“Quando o corpo morre, o câncer também morre”: livremo-nos do luto que adoece, via ressignificação artística (e política)!


A fim de converter nalgo intelectualmente produtivo a aflitiva sensação de perda deixada pela notícia supracitada (o falecimento do crítico Jean-Claude Bernardet), convém assistir ao ótimo longa-metragem “O Senhor dos Mortos” (2024 – “As Mortalhas”, tradução do título original, em Portugal), mais recente produção do mestre do horror corporal David Cronenberg. Neste roteiro, evidentemente autobiográfico, o cineasta parte de uma reflexão sobre o vazio deixado após a morte de sua esposa Carolyn Zeifman [1950-2017], com quem vivia desde 1979, e que era operadora de câmera e produtora cinematográfica. Para validar a experiência de imersão, o protagonista Vincent Cassel está fisicamente muito parecido com o diretor. Porém, a narrativa parte para os rumos intricados que caracterizam os seus enredos…
“Tente usar a roupa que estou usando/ Tente esquecer em que ano estamos”: acerca da imponência de um artista imortal!


“Luiz Melodia – No Coração do Brasil” (2024, de Alessandra Dorgan) é uma produção documental que respeita aquilo de mais notável na produção do artista titular, que é a sua originalidade. Chama positivamente a atenção o fato de não haver uma narração em ‘off’, proveniente de alguma figura de autoridade, com voz empostada: quem comenta os eventos de sua vida e carreira é o próprio Luiz Melodia [1951-2017], através de depoimentos antigos, magistralmente resgatados.
“Eu não sei onde o sr. Lynch está. Ele passou por aqui, e fez a maior bagunça!”: qualquer homenagem é insuficiente, quando aquém do amor sentido…


Tendo em vista o sobejo de adjetivos elogiosos em relação ao cineasta em pauta, fica evidente que o redator responsável por esta coluna é um fã ardoroso de David Lynch. Como tal, o artista será celebrado através de múltiplas revisões de suas obras, antológicas e fascinantes a cada contato. Receber a notícia de seu falecimento foi como saber da morte de um parente querido, tamanho o baque, o que foi reverberado em diversas publicações, nas redes sociais…
Acerca de obituários em setembro (ou “quem lê tanta notícia?”)


A despeito de sua idade mui avançada, Jean-Luc Godard [1930-2022] continuava ativo, realizando obras que enchiam os críticos de deleite, ainda que fosse requerida uma carga considerável de erudição literária para compreender as suas referências. Nalgum sentido, o diretor permaneceu anacrônico, malgrado saber reinventar-se muito bem, a ponto de ser regularmente considerado “à frente de seu tempo”. Chegou até a encetar um filme com a um uso subversivo das técnicas de terceira dimensão e, recentemente, compartilhou uma ‘live’ via telefone celular. Trata-se de um cineasta inequivocamente vanguardista, portanto. Verbo no presente.
“Tão estúpido e ignorante – e, ainda assim, amado por alguém”: ou de como sentimo-nos diante da genialidade joyceana!


É mui aplaudível que algum cineasta ouse adaptar o mais famoso livro de James Joyce, o que foi feito esplendidamente pelo norte-americano Joseph Strick [1923-2010], num filme que recebeu a capciosa tradução de “A Alucinação de Ulisses” (1967). Por causa da audácia demonstrada pelo realizador, junto ao co-roteirista Fred Haines [1936-2008], este filme mereceu a indicação ao Oscar de Melhor Roteiro Adaptado. Não foi laureado, infelizmente, e causa estranhamento que este petardo fílmico não seja melhor conhecido. Falemos um pouco sobre ele, daqui por diante…
(Título não autorizado)


Surpreendentemente indicado em quatro categorias importantes do prêmio Globo de Ouro (Melhor Filme Dramático, Melhor Direção, Melhor Atriz e Melhor Roteiro), “Bela Vingança” ajudou a concretizar algo histórico – e muitíssimo importante: pela primeira vez, dentre as cinco indicações destinadas a Melhor Direção, três delas foram ocupadas por mulheres. O filme chega num momento mais que pontual, adequadíssimo.