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O arqueólogo Francisco Martins Sarmento: uma leitura pela imprensa vimaranense

O arqueólogo Francisco Martins Sarmento: uma leitura pela imprensa vimaranense

Entre personalidades mais eminentes da nossa terra o glorioso exumador da Citânia de Briteiros ocupa um lugar de grande destaque numa terra rica pelas suas indústrias, mas inteiramente carecidas de instituições de ensino. (in Comércio de Guimarães, ano 84, nº6573, As grandes figuras de Guimarães- Francisco Martins Sarmento,2 de setembro de 1967, p1-2)

Francisco Martins Sarmento, tal como refere o excerto da notícia, posicionou-se, pelos seus feitos, entre as figuras vimaranenses de maior destaque. Foi, por isso, várias vezes notícia nos periódicos locais. Para que a pesquisa tivesse resultados mais coerentes e contínuos, foram escolhidos para análise três periódicos que acompanharam o percurso da Sociedade Martins Sarmento e do seu patrono: Religião e Pátria (1862-1865/1867-1895), Comércio de Guimarães (1884-2016) e Notícias de Guimarães (1932-2012).

As principais temáticas abordadas nos jornais em análise referem-se ao anúncio da morte do arqueólogo, em 1899, às festas em sua homenagem, sobretudo depois da sua morte, ao centenário do seu nascimento, ao centenário da sua morte e a vários textos publicados para assinalar a data do seu aniversário, com o objetivo de fazer perpetuar o seu nome e os seus feitos junto das gerações futuras.

As grandes figuras de Guimarães[1] (…) é o título da notícia publicada no Comércio de Guimarães, no qual é feito o enquadramento biográfico do arqueólogo vimaranense, com base num estudo elaborado pelo Coronel Mário Cardoso. Segundo este, Francisco Martins Sarmento deixou Guimarães com 15 anos, dirigindo-se para Coimbra com o objetivo de tirar a licenciatura em Direito. Apesar da sua formação, foi desenvolvendo as suas pesquisas em áreas como a arqueologia e a história e outras áreas afins, como a etnologia. A notícia refere, inclusivamente, que Martins Sarmento foi essencialmente etnólogo, pois a sua principal preocupação seria descobrir a origem dos Lusitanos.

Na notícia intitula Dr. Francisco Martins Sarmento, publicada no Comércio de Guimarães,  da autoria de Domingos Guimarães, são salientados os estudos minuciosos, realizados na sua biblioteca, onde passava dias e noites[2], assim como a sua dedicação à exploração de ruínas e as visitas a monumentos arqueológicos, que realizava por toda a província de Entre Douro e Minho, e que o habilitaram a conhecer como ninguém a arqueologia do norte de Portugal. Defende o mesmo autor que, antes de desenvolver o gosto pela arqueologia, Martins Sarmento nascera poeta. Refere, ainda, que em 1855 publicou um volume de versos intitulado Poesias, que recebeu muitas críticas negativas, chegando mesmo a ser acusado de plágio, facto que fez com que desistisse da poesia.

Nos periódicos da época, é ainda destacada a presença de Sarmento na imprensa, como comprova a notícia intitulada Galeria Ilustrada de Vimaranenses notáveis- Francisco Martins Sarmento[3], do N.G., na qual o P.e Alberto Gonçalves refere que, além das publicações vimaranenses já mencionadas, Martins Sarmento marcou presença em jornais do Porto, como o Museu Ilustrado, a Renascença, a Vida Moderna, a Arte Portuguesa entre outros, tendo mesmo chegado a colaborar no Ocidente, periódico lisboeta, e no Tirocínio, de Barcelos.

Também o reconhecimento de que Martins Sarmento era alvo, tanto a nível local, como a nível nacional e internacional, aparece noticiado em vários periódicos. Em 1933, num texto publicado no Comércio, Eduardo de Almeida refere que Martins Sarmento trabalhava com rigorosos métodos científicos em século de luta entre naturalistas e românticos literários[4]. Dá conta, igualmente, da fundação da Sociedade Martins Sarmento, não apenas para que o nome de Martins Sarmento perdurasse para a posterioridade, mas também para que guardasse e seguisse as lições do Mestre, ao adotar como lema principal a promoção da instrução da população em Guimarães.

