RESUMO
Apesar do elevado desempenho académico de muitos jovens graduados, o mercado de trabalho revela um paradoxo inquietante: elevados índices de despedimento precoce e fraca retenção entre recém-formados. Este artigo analisa criticamente a discrepância entre a formação universitária e as exigências do mundo profissional contemporâneo, com especial foco nas competências comportamentais (soft skills). Com base em literatura internacional recente (2023–2025), argumenta-se que o modelo educativo atual permanece ancorado em paradigmas do século XX, negligenciando competências socio emocionais críticas. Propõe-se uma integração estratégica e transversal destas competências no ensino superior, como condição sine qua non para uma empregabilidade sustentável no século XXI.
Palavras-chave:
Empregabilidade; Soft Skills; Ensino Superior; Competências Comportamentais; Educação Transversal; Integração Curricular.
1. INTRODUÇÃO
A excelência académica, tradicionalmente medida por desempenho técnico e cognitivo, já não se traduz automaticamente em sucesso profissional. Estudos recentes indicam um crescimento preocupante da taxa de insatisfação por parte dos empregadores em relação às competências comportamentais dos recém-formados (Dunn & Fraser, 2023; Robinson, 2025). Este fenómeno evidencia um desalinhamento estrutural entre o que é ensinado nas universidades e o que é exigido no mundo laboral.
Com a crescente automatização e transformação digital, o capital humano diferencia-se não apenas pelo conhecimento técnico, mas sobretudo pela sua capacidade de comunicar, colaborar, adaptar-se e liderar com inteligência emocional. É neste contexto que as soft skills emergem como fator crítico de empregabilidade, sendo decisivas não só na entrada, mas sobretudo na manutenção e progressão nas organizações (Lee & Ahmad, 2024; Yamamoto, 2024).
2. REVISÃO DA LITERATURA
Estudos empíricos recentes confirmam o défice alarmante de competências comportamentais entre jovens graduados:
- Robinson (2025) revela que 72% dos empregadores consideram os recém-formados deficientes em competências interpessoais básicas, como comunicação oral, trabalho em equipa e gestão de conflitos.
- Dunn & Fraser (2023), com base em 100 empresas britânicas, indicam que os problemas de retenção estão diretamente ligados à fraca resiliência emocional e à incapacidade de gerir o feedback.
- A National Foundation for Educational Research (2025) posiciona os adolescentes britânicos entre os menos competentes em empatia, autocontrolo e assertividade, em comparação internacional.
- Segundo o World Economic Forum (2023), até 2027, mais de 44% das competências profissionais sofrerão alterações radicais, com destaque para a colaboração, resiliência, criatividade e pensamento crítico (Coorpacademy, 2025).
- Goyal & Tan (2024) sublinham que, mesmo em ambientes de aprendizagem digital, é possível desenvolver soft skills desde que o design pedagógico seja adequado.
Quadro 1 — Estimativas de Deficiência em Soft Skills (2025)
Competência Comportamental | Percentual de Deficiência | Fonte |
Comunicação oral | 68% | Robinson (2025) |
Trabalho em equipa | 74% | Robinson (2025) |
Gestão de conflitos | 59% | NFER (2025) |
Capacidade de receber feedback | 63% | Robinson (2025) |
Empatia | 70% | NFER (2025) |
Flexibilidade/adaptabilidade | 66% | Coorpacademy (2025) |
Apresentação pessoal | 52% | Reuters (2025) |
Fonte: Elaboração própria
3. DISCUSSÃO
3.1. A falência do modelo educativo clássico
A ênfase excessiva em avaliações escritas e abordagens teóricas impede o desenvolvimento de competências interpessoais e reflexivas (Alvarez et al., 2025). O atual modelo de ensino superior, fragmentado e disciplinar, continua a reproduzir um paradigma fabril, obsoleto face às exigências do século XXI (Cheng & Moretti, 2023).
3.2. Modelos internacionais eficazes
Diversas experiências internacionais demonstram que a reformulação curricular pode integrar de forma eficaz competências comportamentais:
- Lee & Ahmad (2024) propõem um modelo onde soft skills são ensinadas desde o 1º ano do curso, com resultados positivos na empregabilidade.
- Rodríguez & Koller (2025) destacam a importância da inteligência emocional como competência transversal em todos os cursos.
- Naji (2024) mostra que métodos como aprendizagem entre pares (peer learning), simulações e projetos interdisciplinares contribuem significativamente para o desenvolvimento comportamental.
3.3. O papel das universidades e políticas públicas
A integração estratégica de competências comportamentais exige um esforço conjunto entre universidades, empresas e governos. Sugere-se:
- Reformulação de currículos com foco em aprendizagem ativa;
- Inserção obrigatória de unidades curriculares em inteligência emocional, negociação e trabalho colaborativo;
- Estímulo à aprendizagem experiencial, mentoring, role-playing e coaching (Jon Egging Trust, 2025).
4. CONCLUSÃO
O futuro da empregabilidade depende menos da acumulação de conhecimento técnico e mais da capacidade de aplicar este conhecimento com empatia, ética e colaboração. As universidades que não reformularem os seus currículos com base nas competências comportamentais arriscam-se a perder relevância social e económica. A integração de soft skills não é um luxo — é uma estratégia urgente para garantir mobilidade social, inclusão e sustentabilidade profissional.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Alvarez, J. et al. (2025). Rethinking Higher Education Through Transversal Competency Integration. European Journal of Education, 60(1). https://doi.org/10.1111/ejed.12572
Cheng, L., & Moretti, A. (2023). Designing Interdisciplinary Curricula to Foster Employability Skills. Higher Education Research & Development, 42(5). https://doi.org/10.1080/07294360.2023.2164047
Coorpacademy. (2025). The Top Soft Skills to Develop by 2027 — Future of Jobs Report. https://www.coorpacademy.com/en/blog/learning-innovation-en/the-top-soft-skills-to-develop-by-2027-future-of-jobs-world-economic-forum-2023-report
Dunn, P., & Fraser, A. (2023). Graduate Employability and Soft Skill Deficiencies: An Employer Perspective. Journal of Education and Work, 36(4), 362–380. https://doi.org/10.1080/13639080.2023.1987749
Goyal, R., & Tan, B. (2024). Can Soft Skills Be Taught Online? Lessons from Pandemic Pedagogies. International Review of Education, 70(1). https://doi.org/10.1007/s11159-024-09912-8
Lee, C. Y., & Ahmad, N. (2024). Bridging the Gap: Soft Skills Training for Future-Ready Graduates. Teaching and Teacher Education, 132. https://doi.org/10.1016/j.tate.2024.104242
Naji, A. (2024). Soft Skills Development for Higher Education Students: The New Pedagogical Priority. International Journal of Educational Development, 97. https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2024.102838
National Foundation for Educational Research. (2025). Comparative Analysis of Socioemotional Skills in Adolescents. The Times. https://www.thetimes.co.uk/article/english-teenagers-lag
Rodríguez, M., & Koller, S. (2025). Emotional Intelligence and Conflict Resolution: A Missing Link in Academic Curricula. Journal of Applied Psychology in Education. https://doi.org/10.1016/j.jape.2025.101195
Robinson, B. (2025). 2025 Graduates Lack Skills in Communication, Collaboration and Critical Thinking. Forbes. https://www.forbes.com/sites/bryanrobinson/2024/06/17/2024-graduates-lack-skills