Acerca da 4ª Cruzada.
A aliança estabelecida por Ricardo I de Inglaterra com Saladino não satisfez a ambição do Papa Inocêncio III (1198-1216) em conquistar Jerusalém ao domínio muçulmano, levando-o a convocar a quarta cruzada em 1198. Apelou não apenas aos monarcas, mas também a nobres de condição inferior, impôs o primeiro imposto de cruzada sobre os rendimentos do clero, com o intuito de auxiliar nas despesas, e estabeleceu contacto com Veneza para assegurar o transporte das hostes. Contudo, os preparativos apenas começaram em 1200.
A duração da quarta cruzada compreendeu-se entre 1202 e 1204, mas o empreendimento veio a ficar conhecido como a Cruzada Comercial, dado que foi desviado do seu objectivo original.
A comitiva desta expedição foi liderada por Balduíno IX, Conde de Flandres e o Marquês de Montferrant, que logo no início encontraram dificuldades em pagar a elevada quantia exigida pelo duque de Veneza, Enrico Dandolo, pela travessia dos barcos e do exército.
Assim, o duque propôs uma troca que beneficiaria ambas as partes: o exército dos cruzados reconquistava para o domínio veneziano a cidade de Zara na Dalmácia, na altura ocupada pelos húngaros, e, posteriormente, o duque garantiria a passagem.
Entretanto, Aleixo IV Ângelo (1203-1204), filho do imperador deposto Isac II Ângelo (1185-1195 e 1203-1204), necessita de ajuda para recuperar o trono. Propõe-se comprar o apoio veneziano e cruzado, cujo ponto de partida da expedição era precisamente Veneza, apesar de Constantinopla estar já fortemente endividada à cidade.
A expedição ruma a Constantinopla e Isaac II e seu filho Aleixo IV são repostos no trono, porém, com uma dívida elevada aos cruzados. Isto leva a que os governantes recorram ao lançamento de impostos sobre a população para pagar o serviço prestados pelos cristãos. Entre Julho de 1203 e Janeiro de 1204, o mau estar entre a população local e os cruzados escala, assim como as dissensões entre o rei deposto (refugiado na Trácia) e entre o pai e filho do novo duo governante. A população revolta-se, no final do ano, e os dois reis, pai e filho, são mortos.
Com a morte do Imperador Aleixo IV em Fevereiro de 1204, os cruzados e os venezianos decidem tomar militarmente a cidade e dividirem o Império entre si. A cidade foi alvo de um violento saque, impacto do qual não recuperou mesmo depois de em 1261 ter sido grega.
O Papa Inocêncio III consente, então, que os venezianos dominassem a cidade e criassem novos impostos, tendo por objectivo a reaproximação das duas Igrejas, caso que não se verificou.
Balduíno IX da Flandres e de Hainault é então escolhido para governar a cidade, agora latina, porém acaba por ser capturado numa batalha na Bulgária, sendo sucedido pelo irmão, que não viria a conseguir manter a unidade do território contra os gregos.
Em 1261 a cidade é tomada por Miguel VIII, o Paleólogo, governante de Niceia, que destituiu os venezianos e atribuiu melhores direitos comerciais aos genoveses, caso que derivou na luta entre venezianos e genoveses durante mais de um século.
O império bizantino nunca recuperou da quarta cruzada e o seu enfraquecimento poderia ter sido uma porta aberta aos muçulmanos para a Europa, contudo, estes também sofreram perdas significativas de governantes, durante o século XIII e XIV, o que impediu o seu avanço para ocidente.
Nota: As datas colocadas adiante dos nomes reportam-se geralmente ao período de reinado ou pontificado.
Bibliografia
NICHOLAS, D. (1999). Nobres e Cruzados. In A Evolução do Mundo Medieval. Sociedade, governo e pensamento na Europa: 312-1500. Lisboa, Publicações Europa-América.
Thomas F. Madden, Marshall W. Baldwin et al., «Crusades» in Encyclopaedia Britannica [em linha], Chicago, Encyclopaedia Britannica, Inc., 25 de Outubro de 2019, atual. 2020 [consult. a 15 de Julho de 2020]. Disponível online/ na Internet: < URL: https://www.britannica.com/event/Crusades>