Martins Sarmento ainda acompanhou os primeiros anos de existência da Sociedade, tendo  feito diversas doações, financeiras e materiais, como, por exemplo, de dois braceletes de ouro, lápides romanas, uma coleção de numismática e de gravuras do século XVIII e XIX, assim como o espólio encontrado na Citânia de Briteiros e no Castro de Sabroso. Estas ofertas foram também anunciadas na imprensa local. A título de exemplo, na notícia sobre a Sociedade Martins Sarmento[5], publicada no Religião e Pátria, informava-se que o Dr. Francisco Martins Sarmento fez conduzir para o Museu da Sociedade vários exemplares arqueológicos das ruínas da Citânia.

A notícia da morte de Francisco Martins Sarmento, a 11 de agosto de 1899, recebida com grande tristeza pela população vimaranense, foi capa do Comércio de Guimarães[6] nos seguintes termos: acaba de soltar o último alento o sábio ilustre (…) eclipsando-se agora para rebrilhar com puríssima luz nas páginas da história.

O arqueológo tinha alguns problemas de saúde, no entanto, no último período da sua vida, sofreu de uma congestão espinal que lhe causou paralisia dos membros inferiores e depois se propagou ao cérebro, para o que terá contribuído o excesso de trabalho.

O impacto da notícia do falecimento afetou toda a sociedade de Guimarães, que lhe prestou uma última homenagem, assistindo ao seu velório, como dá conta a notícia do Comércio denominada Francisco Martins Sarmento- honras fúnebres[7], relatando que artistas, industriais e comerciantes, as classes mais baixas e as mais abastadas acompanharam religiosamente até beira-tumulo o grande português extinto.

As homenagens após a sua morte não se verificaram apenas nas cerimónias fúnebres, prolongando-se por vários meses, segundo os relatos da imprensa. A promoção de um cortejo organizado pela Direção da Sociedade, para dia 11 de março de 1900, ou a publicação de um número especial, no mesmo ano, da Revista de Guimarães, que contém textos de homenagem, escritos por amigos mais próximos, ou simplesmente por admiradores da sua personalidade e dos seus feitos, constituem duas das homenagens de maior relevo. Segundo consta no artigo do Comércio de Guimarães, de 9 de fevereiro de 1900[8], o cortejo deveria ser realizado de forma majestosa, sendo constituído por cinco carros alegóricos em representação de instituições vimaranenses. O primeiro seria o da Sociedade Martins Sarmento; em segundo, o dos alunos da Escola Industrial; o terceiro, representaria a Agricultura; o quarto carro, o dos Bombeiros Voluntários de Guimarães; e, por fim, o carro da Tipografia Minerva. A completar o cortejo, bandas de música que acompanhavam outras associações vimaranenses e muitos populares, com destaque para a classe operária, devido, muito possivelmente, ao contributo que Francisco Martins Sarmento deu para a instrução desta classe. Como forma de aumentar a participação dos vimaranenses na festa de homenagem, a Direção da Sociedade lançou o convite para a ornamentação das janelas das Associações por onde o cortejo passava.

Sociedade Martins Sarmento[9] intitula o artigo do Comércio onde é feito um balanço desta festa de homenagem, que também foi divulgada em diversos jornais nacionais. Tal como é referido, os participantes mais exigentes, tanto de Guimarães como de fora, que a presenciaram, ficaram bastante satisfeitos. É ainda mencionado o facto de ninguém esperar que numa pequena e modesta terra de província fosse possível organizar eventos de homenagem com tal êxito e grandiosidade, podendo, desta forma, Guimarães começar a ser comparada às grandes cidades.

Após a morte do patrono da Sociedade, a imprensa passou a noticiar igualmente aquilo que, de forma testamentária, foi deixado à instituição. Segundo o seu testamento e a notícia Martins Sarmento e o seu legado[10], publicada no Comércio de Guimarães, a Sociedade Martins Sarmento herdou a administração e conservação da Citânia de Briteiros, todos os livros da sua biblioteca, a regularização automática das dívidas que tinha em relação a ele, a Quinta do Carvalho em S. Salvador de Briteiros e a casa onde vivia, localizada no atual Largo Francisco Martins Sarmento, para a instalação de um instituto de ensino. Nela é ainda possível ler que, além dos bens, a Sociedade Martins Sarmento herdou também a missão de seguir com os ideais que levaram à sua constituição, promovendo a instrução da classe trabalhadora.

