RESUMO
“Das cinzas da crise, nasceu uma enfermagem mais forte e mais estratégica.”
A pandemia da COVID-19 revelou fragilidades estruturais nos sistemas de saúde e, simultaneamente, destacou a resiliência da enfermagem enquanto força vital no cuidado, na liderança e na inovação em contextos adversos. Este artigo de opinião científica propõe uma reflexão sobre a forma como a gestão de crises impactou o papel do enfermeiro, especialmente em cargos de liderança, acelerando transformações organizacionais e valorizando competências como a adaptabilidade, a inteligência emocional e a capacidade de inovação. Com base em literatura recente (2024–2025), defende-se a construção de uma cultura organizacional centrada na preparação para futuras crises, alicerçada na capacitação contínua, na liderança ética e na valorização dos profissionais de saúde.
Palavras-chave
Gestão de crises; enfermagem; liderança transformacional; resiliência; pandemia; inovação em saúde; inteligência emocional.
INTRODUÇÃO
“A crise não cria líderes — revela-os.”
A pandemia de COVID-19 constituiu um verdadeiro teste de stress aos sistemas de saúde. Mas foi também um palco onde a enfermagem demonstrou, com coragem e inteligência, a sua capacidade de adaptação, liderança e criatividade. À medida que as ondas de incerteza varriam hospitais e comunidades, os enfermeiros assumiram papéis de liderança formal e informal, transformando adversidades em oportunidades de reinvenção dos cuidados. Este artigo analisa, em tom crítico, como a gestão de crises pode ser catalisadora de inovação e desenvolvimento profissional na enfermagem, especialmente no domínio da gestão e planeamento estratégico.
METODOLOGIA
“Para compreender o futuro da enfermagem, é preciso escutar as vozes que emergiram do caos.”
Este artigo de opinião científica baseia-se numa revisão narrativa e crítica da literatura recente (2020–2025), focada nas áreas da gestão de crises, liderança em enfermagem, resiliência organizacional e inovação nos cuidados de saúde. A abordagem metodológica é de natureza qualitativa, assente na análise interpretativa e reflexiva de fontes secundárias, com o objetivo de construir uma leitura crítica e integrativa dos fenómenos estudados.
Foram consultadas bases de dados científicas reconhecidas, nomeadamente ScienceDirect, PubMed Central, B-On, Springer, Elsevier e documentos oficiais da Organização Mundial da Saúde (OMS). A seleção dos artigos obedeceu aos seguintes critérios:
- Ano de publicação entre 2020 e 2025, com prioridade para estudos pós-pandemia;
- Relevância direta com a enfermagem de liderança e gestão em contextos de crise;
- Inclusão de perspetivas internacionais e nacionais, com foco especial em experiências aplicadas à realidade europeia e portuguesa.
A análise dos conteúdos foi realizada de forma temática e integrativa, permitindo identificar e discutir os principais padrões emergentes, desafios estruturais e propostas inovadoras no campo da enfermagem. Para além da análise objetiva dos dados, o artigo incorpora uma dimensão opinativa e experiencial, própria de uma abordagem reflexiva comprometida com a melhoria dos cuidados e das políticas de saúde.
Este tipo de metodologia é frequentemente utilizado em artigos opinativos e ensaios académicos em ciências da saúde, permitindo uma síntese crítica e contextualizada do conhecimento (Ferrari, 2015).
REVISÃO DE LITERATURA
Nos últimos anos, diversos estudos destacaram o papel central da enfermagem em contextos de crise sanitária. Segundo Jackson et al. (2024), a resiliência da equipa de enfermagem esteve diretamente associada à capacidade de resposta das instituições. Já Rodrigues e Pereira (2025), num estudo em contexto hospitalar português, identificam que os enfermeiros gestores que adotaram estilos de liderança transformacional foram os que melhor conseguiram preservar o bem-estar das equipas e garantir a continuidade assistencial.
A literatura aponta ainda para o reforço da importância da inteligência emocional na liderança em saúde (Goleman, 2024), especialmente em contextos de pressão, escassez de recursos e exigência moral elevada. Segundo a OMS (2025), o investimento em capacitação para a liderança em enfermagem é um dos pilares para fortalecer a resiliência institucional.
Além disto, a experiência pandémica evidenciou a necessidade de integração de tecnologias digitais na gestão de crises, como salientam Santos et al. (2024), ao analisarem o impacto de sistemas de monitorização remota e plataformas de teleconsulta no apoio à gestão de equipas dispersas territorialmente.
DISCUSSÃO
A gestão de crises não se resume à reação imediata, mas à capacidade de antecipação, adaptação e transformação. No caso da enfermagem, a pandemia reforçou o seu papel estratégico na liderança dos cuidados, desafiando antigos modelos hierárquicos e promovendo uma cultura mais colaborativa e ágil.
Um dos principais legados desta crise é o reconhecimento da resiliência como competência transversal. Mais do que um traço de personalidade, a resiliência pode – e deve — ser cultivada institucionalmente, através de políticas de apoio emocional, programas de mentoring e estruturas organizacionais flexíveis.
A inovação também emergiu como aliada fundamental. Muitos serviços reinventaram-se em tempo recorde, adotando soluções digitais, reorganizando fluxos e capacitando equipas para atuar em novas realidades. Esta agilidade, muitas vezes liderada por enfermeiros, evidenciou a importância de uma gestão descentralizada, participativa e responsiva.
Contudo, nem tudo foi progresso. A sobrecarga emocional, o esgotamento físico e a invisibilidade institucional continuam a ser feridas abertas. Torna-se, por isso, urgente transformar a valorização pontual em políticas estruturais de reconhecimento, formação e participação dos enfermeiros nos processos de decisão.
CONCLUSÃO
“A resiliência organizacional começa na dignidade com que tratamos quem cuida.”
A crise sanitária global deixou marcas, mas também aprendizagens. A enfermagem, alicerçada em competências de liderança, inovação e humanidade, demonstrou ser não apenas essencial, mas estratégica. A gestão de crises, quando integrada com uma cultura de valorização e inovação, pode tornar-se o berço de novas formas de cuidar, liderar e transformar.
Para que estas lições não se percam, é necessário criar estruturas que preparem os serviços de saúde para o futuro: planos de contingência vivos, lideranças distribuídas, tecnologias de apoio e políticas que reforcem a resiliência profissional e institucional. O futuro da saúde exige enfermeiros preparados — e sistemas que saibam cuidar dos seus cuidadores.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Ferrari, R. (2015). Writing narrative style literature reviews. Medical Writing, 24(4), 230–235. https://doi.org/10.1179/2047480615Z.000000000329
Goleman, D. (2024). Inteligência emocional na liderança em saúde: novas práticas para novos tempos. Lisbon: Lidel.
Jackson, D., Bradbury‐Jones, C., & Baptiste, D. (2024). Nursing and resilience: the impact of pandemic leadership. Journal of Advanced Nursing, 80(1), 11–20. https://doi.org/10.1111/jan.15891
Organização Mundial da Saúde (OMS). (2025). State of the world’s nursing 2025: Investing in education, jobs and leadership. Geneva: WHO.
Rodrigues, A., & Pereira, I. (2025). Liderança em enfermagem em tempos de crise: um estudo de caso no contexto hospitalar português. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Pública, 12(1), 55–67.
Santos, M., Costa, L., & Silva, T. (2024). A integração da tecnologia na gestão de equipas de enfermagem em contexto de crise. Gestão e Saúde Digital, 6(2), 103–118. https://doi.org/10.32723/gsd.v6i2.2024



