Sempre fui uma pessoa muito curiosa. Daquelas que os pais se cansam de responder as perguntas. Lembro-me de viagens em que perguntava a meu pai o nome e a população de todas as cidades pelas quais passávamos, enquanto minha mãe e meu irmão dormiam. Hoje imagino e entendo a paciência que meu pai tinha e as respostas reais ou inventadas que me eram dadas. A curiosidade serve de alicerce para coisas boas e coisas ruins, para enumerar uma coisa boa ocasionada pela curiosidade fico com o fato de dever boa parte do pouco que sei a curiosidade que me leva por caminhos desafiadores que não perceberia sem tal característica. Já uma faceta negativa da curiosidade me dói na memória, quando enfiei um grampo de cabelo na tomada e fui acometido por um violento choque elétrico; Algo que hoje seria como um não meta o nariz aonde não foi chamado.
O parágrafo superior serve de introdução para demonstrar um aspecto da vida atual que muito me impressiona que é a certeza. Todos possuem absoluta certeza de tudo a todo tempo. E, confesso que fico admirado e amedrontado com tamanha certeza que todos tem sobre os mais diversos e variados assuntos e temas existentes na vida cotidiana.
Vivemos um período de pandemia do Covid-19 que possui como característica e peculiaridade a novidade de um vírus sobre o qual pouco se sabe. O contágio, os sintomas, o tratamento, as medicações, as consequências e mais uma série de quesitos vão se desenhando diariamente em cenários complexos e difíceis. A Organização Mundial de Saúde, os sistemas de saúdes de vários países e os cientistas estão aprendendo a lidar com o vírus ainda sem uma resposta ou confirmação da duração da pandemia, da perspectiva de cura e a aplicação imediata de uma vacina para os casos de covid-19.
Apesar de tudo isso, as pessoas têm certeza que sabem a resposta certa para a resolução do problema e quem discorda não merece sequer o respeito. Eu sei e pronto. Existe um ditado que diz: “Resolver o problema dos outros é fácil”. Quando se parte de uma esfera de certeza pouco há de se fazer e isso vale para qualquer dos lados, ou seja, quando se defende a certeza do isolamento ou a certeza da não necessidade de isolamento isso torna uma questão inicialmente médica em uma disputa e a busca por evidências que garantam a todo momento à sua certeza.
A pandemia se tornou mais um episódio do maniqueísmo vivido quase que de forma global, a luta do bem contra o mal, a busca por heróis e vilões. Neste sentido, há de se dizer que o ser-humano é mais complexo do que a simples bifurcação, a divisão da humanidade em polos antagônicos que se mostram faces da mesma moeda já traz consigo há tempos sinais de sua negatividade. O nós contra eles em que nós sempre estamos certos e eles sempre estão errados aprofunda todas as crises e dilemas existentes e que ainda estão por vir na história e na vida em comunidade. A certeza de pertencimento ao bem torna seu adversário pertencente ao mal e, de tal conceito pode se empregar qualquer tática para aniquilar seu opositor, uma vez que ele representa tudo de ruim que há na humanidade.
Acredito que o momento peça um pouco menos de certeza sobre todos os assuntos possíveis e imagináveis e mais clareza nas escolhas a serem realizadas, a polarização vista até em tempos de pandemia é sinal de aprofundamento na visão que separa e que impede qualquer união entre as pessoas e principalmente o entendimento e o saber ouvir os outros; Um antídoto a ser adotado é escutar as pessoas antes de marcá-las, a necessidade de saber tudo e de marcar as pessoas conforme suas opções empobrece a discussão e cria dogmas e não ciência.
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2 respostas
De certeza, nós humanos estamos cheios. A dúvida é que faz crescer, que faz buscar, que faz a curiosidade aflorar, como você mesmo escreveu.
Obrigado pelo comentário!! A busca pelo conhecimento depende da ausência de certeza e do questionamentos constante!