“Para pensar na desgraça, é necessário senti-la!”: mais uma vez, falemos sobre a ressignificação da dor através da arte…

O documentário “A Lembrança de um Futuro” (2001, de Yannick Bellon & Chris Marker) foi realizado pela filha da personalidade homenageada e pelo idealizador do que hoje conhecemos como cinema-ensaio. Este média-metragem, com pouco mais de quarenta minutos de duração, homenageia os feitos de Denise Bellon [1902-1999], uma fotógrafa francesa que, ao registrar imagens do pós-guerra, captando situações ocorridas após a I Guerra Mundial, captou, por similaridade previdente, elementos concernentes ao pré-guerra, no sentido de que evidenciam questões que balizariam os eventos da II Guerra Mundial, ocorrida entre 1939 e 1945. Exemplo: ao flagrar os relances de pessoas despidas, celebrando a própria nudez enquanto indicativo de liberdade, ela chamou atenção para o culto à perfeição corporal que se tornaria uma das bases ideológicas do Nazismo.

“Eu não sei onde o sr. Lynch está. Ele passou por aqui, e fez a maior bagunça!”: qualquer homenagem é insuficiente, quando aquém do amor sentido…

Tendo em vista o sobejo de adjetivos elogiosos em relação ao cineasta em pauta, fica evidente que o redator responsável por esta coluna é um fã ardoroso de David Lynch. Como tal, o artista será celebrado através de múltiplas revisões de suas obras, antológicas e fascinantes a cada contato. Receber a notícia de seu falecimento foi como saber da morte de um parente querido, tamanho o baque, o que foi reverberado em diversas publicações, nas redes sociais…

Acerca de obituários em setembro (ou “quem lê tanta notícia?”)

A despeito de sua idade mui avançada, Jean-Luc Godard [1930-2022] continuava ativo, realizando obras que enchiam os críticos de deleite, ainda que fosse requerida uma carga considerável de erudição literária para compreender as suas referências. Nalgum sentido, o diretor permaneceu anacrônico, malgrado saber reinventar-se muito bem, a ponto de ser regularmente considerado “à frente de seu tempo”. Chegou até a encetar um filme com a um uso subversivo das técnicas de terceira dimensão e, recentemente, compartilhou uma ‘live’ via telefone celular. Trata-se de um cineasta inequivocamente vanguardista, portanto. Verbo no presente.

“Mas, afinal, quem vive?”, ou o que pode ser dito sobre uma obra que fala tudo?

Aprioristicamente, não há mais nada a ser acrescentado às variegadas análises que foram feitas sobre este clássico inicialmente subestimado da cinematografia estadunidense. Quando foi lançado, ele resultou num fracasso de bilheteria, o que foi ressignificado a posteriori, quando veio à tona a versão particular do diretor, sem a narração em ‘off’ e o final feliz imposto pelos produtores. Os críticos ocuparam-se em diagnosticar a genialidade da obra, que converteu-se em objeto de culto. E, quanto mais revemos este extraordinário filme, mais descobrirmos algo sobre ele – e, por extensão, sobre nós mesmos…

“Estrelas são [como] os furos na lona do circo” (declarem seu amor aos vivos, hoje – isso imortaliza!)

Quando o falecimento ocorre por vias trágicas – e no fulgor da idade – a comoção é ainda maior. E, neste sentido, convém aproveitarmos esta oportunidade para comentar o lançamento do documentário “Já que Ninguém me Tira Para Dançar” (2021, de Ana Maria Magalhães), sobre a trajetória da icônica atriz fluminense Leila Diniz [1945-1972], que morreu num acidente aéreo, numa viagem através da Índia, aos vinte e sete anos de idade, quando voltava de um festival de cinema na Austrália.

Por fora, o embate; por dentro, a simbiose. Ou o dilema de um gênio, para além da apoteose de sua criatura…

Nesta entrevista, o diretor é confrontado por uma das perguntas mais recorrentes (e mal-intencionadas) de sua vida: “quem é mais importante, José Mojica Marins ou Zé do Caixão?”. Como se fosse possível dissociar um de outro, e vice-versa. Para atender aos propósitos fílmicos, José Mojica Marins, o personagem, responde que ele, o criador, seria o mais importante. Será o pressuposto para uma brilhante persecução entre criatura e criador, num roteiro com múltiplos pontos de fuga horroríficos.

Já dizia o imortal: “o passado é para refletir, não para repetir”

Na manhã de um domingo, 19 de maio de 2019, Luiz Rosemberg Filho morre, aos 76 anos de idade. Infelizmente, por ser um cineasta periférico num país subdesenvolvido, a noticiabilidade deste falecimento ficou restrita a nichos bastante restritos. Mas, antes de falarmos sobre ele, convém recapitularmos a extrema importância deste diretor em relação ao desenvolvimento expressivo do cinema brasileiro.