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À Procura da Felicidade

À Procura da Felicidade

No outro dia, depois de uma discussão, apercebi-me da importância das zonas cinzentas.

A Humanidade é ensinada, desde tenra idade, a expurgar as zonas cinzentas da sua realidade. Frases como «não há mais ou menos», «ou é sim, ou é não», procuram criar nas nossas mentes a ideia de que o «Nim» é incivilizado; e o avanço tecnológico, claramente associado às ciências exactas, procura demonstrar – e até demonstra – que a exactidão é extremamente importante e que o «Nim» até pode ser contra-evolucionário. Assim, crescemos e vivemos procurando expulsar as zonas cinzentas do nosso dia-a-dia, querendo que tudo seja preto no branco, ou sim, ou não, ou mais, ou menos…

Todavia, é, também, verdade que – possivelmente – é por isso que vivemos sempre frustrados, porque não entendemos as coisas que nos acontecem e porque nada é como gostaríamos que fosse. Esta nossa obsessão pela exactidão, conduz-nos por caminhos sem curvas, sem lombas e sem saídas onde tudo é – simplesmente, é – como é e sem espaços para conjecturar «ses» e «porquês». Contudo, se soubermos aceitar que – na sua grande maioria – as coisas são, de facto, cinzentas, e que tudo tem múltiplas faces – ou, pelos menos, duas – poderemos conseguir prosseguir; como tantos outros. Mas se não aceitarmos, se nos mantivermos convictos de que não há «Nins», então, temos um problema.

Nessa altura os nossos cérebros são invadidos pelo país dos porquês; os soldados irrompem pelas nossas fronteiras, desenhadas preto no branco, esmagam os nossos Sins, fuzilam os Nãos, prendem os Mais e escravizam os Menos. E eis-nos, nós, que até vivíamos num mundo certinho, com tudo organizado nas estantes certas, sem coisas penduradas pelas paredes e com as gavetas muito arrumadinhas, em fuga desesperada, tentando, aflitos, salvar os nossos Sins e os nossos Nãos, proteger os Mais e os Menos, procurando reconstruir as fronteiras preto no branco; e é aí que percebemos, finalmente, que – na sua grande maioria – as coisas são, de facto, cinzentas, porque esta guerra não se pode vencer…

Aceitar a existência de zonas cinzentas, quiçá a sua própria necessidade, é na sua essência permitir o acesso à dúvida, ao «por um lado, e por outro», ao «percebo, mas…» e – mais importante – ao «E se…». As zonas cinzentas são espaços de criação e de evolução, são elas que permitem o auto-questionar humano que é – ao fim e ao cabo – o motor de todos os avanços civilizacionais. Se não houvessem zonas cinzentas, nunca ninguém teria questionado se a Terra era mesmo o centro do Universo…

No outro dia, como disse, discutia um assunto da actualidade – não interessa qual. Não pude contra-argumentar, porque não havia espaço, da outra parte, para ouvir, processar, e tentar perceber o que eu queria transmitir. E porquê?

Porque «as pessoas têm direito a»…

É verdade que sim. Mas não terão, também, a «obrigação» de pensar se aquele direito que reclamam faz sentido?

Havia naquela questão, como em todas – da minha perspectiva –, zonas cinzentas; é lá que se podem encontrar as respostas; é lá que está a possibilidade de «sair da caixa», porque é na sua aceitação que os pontos de vista se podem flexibilizar e inovar. Neste caso em concreto, fincou-se o pé nos direitos e obrigações, no preto no branco, e isso apenas perpetuará um conflito surdo que se manterá até que alguém conceda espaço à existência de uma zona cinzenta.

Se todos seres humanos aceitassem a existência de zonas cinzentas, acredito – profundamente – que muita coisa se resolveria e até, talvez, baníssemos definitivamente um dos maiores flagelos dos nossos tempos: os fundamentalismos. Porque os fundamentalismos não são outra coisa se não a negação exacerbada da possibilidade de outras existências, a expressão máxima de «Se não está comigo estás contra mim», o Reino fétido do «Ou sim ou sopas»… Os Fundamentalismos são – também – resultado da expulsão das zonas cinzentas da mente humana.

No entanto, fazê-lo, aceitar o cinzento nas nossas vidas, significa também aceitar o caos, a possibilidade do erro e um mundo de perguntas sem respostas… Infelizmente – parece-me – que há ainda um longo caminho para percorrer até existirem pessoas suficientes para concretizar este passo que nos poderá conduzir a uma humanidade unida. Até lá, viveremos neste mundo bicolor, onde nem o cinzento – até ver – parece ter direito à existência.

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