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De volta ao começo: por onde anda o Trabalho Decente no Brasil?

De volta ao começo: por onde anda o Trabalho Decente no Brasil?

A cena já é corriqueira no Brasil: em meio ao trânsito de carros, um ciclista passa apressadamente com um grande isopor preso às costas.  É um entregador de comida a domicílio, um “uberizado”, ele está trabalhando. Ele não é empregado do restaurante, não é empregado de quem fez a encomenda e nem da empresa responsável pela entrega. Ele não tem férias e não folga no fim de semana. Ele não tem plano de saúde e não vai se aposentar. Se ele adoecer ou se acidentar, não recebe nada pelos dias em que estiver se recuperando. Afinal, que tipo de trabalho é esse? Com certeza não é Trabalho Decente.

Trabalho Decente, denominado Trabalho Digno em Portugal, é o conceito de trabalho produtivo, adequadamente remunerado, que juntamente com outros direitos como saúde e segurança, torna sua vivência digna. Formalizado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1999, designa um trabalho de qualidade, em condições de liberdade, equidade, sendo considerado condição fundamental para a superação da pobreza e redução das desigualdades sociais.

Em maio de 2006, o Brasil lançou a Agenda Nacional de Trabalho Decente (ANTD) e, posteriormente, em 2011, a Agenda Nacional de Trabalho Decente para a Juventude (ANTDJ). Ambas as agendas foram fruto de um Memorando de Entendimento assinado em 2003 pelo então Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e pelo Diretor-Geral da OIT, Juan Somavia. Com o Memorando assinado, iniciou-se no Brasil uma cadeia de eventos, incluindo extensas reuniões tripartites consensuadas, que teve como resultado a incorporação do objetivo de promoção do Trabalho Decente como prioridade nas políticas nacionais.

Avançando no debate, realizou-se no país, no período de 8 a 11 de agosto de 2013, a I Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente (I CNETD).  A Conferência representou o resultado das discussões ocorridas em 273 conferências preparatórias, 26 estaduais, 104 regionais, cinco microrregionais e 138 municipais, processo que culminou com a participação de mais de 25 mil pessoas. Essa Conferência representou a discussão mais ampla em torno do mundo do Trabalho já realizada no Brasil e no mundo.

Outro avanço digno de nota foi a elaboração do Programa Nacional de Trabalho Decente (PNTD), em 2010, com o objetivo de estabelecer no país as suas prioridades, os resultados esperados e as estratégias, metas, prazos, produtos e indicadores de avaliação. O Programa foi incluído no PPA (Plano Plurianual) do orçamento federal e, assim, oficialmente, consolidaram-se na agenda da nação as seguintes prioridades: gerar mais e melhores empregos, com igualdade de oportunidades de tratamento; erradicar o trabalho escravo e eliminar o trabalho infantil; e fortalecer os atores tripartites e o diálogo social como um instrumento de governabilidade democrática. Mas o debate foi além. Ainda na primeira década do século XXI, o Brasil iniciou o processo de medição do Trabalho Decente no país. Agora estabelecido como alvo, faltava medir qual o seu déficit.

Atropelado pelo processo de estabelecimento de um governo de direita no Brasil, o cenário do Trabalho encontra-se completamente alterado ao final de 2019. Um retrocesso na dignificação dos trabalhadores pode ser constatado após entrar em vigor a Lei da Reforma Trabalhista brasileira, que resultou no desmoronamento de todos os alicerces do Trabalho Decente no país.

A falácia de que a Reforma geraria milhões de empregos já tinha sido denunciada por representantes dos trabalhadores e da sociedade civil, ainda quando da tramitação da proposição no Congresso Nacional. Havia na argumentação governamental um grande paradoxo, pois o que gera empregos é o crescimento econômico e não a redução de jornada ou a criação de subempregos. Ao contrário, reduzir renda e, consequentemente, reduzir consumo, não agrega nada a uma economia estagnada.

De forma acelerada, o governo de Jair Bolsonaro tem extinto sistematicamente os colegiados responsáveis por pensar as principais políticas governamentais na área trabalhista, enfraquecido os sindicatos e diminuído a importância do Ministério Público do Trabalho. Distante do debate e da busca do Trabalho Decente, o Poder Executivo articula para emplacar agora contratos de trabalho com direitos ainda menos consolidados para os jovens e idosos brasileiros, dois dos segmentos que, historicamente, necessitam de mais proteção. Fica então a questão: qual o limite da precarização do trabalho no Brasil? No que se refere à legislação trabalhista e pelo percurso percorrido nos últimos anos, parece que infelizmente o país tem um longo passado pela frente.

Imagem (KaiPilger) de uso gratuito em Pixabay

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