Tal como referido anteriormente, os textos de homenagem eram divulgados constantemente através dos jornais da cidade. O Comércio de Guimarães é o que, dentro dos três periódicos escolhidos, se destaca com maior número de artigos comemorativos, justificado pelo seu período de existência, sendo que o Religião e Pátria termina em 1894 e o Notícias de Guimarães apenas inicia a sua publicação em 1932. Em 1922, o Comércio volta a destacar-se com a publicação de um número especial de homenagem à Sociedade Martins Sarmento e ao seu patrono, como forma de demostrar a estima entre ambas a entidades.

Das várias notícias publicadas no número em questão, duas merecem particular destaque, da autoria de dois vimaranenses conhecidos na época, Francisco Martins e de Alberto Vieira Braga, sendo este conhecido pelos seus estudos sobre tradições populares. Francisco Martins considera a Sociedade Martins Sarmento como a síntese brilhante dos mais nobre estímulos[11], traduzindo-se numa instituição que cumpre todos os objetivos propostos pelo seu patrono e pela geração que a fundou. Alberto Vieira Braga[12] escreve no seu artigo que as homenagens que glorificassem um homem e fizessem recordar a sua obra eram sempre justas e de interesse e que assim fosse para sempre. Para que o respeito a Martins Sarmento e o amor à instituição, que dele herdou o nome, fossem cada vez maiores e mais propagados pelas gerações futuras.

Na década de 30, a Sociedade começa a ser novamente merecedora de destaque por parte do Comércio e Notícias de Guimarães, devido à organização das Comemorações do Centenário do Nascimento de Francisco Martins Sarmento. Ambos os jornais começam a publicitar a organização desta homenagem cerca de um ano antes da mesma. O Notícias de Guimarães fá-lo primeiro, através do artigo intitulado Centenário Sarmentino[13], mencionando que a data da notícia marcava o tempo ideal para a preparação do programa à altura da figura homenageada e não menos ao nível de uma cidade que tem a responsabilidade de tal. É ainda sugerida a construção de uma estátua e a reunião dos apontamentos e correspondência de Martins Sarmento num volume intitulado Dispersos. Em março, o mesmo jornal[14] refere-se novamente ao tema em questão, alegando que o programa não seria pomposo, por carência de recursos, e poderia mesmo ser discreto e simples, mas que, no entanto, teria que ser digno do homem que se pretendia exaltar. Ainda no mesmo periódico (N.G), em agosto, é publicada a notícia A comemoração do Centenário Sarmentino[15], na qual Mário Cardoso (presidente da Direção da Sociedade à data) divulga o surgimento da ideia, por parte da Direção, em festejar o centenário não no dia 9 de março, como seria expectado, mas entre julho e agosto. O principal objetivo seria fazer com que coincidisse com as festas Gualterianas, que tinham lugar em agosto, para que assim existisse uma maior colaboração entre organizadores, de forma que os vimaranenses se sentissem mais motivados para participar.

Com o passar do tempo, a Direção foi desenvolvendo o programa das comemorações e, em dezembro do mesmo ano, é transcrita uma circular no Comércio de Guimarães[16], enviada a todas a agremiações culturais do país, a convida-las a participar na homenagem. Não era da vontade da Sociedade que as comemorações se restringissem aos vimaranenses, mas que despertassem a atenção e o interesse de todo o país e até do estrangeiro.

A decisão de mudança de data das comemorações foi alvo de críticas, e como os jornais eram, na época, um dos principais meios de propagação, foram também publicadas notícias sobre o assunto. Alfredo Pimenta foi um dos críticos desta decisão e, segundo refere no artigo O centenário de Martins Sarmento[17], do Notícias, a Direção da Sociedade adaptou o programa para que as comemorações se realizassem até finais de junho, para que não se cruzassem com as Festas da Cidade e tivessem a exclusividade merecida.

A comemoração do 1º Centenário do ilustre vimaranense Dr. Martins Sarmento[18] é o título da notícia publicada no Notícias, na qual é feita a descrição pormenorizada das comemorações, dignas da memória do patrono da Sociedade, que atingiram o máximo brilhantismo.

