Quer os sindicatos e associações de professores portugueses, quer os orgãos de comunicação social têm chamado a atenção dos sucessivos governos, há mais de uma década, de que os professores portugueses estão a ficar velhos. Velhos, cansados e desanimados com uma profissão que a maioria abraçou por vocação.
No início do presente ano letivo, voltaram os sinos a tocar a rebate: há muitos alunos sem professores em várias disciplinas, mesmo em escolas secundárias na capital, como no Liceu Gil Vicente onde, há bem pouco tempo, havia 140 alunos sem professores de Português. E voltam as estatísticas crescentes e alarmantes: a média de idade dos docentes já ultrapassa os 55 anos, com todas as consequências daí decorrentes. Aos professores licenciados, em início de carreira, com um salário desprestigiante, se ficarem colocados muito longe de casa, sem qualquer subsídio estatal, quer de deslocação, quer de alojamento, só lhes resta recusar horários letivos (in)completos, em escolas desfalcadas de pessoal docente, no território continental ou insular, na cidade ou no campo.
Com efeito, os professores, além de já terem atingido uma idade provecta, sentem-se desanimados por, ao fim de cerca de 30 anos ou mais de carreira, que se imaginaria promissora, em vez disso, têm resistido a todas as correntes pedagógicas, a ministros adeptos desta ou daquela Escola cujas ideias já deram fruto lá fora, por vezes já em decadência, de manuais que as acompanharam com erros que os professores corrigiam ou tiveram de criar outros materiais de substituição e, pior do que tudo, toda a burocracia que as acompanharam, obrigando os docentes a ler amiúde montes de ofícios e circulares do Ministério da Educação. Ao que se sucedia toda uma burocracia que os envolvia em projetos, testes, matrizes, grelhas, formulários, formações, avaliações, trabalhos individuais e em grupo, aulas online e aulas presenciais… fazendo-os perder o seu tempo letivo e não-letivo precioso, impedindo-os de fazer o que melhor sabem e gostam de fazer: ENSINAR.
Recompensas? Baixos salários, congelamento da carreira durante anos a fio, após crises económicas nacionais e internacionais, perda do reconhecimento do estatuto do professor na sociedade, vilipêndios desde os governantes aos alunos e encarregados de educação, não-reconhecimento de especializações académicas como mestrados e doutoramentos sem retribuição, seja em aumentos de salário, seja em avanços na carreira docente.
Previsões para o futuro? O futuro é já hoje: faltam milhares de professores nas escolas portuguesas por aposentações sucessivas e em massa do pessoal docente ao longo da última década, por idade e/ou incapacidade física ou mental, sendo um dos grupos profissionais que mais recorre à psicoterapia, escolas degradadas, falta de recursos técnicos e humanos como os auxiliares de ação educativa…
E o que promete o Ministro de Educação atual para colmatar a falta de docentes? Recorrer a licenciados com grande capacidade científica, embora de outras áreas, que saem anualmente das universidades e, subentende-se, tendentes a ficar no desemprego, com ou sem formação pedagógica.
Em conclusão, quando entrei no ensino em meados dos anos 80, já então havia uma tremenda falta de professores, nomeadamente de Português e de Matemática, e qual foi então a solução encontrada que se revelou mais tarde um erro educativo grave? Recorrer a professores de História no desemprego para lecionar Português no 2º ciclo e a engenheiros recém-formados para ensinar Matemática nos Ensinos Básico e Secundário. Quase quatro décadas depois, tende-se a insistir no mesmo erro, ao colocar-se pessoas a lecionar disciplinas fora do seu âmbito de formação.
Ao fim de 30 anos de carreira como professora por vocação, posso dar o meu testemunho: como “prémios”, recebi congelamento ou ausência de anos de salários e/ou de avanço profissional após o meu doutoramento, ao fim dos quais e de algumas explicações pedidas em 2010 ao ME, foi-me respondido taxativamente que não havia dinheiro, deixando a minha carreira definitivamente estagnada. Não admira, pois, que em inquéritos, quer a alunos, quer a encarregados de educação sobre os seus educandos, acerca das suas preferências profissionais futuras, não conste há muito tempo no ranking nacional o nobre ofício de ser professor.
Por Helena Garvão
Lisboa, 1 de dezembro de 2021
Imagem de capa: Foto da Shopify Partners do Burst