Este sentimento de aversão, transformado em conceito, pode ser analisado de diferentes perspectivas, desde a sociológica, a antropológica, a psicológica, e a política, até à jurídica, a jornalística, etcetera, etcetera.
Quanto menos culta, e informada, é uma pessoa, mais ela mergulha e se isola em seus medos ancestrais, e em suas crenças, crendices e preconceitos. Esses últimos prevalecem como asserções por falta dos conceitos que se revelem científica e filosoficamente como certos, comprovados e comprováveis, ficando-se por um universo mais desfocado e primitivo, ligado a percepções não científicas, devido exactamente à falta de cultura da pessoa, encontrando as respostas a seus questionamentos, em seus próprios preconceitos.
Incompatibilidade evolutiva.
Nossa mente e hábitos comportamentais vêm de uma forma de ser e estar de há muito tempo atrás, transmitida por hereditariedade, uma vez que incorporada se tornou genética. Nossa programação psíquica, física e emocional ainda não absorveu a nova realidade que, com a ciência e a tecnologia, as sociedades que se desenvolveram, criaram, e que é a nossa nova realidade e entendimento. Continuamos todos, de certo modo, ligados a entendimentos de uma realidade que não mais existe. Fomos moldados e projetados para viver nesta outra, antiga, realidade, que a nova baniu, ultrapassou, e para a qual não estamos ainda interiormente preparados para lidar com ela, vale dizer, não digerimos, com os sentimentos e o entendimento, o novo, de sorte que formemos as capacidades e as habilidades que estabelecerão a forma de estar necessária para lidarmos com essa nova realidade, mantendo várias barreiras da nossa incompatibilidade evolutiva, ou seja, nos deslocando, nos afastando, e até mesmo nos restringindo, da convivência (aceitação e bom relacionamento) com a nova realidade cada vez mais mutável e dinâmica, que todo dia nos força a nova ótica. Dado o deslocamento humano a nível planetário, surge uma rejeição aos que chegam.
A forma pelo conteúdo e vice-versa.
Tomamos a forma por conteúdos que não mais existem, ou, às vezes ao contrário, percebemos conteúdos em formas que não mais existem também, porque sempre buscamos fórmulas e formas reconhecíveis, que aparentemente significam valores, substância, elementos e materialidade já inexistentes, devido a evolução e à nova realidade que se instalou, mas que interpretamos ainda pelo que a forma nos sugere.
Se é de fora é mau, é perigoso.
Essa forma de entendimento projetou uma grande generalização, em razão de algumas ocorrências infelizes, criando esse entendimento, raiz da xenofobia. Vamos olhar para elas no contexto histórico quando as localidades, as vilas, as cidades, eram muito pequenas, com poucos habitantes, o que permitia um controle social muito grande, que muita vez degenerava em algum tipo de rejeição ou de exclusão social em virtude da língua, da religião, dos hábitos alimentares, etcetera, firmando a ideia de que o que é estrangeiro, o que não é nosso, é mau, pode ser perigoso, e quase sempre deve ser rejeitado. E mesmo um grupo relativamente numeroso de estrangeiros em nossa cidade pode representar um potencial perigo, devido a sua força como núcleo de ação com objetivos específicos, diferentes dos da urbe, ainda que estes sejam apenas fortuitos.
RACISMO.
O prato do dia é preconceito regado ao molho racista.
Um claro elemento fortemente mobilizador da exclusão é a cor da pele, o aspecto físico, bem como o comportamental, as vestimentas e linguagem corporal de um indivíduo, ou grupo, diferente dos demais, tornando-o reconhecível como estranho e, portanto, indesejável. Os buracos ‘gaps’ do entendimento, da integração, do reconhecimento, e da ambientação, vazios que pronto se estabelecem pela simples razão de ser diferente, sendo motivador de incompreensão, negação, rejeição, repulsa, raiva e mesmo ódio ao elemento, ou elementos diferentes que são classificados como estranhos, logo indesejáveis. Há que se perguntar: Indesejáveis porque?
O vazio sentimental.
Como todo vazio sentimental é angustiante, ele busca ser preenchido por alguma coisa para deixar de ser vazio, mesmo que essa coisa seja uma estupidez como a aversão, porque seja lá com o que for que preenchamos o vazio, isso irá livrar-nos da angústia, que é o pior sentimento que há. Toda xenofobia está centrada neste vazio sentimental, ou seja, na falta de um sentimento positivo em relação aos indivíduos que desconhecemos, não os conseguindo apreciar, só por serem diferentes, causando um vácuo na sensibilidade de quem os aprecie, preenchendo este buraco com a estupidez da aversão denominada XENOFOBIA.
Justiça é ação.
Nenhuma resposta branda no campo da ordem poderá se estabelecer perante ideias consumadas em má percepção, que se expressam em sentimentos absolutamente primitivos, como o racismo e a xenofobia, nem qualquer entendimento filosófico, social, ou jurídico terá o condão de se contrapor à incompreensão gerada pela irracionalidade da xenofobia, sendo ela mais forte por ser irracional(*). Só a força da lógica social expressa em norma de Lei, poderá, juntamente com a necessária ação que daí resulte pela força da Lei manifesta, coibir a ação da estupidez que representam tanto a xenofobia como o racismo. Tudo orientado pelo sentimento avassalador que dirige os homens: a sua infinita estupidez, como nos alertava Einstein. Para as coibir e prevenir é mister forte ação da Lei e da Justiça em seus diversos instrumentos de civilização.
Do deslocamento das pessoas.
A par com tudo isso, vivemos um tempo em que as pessoas sentem-se insatisfeitas onde vivem, e buscam outros horizontes. O processo migratória reforça sentimentos alienígenas, quando de facto sentem repulsa aos que não são da terrinha, da localidade de onde provém os que formem certa comunidade, esquecendo que muitos desta comunidade também migraram. Imigrantes os que emigrantes são rejeitados, emigrantes os que os nacionais rejeitam, imigrantes os que buscam acolhimento, em qualquer caso condição equívoca do entendimento biunívoco, única realidade que satisfaz esses entrincheiramentos. Devemos aceitar o que não podemos mudar.
(*)irracional, advinda do cérebro reptiliano que sempre opta pela violência e preconceito como meios de defesa contra tudo do que desconfie.



