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A educação escolar está para a ciência como a água está para a vida humana: condição fundamental de sobrevivência

A educação escolar está para a ciência como a água está para a vida humana: condição fundamental de sobrevivência

Durante séculos a Educação escolar se desenvolve basicamente no mesmo formato, enquanto um Professor ou Professora expõe um determinado conteúdo educacional, alunos e alunas focados naquele docente, procuram acompanhar seu raciocínio e estabelecer alguma relação mental entre o novo conteúdo e o acumulado anteriormente. Ocorre que nem sempre a dinâmica é assim tão simples, cada docente expõe seu conteúdo de forma diferente e cada discente percebe esse conteúdo de maneira ímpar, isso sem falar em fatores como ambiente físico, recursos materiais disponíveis, nível socioeconômico, condição nutricional, método de ensino adotado, formação dos docentes, fatores financeiros e por fim e não menos importante, os políticos.

Fiscalização revela que 57% das salas de aulas do país são inadequadas[1]. Fonte: Folha de Pernambuco — 27/04/2023.

Diversos teóricos da área educacional promoveram ao longo da história revoluções importantes no processo de ensino-aprendizagem, nomes como Lev Vygotsky, Jean Piaget e Paulo Freire, entre outros, revolucionaram a forma de ensinar e provocaram mudanças estruturais nos diversos sistemas de ensino pelo mundo, porém pesquisadores de outras áreas de conhecimento, como é o caso da neurociência, enfrentaram mais resistência da comunidade educacional, que demorou para iniciar um diálogo entre as duas áreas.

É difícil imaginar que sendo a educação uma área que para alcançar com sucesso seu objetivo necessita realizar modificações cognitivas entre seus atores, não se mostre curiosa com outra área da ciência que caminha na explicação de como o processo de ensino-aprendizagem ocorre no interior do cérebro humano. Parece haver algo no mínimo estranho entre essa “separação” das duas áreas de estudo, afinal, enquanto a primeira depende do funcionamento cerebral humano, a outra caminha em decifrá-lo.

Atualmente a pesquisa científica consegue compreender de que forma o cérebro humano aprende e quais os possíveis caminhos cerebrais aceleradores da aprendizagem como um todo. Funções cerebrais como planejamento, memória, controle inibitório, flexibilidade cognitiva, resolução de problemas e o próprio raciocínio, são amplamente estudadas pela neurociência e demarcadas em suas fases de desenvolvimento mais robustas, condições ideais para amadurecimento e cuidados pontuais a serem tomados durante determinados períodos da vida discente. Porém, são mínimos os sistemas de ensino que investem recursos financeiros na inclusão dos saberes científicos apresentados pela neurociência em suas redes educacionais.

O que conta na escolha de métodos de ensino?

O processo de escolha de métodos de ensino, usualmente apoiados no chamado material didático, composto de livros e materiais digitais para os alunos e professores, treinamento docente, material avaliativo e demais itens que compõem o dia a dia escolar, são escolhidos pelas redes de ensino a partir de um leque de ofertas disponíveis no mercado educacional da região. Nas redes de ensino públicas, há um processo de licitação que, seguindo critérios legais, optam na maioria das vezes pelo material de menor valor que contemplem os itens básicos citados. Nas redes privadas de ensino os critérios de escolha não se modificam muito, apenas há a variável financeira, dependendo do poder individual de “compra” da escola e um cuidado para a forma do material, considerando sua fluidez pedagógica e alcance didático. Mas a ausência de olhares voltados para métodos de ensino que incluíam a neurociência em seus saberes pedagógicos não é o único problema, há situações ainda mais prejudiciais para a educação desenvolvida no interior de nossas escolas.

Em alguns locais brasileiros há registros de desvios financeiros no processo de licitação dos materiais didáticos das redes públicas de educação, colocando a ação corrupta acima das questões de aprendizagem efetiva dos meninos e meninas da região. Em janeiro de 2024, em Porto Alegre, a ex-Secretária de Educação e outras 3 pessoas foram presas por suspeita de corrupção na compra de material escolar[2]. Na ocasião, foi preso também o representante comercial da editora que vendeu os materiais para a Secretaria de Educação.

