O Género literário Fantástico tem sido, ao longo dos tempos, pouco considerado na literatura. Não é este estigma típico do contexto português; infelizmente, é generalizado. Talvez, em Portugal, se sinta mais, porque somos poucos: menos os que lêem; e menos ainda os que lêem Fantástico. Mas um périplo por este mundo, coisa que hoje se faz – bem – sentado em frente a um PC, revela-nos como o Fantástico sofre deste mal de alma um pouco por todo o lado.
Todavia, num país como os Estados Unidos, a minoria que lê Fantástico pode ser maior do que a população portuguesa. Serão poucos, quando comparados com os restantes Géneros – não se duvida -, e sentir-se-ão igualmente preteridos e marginalizados, mas existe um mercado que tornará viável ser-se escritor deste Género.
Em Portugal, as condições são outras. A somar aos poucos leitores que existem, temos poucas editoras a publicar Fantástico e o preconceito da comunidade de escritores nacionais – se pudermos considerar a existência de uma.
O Género Fantástico é especial. E isso é um ponto assente. Nem toda a gente está disponível para o entender ou ler. O Fantástico obriga a romper com as barreiras do racional, com as concepções da realidade, com aquilo que entendemos ser possível… Quem não tiver uma certa flexibilidade mental e uma plasticidade conceptual para realidade, terá grandes dificuldades em descobrir algum interesse num livro de Fantástico. Contudo; não achar uma coisa interessante é muito diferente de apelidá-la de inferior.
Não são só os escritores nacionais que sofrem deste preconceito; como disse, este mal grassa um pouco por todo o mundo. E este preconceito não vem só de escritores, como referi acima, vem também dos editores.
E os leitores? Não terão eles uma palavra a dizer?
É minha convicção que a opinião dos leitores é resultado da opinião dos escritores, editores, enfim: dos opinion makers culturais. Diz-se, por aí, que não devemos tratar os leitores como seres não pensantes; verdade; mas é igualmente verdade que, como em tudo o resto, nos nossos dias, acredita-se não haver tempo para formalizar as nossas próprias opiniões e consomem-se, por isso, as opiniões dos outros. Além disso, existe uma certa preguiça mental que nos empurra a procurar opiniões já formalizadas, uma espécie de fast food para o cérebro. E, em resultado disso, há muito gente a não ler Fantástico pelo que outros dizem dele e não tanto pelo que eles pensam dele; já que muitos nem pegam num livro deste Género, porque, pelo que ouviram dizer, ou pelo que leram algures, são livros de má qualidade.
Questionem leitores de Fantástico sobre as obras que leram e verão como dissertam sobre elas como todos os leitores de qualquer outro género.
O Fantástico é vítima de um contexto de preconceito, como ocorre com tantas outras coisas na nossa sociedade, onde – ainda – o ser diferente continua a ter os dedos apontados, enquanto o apelidam de tudo e mais alguma coisa. Não sei se é o status quo que se sente ameaçado, se são os agentes culturais que falham em reconhecer que a sua inépcia na leitura do Fantástico não tem de significar que o Fantástico seja de categoria inferior; mas estou certo de que, hoje, o preconceito contra o Fantástico é mais de ordem cultural do que efectiva, é o eco de anos de ostracização, e é a reiteração da propaganda elitista papagueada pelos agentes culturais, mais interessados em defender os seus interesses do que em defender a cultura. Ainda assim, é preocupante, para quem escreve Fantástico – e para quem o lê – que ainda hoje se ouçam escritores de Fantástico recusarem esse epíteto, sob a desculpa de que o que escrevem não tem um Género certo, ou preferindo apelidá-lo de surrealista… Ser surrealista, aparentemente, é mais aceitável.