RESUMO
“Quando o cuidado chega atempado, silencioso e preciso, é porque a logística fez a sua parte.“
Este artigo de opinião científica analisa criticamente o papel da logística em saúde como dimensão estratégica dos sistemas de cuidados. Muito para além da gestão de stocks e materiais, a logística clínica envolve decisões com impacto direto na segurança do utente, na eficiência assistencial e na sustentabilidade institucional. Com base em evidência recente e numa perspetiva integradora, propõe-se uma abordagem poética e fundamentada, que valoriza a logística como função silenciosa, mas vital, na garantia de um cuidado humanizado e tecnicamente eficaz.
Palavras-chave
Logística hospitalar; Eficiência clínica; Qualidade dos cuidados; Cadeia de abastecimento; Planeamento logístico; Humanização em saúde.
INTRODUÇÃO
“A logística em saúde é como o sistema nervoso autónomo: invisível, mas essencial para a vida do sistema.“
A logística hospitalar permanece uma das áreas menos visíveis, mas mais críticas dos sistemas de saúde. Frequentemente reduzida a uma função administrativa e operacional, esta área envolve um conjunto complexo de atividades que vão desde o fornecimento de medicamentos, dispositivos médicos e equipamentos, à gestão de fluxos, transportes internos, processos de esterilização, armazenamento inteligente e rastreabilidade (Pires & Brandão, 2024; Araújo et al., 2025).
Num cenário de recursos limitados, envelhecimento populacional, exigências crescentes de qualidade e segurança, e desafios ecológicos e tecnológicos, a logística deve ser integrada no centro da estratégia hospitalar. Trata-se de uma função que impacta diretamente o tempo, o ritmo e a fluidez do cuidado. A sua ineficiência traduz-se em atrasos, ruturas de stock, desperdício financeiro e insegurança clínica, sendo frequentemente subestimada na formulação de políticas de saúde (Santos & Melo, 2025).
REVISÃO DE LITERATURA
A logística como suporte à decisão clínica
Estudos recentes, como os de Oliveira & Costa (2025), mostram que a logística eficiente reduz o tempo de espera dos utentes, melhora o fluxo assistencial e diminui o stress das equipas clínicas. As ferramentas de logística integrada com dados clínicos — como sistemas ERP (Enterprise Resource Planning) — aumentam a previsibilidade de necessidades e permitem decisões mais rápidas e informadas (Martins et al., 2025).
Cadeia de abastecimento e segurança do cliente
A cadeia logística hospitalar deve garantir não apenas disponibilidade, mas também rastreabilidade, validade, qualidade e conservação adequada dos produtos (Ferreira et al., 2024; Rocha & Ventura, 2025). A rutura de stock de um medicamento essencial ou a falha na entrega de dispositivos cirúrgicos pode comprometer a segurança terapêutica, gerar custos evitáveis e afetar diretamente o prognóstico do cliente.
Logística verde e sustentabilidade
A logística moderna não pode ignorar o seu impacto ambiental. A gestão eficiente de resíduos hospitalares, a digitalização de processos logísticos, a adoção de embalagens reutilizáveis e a otimização da frota hospitalar são práticas promissoras para a sustentabilidade institucional (Rodrigues & Lima, 2024; Cardoso et al., 2025).
O papel da logística na experiência do cliente
Autores como Almeida & Ribeiro (2024) argumentam que a logística influência a perceção de qualidade assistencial por parte do cliente. O tempo de espera, a disponibilidade de camas, a entrega eficaz de refeições e a fluidez no atendimento são, muitas vezes, determinados por decisões logísticas.
DISCUSSÃO
“A logística bem feita não se vê — sente-se no alívio de quem recebe o cuidado certo, na hora certa.“
Apesar da sua importância transversal, a logística em saúde ainda é tratada como um subdomínio da gestão, frequentemente sem voz nas decisões estratégicas e clínicas. A opinião aqui defendida é que a logística deve ser reconhecida como área nuclear na arquitetura da qualidade assistencial. Isto exige investimento em profissionais especializados, interoperabilidade digital, avaliação de indicadores logísticos e formação transversal das equipas clínicas sobre o impacto da logística no seu desempenho.
A inovação em saúde não se resume à inteligência artificial ou à digitalização de prontuários. Ela também depende da fluidez invisível da logística: quando cada seringa está onde deve estar, cada cama é ocupada com precisão, cada equipamento chega funcional e cada processo ocorre com sincronia. A logística é, pois, o compasso silencioso que dita o ritmo do cuidado.
A crítica aqui proposta vai além da valorização funcional: exige um reposicionamento político e institucional da logística nos conselhos de administração hospitalar e nas estratégias ministeriais. Uma saúde pública sustentável começa com cadeias de abastecimento bem geridas, sistemas de transporte eficientes e políticas logísticas alinhadas com os valores do cuidado centrado no cliente.
CONCLUSÃO
“Na logística, como na vida, os pequenos gestos em cadeia mudam grandes desfechos.“
A logística em saúde deve deixar de ser vista como mero suporte e passar a ser reconhecida como um dos pilares operacionais e estratégicos da qualidade, da segurança e da humanização dos cuidados. A sua eficiência traduz-se em tempo ganho, segurança acrescida, redução de desperdício, resiliência organizacional e melhoria da experiência do cliente e do profissional.
Investir em logística é investir em inteligência organizacional, em previsibilidade operacional e em excelência silenciosa. O futuro da saúde não será apenas digital ou tecnológico — será também logístico, preciso, sustentável e humano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Almeida, L., & Ribeiro, T. (2024). A experiência do utente e a fluidez logística em unidades hospitalares. Revista Gestão em Saúde, 11(2), 45–60.
Araújo, J., Mendes, P., & Torres, H. (2025). Integração logística hospitalar e inteligência de dados. European Journal of Hospital Logistics, 17(1), 25–41.
Cardoso, M., Oliveira, F., & Nunes, A. (2025). Logística hospitalar sustentável: estratégias e impactos ambientais. Revista Portuguesa de Saúde e Ambiente, 6(1), 30–48.
Ferreira, D., Almeida, C., & Lopes, R. (2024). Logística hospitalar e segurança do doente: desafios e soluções. Revista Portuguesa de Gestão em Saúde, 19(1), 22–37.
Martins, V., Cunha, L., & Soares, R. (2025). Sistemas ERP em hospitais públicos: uma análise estratégica. Cadernos de Administração em Saúde, 10(1), 66–81.
Oliveira, P., & Costa, M. E. (2025). A logística clínica como fator de eficiência assistencial. European Journal of Hospital Management, 12(2), 55–70.
Pires, A., & Brandão, M. J. (2024). Gestão de operações logísticas em unidades hospitalares: da teoria à prática. Lisboa: Lidel.
Rodrigues, F., & Lima, T. (2024). Logística verde em hospitais: impacto ambiental e boas práticas. Revista Sustentabilidade em Saúde, 8(3), 98–114.
Rocha, C., & Ventura, S. (2025). Falhas logísticas e risco clínico: revisão de eventos adversos evitáveis. Revista de Gestão Clínica, 7(2), 112–126.
Santos, R., & Melo, I. (2025). Planeamento logístico como eixo estratégico da gestão hospitalar. Revista Lusófona de Administração em Saúde, 13(1), 18–33.