Em maio de 2024, na cidade de Jucuruçu, no sul da Bahia, houve o registro de desvio da verba pública destinada para a compra de material didático no valor de R$ 5.506.513,42, dinheiro que seria usado para a compra de materiais didáticos através de uma licitação fraudulenta[3].

Em janeiro de 2021, no munícipio de Aparecida — São Paulo, a Polícia Federal deflagrou a operação chamada de APATE[4], com a finalidade de aprofundar as investigações de desvios em verbas da educação no município. Na ocasião, foram descobertas fraudes na licitação para compra de material escolar, além de superfaturamento de mais de R$ 622 mil, com possível utilização de empresas concorrentes nos certames, ligadas ao mesmo empresário, mas registradas em nome de laranjas.

Infelizmente exemplos de desvio da verba pública educacional como os aqui elencados não são difíceis de encontrar, não somente no cenário brasileiro, mas em várias partes do mundo. Nesses casos, a preocupação com o conteúdo desses materiais pedagógicos, sua relação com a ciência e suas descobertas a favor da aprendizagem, parecem ser o que menos importam.

Considerando o pouco diálogo entre a neurociência e a educação, combinado com o descuido de alguns sistemas de ensino com a escolha de seus métodos educacionais, temos a instalação de tempestades perfeitas, que corroem a possibilidade de sucesso educacional e entrega alunos e alunas à própria sorte. Uma ação urgente deve ser tomada, envolvendo as várias instâncias governamentais, a comunidade educacional e a comunidade científica, reunindo esforços para uma virada qualitativa que resulte em melhores índices de aprendizagem e cuidados a curto, médio e longo prazo com a aprendizagem de nossos jovens.

Índices educacionais preocupantes

Na última edição do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), no item criatividade, o Brasil amargou apenas 23 pontos, ficando 10 pontos abaixo da média estabelecida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). De forma simples, uma das questões envolvia a apresentação de uma pintura e solicitava que o estudante escrevesse três títulos para a imagem. Outra apresentava quatro imagens formando uma história em quadrinhos e pedia ao aluno que criasse os diálogos.

Brasil: questão do teste de criatividade do Pisa — Foto: PISA/Divulgação

Tomando como exemplo esta classificação por pontuação brasileira no item criatividade, é possível tecer um paralelo com as descobertas da neurociência sobre esse item. A criatividade é vista por vários cientistas da área como uma função executiva cerebral, que acompanhada de outras funções, depende do amadurecimento cerebral adequado para seu pleno desenvolvimento. Nesse caso, há diversas pesquisas científicas disponíveis sobre as diversas formas de estímulos dessa função cerebral, com especial atenção ao período de amadurecimento e as possíveis janelas de “ouro” para a robustez dessa rede cerebral. Promover um estudo conjunto entre os saberes científicos educacionais acumulados ao longo da história com as novas descobertas da neurociência, mostra-se uma saída inteligente para uma situação calamitosa, exposta nesse momento pelos resultados do último Pisa, mas infelizmente presente em outros momentos educacionais diários.

Outro momento escolar pesquisado por diversos cientistas e publicado em vários periódicos científicos importantes é a questão do tempo escolar.


[1] Disponível em: https://www.folhape.com.br/economia/fiscalizacao-revela-que-57-das-salas-de-aulas-do-pais-sao-inadequadas/268183/ — Acesso em 05/08/2024.

[2] Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2024/01/23/ex-secretaria-de-educacao-e-outras-3-pessoas-sao-presas-por-suspeita-de-corrupcao-na-compra-de-material-escolar-em-porto-alegre.ghtml — Acesso em 05/08/2024.

[3] Disponível em: https://texasnews.com.br/escandalo-em-jucurucu-desvio-de-verbas-da-educacao-passam-dos-5-milhoes/ — Acesso em 05/08/2024.

[4] Disponível em: https://www.gov.br/pf/pt-br/assuntos/noticias/2023/01/pf-investiga-desvios-em-verbas-da-educacao-em-sp — Acesso em: 05/08/2024.

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