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O relatório da OCDE sobre Portugal: polémico?!

O relatório da OCDE sobre Portugal: polémico?!

Durante a semana selecciono sempre alguns temas a desenvolver neste espaço, dos quais escolho apenas um, e esta semana o foco do meu artigo seria a recomendação da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) para a subida dos impostos sobre o gasóleo em Portugal, tema que me agrada pelo carácter ambiental subjacente, aliás uma notícia altamente difundida e comentada no nosso país ao longo desta semana.

Quis o destino, contudo, que a minha curiosidade fosse maior do que apenas esse pormenor do relatório, ou quis a minha formação que a pesquisa por mim encetada fosse ao fundo da questão, e o dito relatório da OCDE incide muito pouco sobre a questão dos impostos sobre combustíveis, e portanto muito pouco sobre as questões ambientais, é muito mais abrangente e direccionado para as exportações e justiça. Aqui levanta-se logo uma questão: por que foi dado tanto ênfase à recomendação de subida dos combustíveis, nomeadamente à subida dos impostos sobre o gasóleo?

Antes de entrar eu próprio em polémicas, e tender a criticar a qualidade do jornalismo lusitano da actualidade assim como a capacidade analítica dos seus leitores, factos que considero intimamente e perigosamente ligados, rapidamente cheguei a outra notícia, numa direcção completamente diferente mas também amplamente difundida e comentada, e que constituirá o lado da maior polémica: a suposta inclusão da corrupção como tema central deste relatório, que foi mal recebida pela classe política, adensando-se a discussão pela ausência do ex-Ministro Álvaro Santos Pereira (sim, o dos pastéis de nata) na apresentação do relatório – talvez para evitar mais polémicas dentro da polémica já criada?!

Portanto, consta que uma versão preliminar do relatório terá escapado indevidamente (a chamada fuga de informação), e que era bem menos simpática para o nosso país do que a versão final (que foi apresentada no passado dia 18, Segunda-feira). Logo saltaram as questões do costume: acusações de censura, pressões políticas, jogos políticos, …, o que terá levado o próprio secretário-geral da OCDE, o mexicano Angel Gurría, a intervir e afirmar como sua a decisão da ausência do ex-ministro. A meu ver muito bem, pois seria óbvio que as atenções recairiam no próprio Álvaro Pereira quando deveriam centrar-se, naturalmente, em Portugal – o que, convenhamos, não parece algo óbvio para os políticos portugueses, que parecem preferir o jogo político à tomada de decisões políticas informadas, por exemplo baseadas em relatórios técnicos como este da OCDE…

Aliás, um relatório bienal sobre a economia de um país para que servirá se não para aprendermos com ele, reflectirmos naquilo que, no fundo, é o que somos, e decidirmos qual o melhor caminho a seguir?! Certo, também serve como arma de arremesso político… Já agora, o ex-ministro Álvaro Pereira é actualmente Director do Ramo de Estudos de País (tradução livre de “Director of the Country Studies Branch”) do Departamento de Economia da OCDE, pelo que a sua presença poderia fazer sentido, embora isso não o obrigue a ser a imagem da OCDE, nem o porta-voz das conclusões deste relatório. E, francamente, o que interessa são as conclusões e recomendações do relatório e não linchamentos políticos.

Uma certa censura, essa sim, à inclusão do tema da corrupção neste relatório, que nem é um tema central deste relatório mas poderia ser, tais os danos socio-económicos que causa a este nosso país, é algo extremamente irónico. Acordemos: Portugal, século XXI, é aqui que vivemos, e a corrupção existe, provavelmente em doses elevadas! Basta que recordemos nomes de ex-políticos com eventuais ligações à corrupção, presenças assíduas nos meios de comunicação social: Armando Vara, José Sócrates, José Oliveira e Costa, Duarte Lima, …, e muitos mais.

Qual é a polémica possível em a OCDE referir a corrupção como um problema de Portugal: é mentira? Não, é o nosso dia-a-dia. O relatório, contudo, incide mais na justiça (no geral), e nas exportações, além dos dados socio-económicos, naturalmente. Quanto à justiça, destaca-se o seu mau funcionamento geral, a lentidão dos processos, a produtividade baixa deste sector onde o número de juízes tem subido nos últimos anos (em comparação com o número de habitantes) e neste nosso país com um dos maiores números de advogados em toda a OCDE. Sejamos também positivos: as exportações têm subido, o que é um bom indicador económico.

Quanto à questão da subida de impostos dos combustíveis, em particular o gasóleo, compreendo que a primeira reacção do povo Português seja a de repúdio, dado o baixo rendimento geral da população e o baixo nível de vida que temos. Além disto, o povo percebe que a recomendação de subida dos impostos no gasóleo, a ser seguida pelo governo, não vai ser acompanhada de uma descida na gasolina (como se poderá supor), pois tem sido esta a prática: um sucessivo aumento de impostos, directos ou indirectos, com influência no nível de vida, cada vez mais baixo quando não há um respectivo acompanhamento de subida de rendimentos.

Por outro lado, uma resposta compreensível e frequente a esta notícia pela mesma população depauperada é a afirmação da necessidade de convergência dos salários nacionais com a média europeia – e aqui entrará a questão da produtividade, que tem diminuído de acordo com o mesmo relatório. O povo tem razões para reclamar, na minha opinião, não obstante o relatório da OCDE também ter razão ao sugerir a subida do imposto do gasóleo, porque, sublinhe-se, o problema não é o gasóleo em particular mas a taxação das emissões de carbono e das energias poluentes, que não têm uma correlação directa com os impostos (basicamente, o que aqui se defende é que se polui mais deve pagar mais impostos).

As parangonas sensacionalistas, e abordagens pouco cuidadas a um relatório extenso e importante, levam a um descontentamento da população, que é razoável dum certo ponto de vista de quem, por norma, não irá aprofundar a fonte da informação. O relatório, contudo, está bastante acessível no site da OCDE (http://www.oecd.org/economy/surveys/) – leiam e tirem as vossas conclusões. E atente-se na página 13, onde a recomendação da subida dos impostos sobre o gasóleo, carvão e gás natural é apenas uma de 12 recomendações, e em particular para uma economia mais equilibrada e mais “verde”. Se a gasolina deve descer para “compensar” e até inverter-se o panorama actual (gasolina mais cara do que o gasóleo) é outra questão mas que parece fazer todo o sentido neste contexto de preocupação ambiental.

Não esqueçamos também que há poucos anos “a moda” era um futuro movido a biocombustíveis, ideia que parece posta de parte, felizmente: colocar mais pressão na agricultura apenas para ter uma fonte energética a competir com os combustíveis fósseis (com todos os custos económicos e ambientais de ter mais terra arável, maior uso de pesticidas para controlo de pagas, e até a competição com a indústria alimentar, por exemplo), é uma ideia errada. Portanto atentemos nas cenas dos próximos capítulos mas pergunto desde já: quando se começará a pensar, seriamente, nas energias eólica e solar, ambas renováveis e portanto sustentáveis, para os nossos veículos?!

A ilustração do artigo desta semana já estava preparada e mantenho-a: há uns anos encontrei este belo Trabant nas ruas de Praga. O Trabant, produzido na então República Democrata Alemã, e contemporâneo da organização precursora da OCDE, é um símbolo da História Europeia, e reflecte uma outra maneira de pensar o automóvel, a tecnologia e a própria sociedade… A recomendação da OCDE de aumento do imposto será mais um prego no caixão dos veículos a gasóleo? Assim parece, mas isso já será matéria para outro artigo.

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