fundo – actuar com extrema cautela para não ofender os seguidores, as minorias, as maiorias; enfim: ninguém. O resultado disso é que hoje ninguém produz informação concreta, preto no branco, sobre nada, porque se entende que qualquer coisa – até uma vírgula – poderá ofender alguém. E isso obriga à criação de textos com ideias tão genéricas, e tão permeáveis a diferentes interpretações, que pouco mais são do que dados arranjados de forma a parecer texto e criando a ilusão de ser uma informação.

A ilusão de informação é um dos maiores perigos para a sociedade actual. A ideia que um individuo tem sobre estar bem informado pelo que lê, ouve ou vê na Internet é tão poderosa que o poderá alienar da realidade. E, alienado, está para lá de qualquer argumentação construtiva e racional, pelo que decidido a praticar determinadas acções perniciosas, para si ou para outros, ninguém o demoverá.

Outra consequência da ilusão de informação é a tendência que fomos criando para querer saber tudo o que há para saber – mesmo aquilo que não nos faz falta – e a ansiedade que isso nos cria.

Um exemplo disso são os automóveis actuais; trazem sensores para tudo e dão-nos uma miríade de dados sobre o motor e a parte elétrica. Por isso, sempre que alguma coisa falha – mesmo que seja uma ínfima anomalia -, acende-se uma luzinha no painel com um alarme sonoro – muitas vezes, irritante. Isto é mau?

Não.

O que é mau é o facto irmos a correr à oficina, com medo que o carro exploda, assim que luzinha acende e o alarminho soa. Sabem quantos carros, aqui há 40 anos, circulariam na estrada cheios de desequilíbrios e pequenas falhas?

Talvez muitos… Mas como ninguém sabia, estava tudo bem.

Podem dizer que não é mesmo assim… Será?

Vou dar outro exemplo; mais corriqueiro: a pressão dos pneus. Quantos de vós já foram a correr à estação de serviço encher o pneu, porque o sensor indicava que determinado pneu estava com menos pressão que o outro?

Antigamente, se necessário fosse, os carros tinham diferentes pressões em cada pneu e ninguém se aborrecia; porque – na verdade – não impedia uma condução segura. Mas sabem a melhor?

Agora também é assim; só que agora – também – sabemos que o pneu tem menos pressão… E isso faz-nos uma confusão tremenda.

É por isso que se lê coisas como a que li no outro dia – e num site respeitável – sobre astronomia. A notícia falava sobre um asteróide – com o tamanho de um carro – que vai passar perto da Terra, em termos astronómicos, à velocidade de 49000 km/h; e que o asteróide só foi identificado recentemente. Entendendo não ser suficiente falar sobre este asteróide, o autor divaga sobre os planos que há e não há para afastar eventuais asteróides ameaçadores da Terra e culmina dizendo que, apesar de terem identificado já centenas destes asteróides, há muitos mais asteróides do tamanho de automóveis, e que podem causar estragos, que não estão identificados e que se poderia estar a fazer um melhor trabalho…

Vejamos… Hoje sabemos muito mais do que à 10 anos atrás e temos ameaças identificadas, mas como há alguns carros em forma de pedra que não conhecemos, já o trabalho é deficitário e insuficiente; e isto não é senão resultado de uma ânsia cada vez maior por dados e mais dados…

A humanidade vive obcecada por dados, julgando que é informação, acreditando que estando informada está melhor; e não está errada… No entanto, aquilo que lhe dão é um placebo, não é informação, são dados e os dados só se transformam em informação com quem sabe tratar dos ingredientes, conhece a receita, e pode organizar tudo aquilo numa ideia coerente. Infelizmente, como em tudo, há os bons e os maus, há aqueles que querem servir a humanidade e aqueles que querem servir-se da humanidade; e cada um tem as suas próprias receitas. Para piorar o cenário, a maior parte de nós não tem capacidade para distinguir uns dos outros e, por isso, seguimos aquilo que mais nos convém; porque é mais fácil de aceitar ou porque serve melhor os nossos interesses. E é assim que surgem tantos novos profetas da Verdade, tantos Gurus… e – estranhamente – é assim, também, que os estúpidos e fundamentalistas vão chegando ao poder.

O problema, senhoras e senhores, é que somos todos viciados em dados, vivemos agarrados aos smartphones e Iphones em busca da próxima dose e pagamos fortunas – os nossos dados pessoais – para ter acesso a mais produto e testarmos novos dealers.  A diferença entre a nossa sociedade e um antro de drogas dos anos 80 e 90 é só onde está o lixo; enquanto, então, o lixo estava ao redor dos viciados, na nossa sociedade está dentro deles, invadindo-lhes a cabeça.

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