Por fim, e após cerca de 70 anos, outro dos temas que teve maior destaque foi o Centenário da Morte de Martins Sarmento, ainda que a instituição e o seu patrono tenham sido alvo de notícia entre as datas de ambos os centenários. Tal como nas comemorações do centenário anteriormente descrito, as notícias começam a surgir cerca de um ano antes da sua realização. A 11 de julho, de 1998, com a publicação do artigo Centenário da morte de Martins Sarmento[19], começam a ser divulgados no Comércio de Guimarães os preparativos, anunciando-se a data da homenagem, que ocorreu entre março e novembro de 1999, com a realização de várias iniciativas culturais. Entre estas, mereceu destaque o Congresso de Proto-história Europeia, tal como referido na notícia[20] do Notícias de Guimarães.

A uma semana do início, as Comemorações são novamente publicitadas no Comércio[21] com a publicação da notícia da autoria de Elisabete Pinto, na qual é referido que, apesar da maior frequência de homenagem após o falecimento de Martins Sarmento, a sua obra já tinha começado a ser reconhecida ainda em vida pelos seus conterrâneos, através da criação da Sociedade Martins Sarmento. A partir da leitura da mesma, é possível conhecer o programa das Comemorações em pormenor. Dele constavam o Congresso de Proto-história Europeia, a entrega de prémios, concertos musicais, uma romagem e missa (em agosto), uma exposição sobre a vida de Martins Sarmento e, ainda, outra de homenagem a José de Sampaio, 1º presidente da Sociedade (em setembro).

No final das comemorações, foi novamente feito um balanço através da entrevista publicada no Comércio de Guimarães[22] na qual Santos Simões afirma que, apesar de o programa ser complicado, correu da melhor maneira possível.

Pode-se concluir que Martins Sarmento foi um dos temas mais focado pelos periódicos analisados, tendo como principal objetivo perpetuar o seu nome para as gerações que não acompanharam os seus feitos e não têm pleno conhecimento da sua dimensão para Guimarães.

[1] Ano 84, nº6573, 2 de setembro de 1967, p1-2.

[2] Ano13, 11 de março de 1897, Dr. Francisco Martins Sarmento, p.1.

[3] Ano9, nº419, 18 de fevereiro de 1940, p.2.

[4] Ano 50, nº4671, 9 de junho de 1933, p.1.

[5] Série 47, 24 de maio de 1890, p.2.

[6] Ano 16, nº 1410, Dr. Francisco Martins Sarmento, 11 de agosto de 1899, p.1.

[7] Ano 16, nº1412, 18 de agosto de 1899, p.1.

[8] Ano16, nº1458, Sociedade Martins Sarmento, p.2.

[9] Ano 16, nº1467, Sociedade Martins Sarmento, 16 de março de 1900, p.1.

[10] Ano 99, nº7356, 18 de março de 1983, p.1/2.

[11] Ano 38, nº3572, 7 de março de 1922, p.3.

[12] Ano38, nº3572, Sociedade Martins Sarmento em festa, 7 de março de 1922, p.2.

[13] Ano1, nº3, 25 de janeiro de 1932, p.1.

[14] Notícias de Guimarães, n 1, Relance da obra de Martins Sarmento, 7 de março de 1932, p.1.

[15] Notícias de Guimarães, ano 1, nº32, 21 de agosto de 1932, p.1/3.

[16] Ano 49, nº4926, Centenário de Martins Sarmento, 20 de dezembro de 1932, p.1

[17] Ano 1, nº51, 8 de janeiro de 1933, p.1.

[18] Ano2, nº 73, 18 de junho de 1932, p.2.

[19] Ano114, nº7981, 11 de junho de 1998, p.15.

[20] Ano67, nº3481, Homenagem a Francisco Martins Sarmento- Primeiro centenário da sua morte assinalado com a realização de um congresso.11 de setembro de 1998, p.5

[21] Ano 115, nº8014, Presidente da República preside às comemorações do centenário da morte- Quem foi Martins Sarmento? 25 de fevereiro de 1999, p.9)

[22] Ana Delgado, Ano 116, nº8050, Terminaram as Comemorações da morte de Martins Sarmento- Balanço positivo, 25 de novembro de 1999, p.13.

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