A crise do sistema judiciário já é há muito conhecida e debatida no meio acadêmico e no político, crise esta que permeia o excesso de processos e a consequente morosidade para conclusão do processo, as altas taxas e custas judiciais, o excesso de prazos, recursos, indas e vindas dos processos, sem mencionar outras questões ainda mais problemáticas.
Neste cenário, os meios alternativos de administração de litígios surgiram como tentativa de colmatar este percalço, por serem mais céleres, menos burocráticos, mais baratos. Entre esses meios alternativos, podemos mencionar a conciliação, a mediação e a arbitragem. Entendo que a negociação não seja um instrumento autônomo, mas antes uma forma de agir em cada um dos meios alternativos de administração de conflito, posto que inerente ao próprio processo, porque para se obter (ou tentar) um acordo, é necessário que haja negociação.
Em relação à conciliação, vemos este recurso ser muito utilizado no próprio sistema judicial, por magistrados, em fase pré-julgamento, estando esta figura prevista em diversos textos legislativos. A conciliação é também medida promovida por diversos advogados entre seus clientes e a parte adversa ou com seu respetivo advogado. Assim, a conciliação pode ser entendida como um meio de administração do conflito no qual as partes assumem o processo decisório, identificando o problema que tem, não necessariamente a sua causa, e onde aquele que tenta a conciliação pode até mesmo sugerir hipóteses de solução, lembrando que este terceiro pode nem mesmo existir, na medida em que as próprias partes em conflito podem chegar a algum acordo sozinhas.
A arbitragem, outra forma de administração alternativa do conflito, impõe a presença de um terceiro, neutro à demanda, e que irá decidir acerca do conflito, não tendo as partes o domínio desta composição. O árbitro não é um magistrado, mas sua decisão tem forma de sentença e não podem ser objeto de recurso ao Poder Judiciário, salvo em caso de nulidade.
Na mediação, as partes são auxiliadas por um terceiro, neutro e imparcial, que irá facilitar o diálogo entre as partes. Na medida em que o processo é voluntário e o papel do mediador é conduzir e desbloquear a comunicação entre as partes, estas possuem maior controle sobre as decisões, sobretudo, pelo desenvolvimento da empatia que o mediador busca promover. O acordo obtido em sede de mediação, desde que intermediada por um mediador que conste da lista de mediadores do Ministério da Justiça em Portugal.
É sobre a medição que irei tratar e a participação do advogado neste processo. E porque tratar desta questão? Os advogados podem participar de todas as formas de administração de conflito. No entanto, os advogados sentem-se mais à vontade nos processos de arbitragem, pois muito se assemelham aos processos judiciais no tocante ao cumprimento de prazos, apresentação de provas, convencimento do árbitro, entre outros, bem como em relação à conciliação, não só porque já inserida em fases pré-processuais ou pré-julgamento, como também porque eles mesmos, muitas das vezes, tentam promover um acordo extrajudicial. No entanto, e infelizmente, há um certo distanciamento do advogado em relação aos processos de mediação.
Muitos advogados ainda preferem evitar a via da mediação de conflitos, preferindo a vertente contenciosa dos tribunais. Entendo que esta cultura venha ainda dos bancos escolares, onde a unidade curricular de administração alternativa de conflito, quando há, é optativa. Via de regra, as faculdades de Direito tendem a moldar os alunos em sua postura, vestimenta, expressão verbal e não verbal, onde o processo nos tribunais é priorizado; onde a rivalidade é primazia. Nesta linha, vemos muitos advogados que “comprar a briga” dos seus clientes e, claramente, tem uma postura adversarial e, não raras vezes, dificultando qualquer processo de negociação. O que dirá de mediação.
Para além da questão cultural, percebo um receio dos advogados em perder clientela, em diminuir seus honorários e, até mesmo, desconhecimento sobre o processo de mediação. No entanto, o papel do advogado neste meio de administração alternativa de conflito é deveras importante, não só porque os clientes, mais do que eles até, às vezes, nunca ouviram falar em mediação, passando a fazer conhecer este processo e suas vantagens, como também um grande “conselheiro” do seu cliente durante todo o processo.
Importante lembrar que o mediador não pode aconselhar, não pode sugerir. Deste modo, o advogado não perde, de forma alguma, espaço. Na verdade, é mais um campo de atuação para os advogados. Há outras vantagens ao advogado que podem ser consideradas: os processos na mediação, mesmo que haja mais de uma sessão, não tem prazos processuais, que é, definitivamente, um motivo de estresse para os advogados, sem falar na não existência de formalismos, como há nos tribunais; os processos são mais céleres e, desta forma, ao invés de “aguentar” um processo por tempo indefinido, pode se dedicar a outro(s) processo(s), aumentando a plasticidade do tempo útil do advogado; como os clientes assumem a capacidade de por si decidirem e chegarem a um acordo, por meio da facilitação da comunicação através da atuação do mediador, os clientes sabem, diretamente, o que está acontecendo com o processo, sob aconselhamento do advogado, que, inclusive, pode (e deve) auxiliar seu cliente em opções criativas para a resolução dos conflitos em questão. Podemos ainda dizer que, se o processo é mais célere, se não há a sensação de “perda vs ganho” no processo, o cliente se sente mais satisfeito, aumentando a reputação do próprio advogado. Este igualmente tende a se sentir mais satisfeito, pois reconhece que a decisão a que ambas as partes chegaram, por ter sido produzida por eles próprios, é mais facilmente cumprida, e, portanto, foi a melhor solução para o caso, que não lhes foi imposta, onde uma das partes acaba por se sentir derrotada, infeliz, injustiçada.
Igualmente não é verdade que os advogados perdem honorários quando indicam o processo de mediação, até porque há a necessidade de preparação do cliente, já que ele precisa estar instruído de como agir no processo de mediação, até em razão da natureza do próprio processo, que garante o empoderamento das partes. Outra questão relevante, e que deriva deste estrito contato, é uma maior relação de confiança do cliente para com o advogado, bem como, por ficar mais satisfeito, o cliente pode propiciar a indicação de ainda mais clientes ao advogado.
Por vários motivos expostos, os advogados não devem “temer” o processo de mediação, pois, para além da importante função dentro do processo junto ao seu cliente, antes e durante o mesmo, o advogado transforma-se em um importante divulgador deste meio de administração de conflito.