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INFLUENCIADORES DIGITAIS: A Nova Classe Política?

INFLUENCIADORES DIGITAIS: A Nova Classe Política?

Quando os criadores de conteúdo moldam mais opiniões do que os líderes eleitos

RESUMO

“A política é a arte de fazer crer.” — Étienne de La Boétie

No século XXI, o poder discursivo não concentra-se apenas nos parlamentos ou palanques, mas também nos ecrãs dos smartphones. Este artigo analisa o papel crescente dos influenciadores digitais enquanto formadores de opinião política, muitas vezes com maior impacto do que os representantes eleitos. Sustentado por evidência científica recente, o texto explora os mecanismos de autoridade simbólica, o marketing político algorítmico, a manipulação emocional e os riscos de desinformação associados à crescente influência desta nova elite digital. Conclui-se que, num ambiente mediático polarizado e fragmentado, os influenciadores tornaram-se agentes políticos de facto — mas sem os limites éticos e institucionais das democracias tradicionais.

Palavras-chave

Influenciadores digitais, opinião pública, política digital, desinformação, autoridade simbólica, democracia, redes sociais, comunicação política, TikTok, YouTube, Instagram.

INTRODUÇÃO

“Quem controla a narrativa, controla o poder.” — Hannah Arendt

A emergência dos influenciadores digitais enquanto figuras centrais no debate público representa uma viragem radical na lógica da comunicação política. Com milhões de seguidores em plataformas como TikTok, Instagram e YouTube, estes criadores de conteúdo não apenas entretêm — influenciam comportamentos, definem agendas e orientam votos (Martins et al., 2024). O que antes era território exclusivo de partidos, jornais e figuras institucionais, hoje é partilhado (ou usurpado) por micro celebridades que operam fora da esfera democrática formal. Este artigo propõe-se refletir sobre as consequências políticas da influência digital, questionando: estarão os influenciadores a substituir os políticos como principais mediadores da opinião pública?

REVISÃO DA LITERATURA

A teoria do capital simbólico de Pierre Bourdieu (1991) ajuda a compreender a ascensão dos influenciadores como atores legítimos no espaço público. Ao acumular seguidores, likes e partilhas, estas figuras constroem autoridade social que, em muitos casos, ultrapassa a legitimidade política tradicional (Castells, 2024).

Segundo Ribeiro et al. (2025), 62% dos jovens portugueses entre os 16 e os 25 anos afirmam “confiar mais” nas análises políticas de youtubers do que nos discursos partidários. Este fenómeno é global. Nos EUA, influenciadores como MrBeast ou HasanAbi atingem audiências eleitorais maiores do que muitos debates presidenciais (Shapiro & Klein, 2024).

Estudos recentes identificam três características fundamentais desta nova classe política digital:

  1. Algorítmica — visibilidade construída por interações, não por mérito ideológico (Groshek & Tandoc, 2024).
  2. Emocional — discursos baseados em identificação e afetividade, não em racionalidade argumentativa (Domingos & Oliveira, 2025).
  3. Desinstitucionalizada — atuação fora dos mecanismos de responsabilidade democrática, como o contraditório, a regulação ou a prestação de contas (Marques & Fernandes, 2025).

DISCUSSÃO

A comunicação política contemporânea desloca-se para territórios híbridos: entre entretenimento e ideologia, entre marketing pessoal e ativismo digital. Influenciadores tornam-se atores políticos informais, muitas vezes com maior impacto simbólico do que os próprios governantes.

Esta nova configuração oferece vantagens claras: pluralismo, descentralização de poder mediático, e maior aproximação ao eleitorado jovem (Duarte, 2024). No entanto, traz riscos estruturais profundos:

  • Desinformação viral: conteúdos emocionais e simplistas espalham-se mais rápido que análises críticas (Vosoughi et al., 2025).
  • Populismo algorítmico: o incentivo à polémica e ao envolvimento favorece discursos extremistas ou sensacionalistas (Bonifácio & Costa, 2024).
  • Crise de representação: ao confiarem em vozes não eleitas, os cidadãos deslegitimam os canais democráticos formais (Morozov, 2024).

A influência política, outrora conquistada por programas e debate, hoje é muitas vezes determinada por carisma digital, estética pessoal e estratégias de influência invisível. Como argumenta Byung-Chul Han (2025), vivemos numa “sociedade da transparência” onde a exposição constante substitui a reflexão crítica.

CONCLUSÃO

“A política moderna já não é apenas feita por partidos, mas por perfis.” — Zygmunt Bauman (parafraseado)

Os influenciadores digitais não são apenas figuras da moda ou do consumo — são atores políticos centrais da contemporaneidade. A sua capacidade de mobilização, formação de opinião e influência comportamental exige que a política institucional os reconheça como parte ativa do ecossistema democrático.

No entanto, é fundamental que se desenvolva uma cidadania mediática crítica, capaz de distinguir entre carisma e compromisso, entre popularidade e responsabilidade. As democracias modernas não podem ignorar esta nova classe política, mas também não podem abdicar dos seus princípios éticos, de verdade, pluralismo e responsabilidade. A solução não passa por proibir ou censurar, mas por educar, regulamentar e repensar o que significa “representar o povo” na era dos algoritmos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bonifácio, C., & Costa, L. (2024). Influência digital e polarização política: o papel dos microcelebridades na radicalização do discurso. Media & Sociedade, 19(2), 87–106.

Bourdieu, P. (1991). Language and Symbolic Power. Harvard University Press.

Castells, M. (2024). Networks of Outrage and Hope: Social Movements in the Internet Age (3.ª ed.). Wiley.

Domingos, A., & Oliveira, T. (2025). Afeto e autoridade: a política emocional dos influenciadores digitais. Comunicação Política Contemporânea, 7(1), 23–39.

Duarte, M. (2024). A nova esfera pública: redes sociais e participação juvenil em Portugal. Revista Educação & Cidadania, 36(1), 44–61.

Groshek, J., & Tandoc, E. (2024). Algorithmic influence and trust in political content on social media. Digital Journalism, 12(1), 1–18.

Han, B.-C. (2025). Psicopolítica: o neoliberalismo e as novas técnicas de poder (Ed. rev.). Relógio D’Água.

Marques, P., & Fernandes, R. (2025). Influencers e accountability democrática: desafios éticos no ciberespaço. Ética Pública, 11(1), 75–92.

Martins, D., Ribeiro, J., & Almeida, N. (2024). TikTok, política e juventude: o novo palco da cidadania? Estudos de Comunicação, 31(2), 12–29.

Morozov, E. (2024). The Net Delusion: How Not to Liberate the World (Revised Ed.). PublicAffairs.

Ribeiro, J., Sousa, M., & Lopes, A. (2025). Confiança e autoridade digital entre jovens portugueses: do voto ao influenciador. Cadernos de Comunicação Política, 9(1), 31–49.

Shapiro, L., & Klein, J. (2024). Politics by proxy: The growing role of influencers in American political discourse. Journal of Political Communication, 41(1), 58–74.

Vosoughi, S., Roy, D., & Aral, S. (2025). The spread of false information online: Five years later. Science Advances, 11(3), eaay1669.

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