A ilha que não está em lugar algum, a Utopia de Morus, está cada vez mais utópica – u = não, topos = lugar, em nenhum lugar, posto que essa concepção ideal para a qual nos devíamos dirigir enquanto comunidade global, se dissipou em meio à fumaça da queima dos ideais e das ideias agregadoras, de respeito e de inclusão, tornando-se o mundo em sua práxis, anti-filosófico, anti-ideológico, e apolítico, ou mesmo contra a política, cada vez menos fraterno e inclusivo, tornando-se este o maior dilema de nossos dias.
O CONFRONTO DE MUNDOS COMPLEMENTARES.
É como se nosso polegar quisesse confrontar o indicador, buscando eliminá-lo, desse modo impossibilitando o funcionamento da mão, impedindo sua utilidade, inviabilizando tudo que advém do bom uso da mão. Há dois mundos, um, que podemos chamar genericamente básico, ou estrutural, e outro dito pós-industrial ou desenvolvido, que, como dedos de uma mesma mão não se podem antagonizar, menos ainda pelejar.
O mais antigo mundo, que vem de nossas origens como ser humano, é agrícola, pastoril, artesanal, manufactureiro, ou com industrias mais singelas, de base, é mineiro, extrativista, etc… O outro industrial, transformador, produtor de bens com muito valor acrescentado, que também é muito mais imaterial em suas outras vertentes, incluindo nele todo o mundo virtual, e o financeiro, expressões máximas da imaterialidade. Evidentemente temos que, de sua localização pelas necessidades imperiosas de existir, sempre dependente do meio, o primeiro é rural, interiorano, restrito a microcósmos suburbanos e/ou ligado a vilas e aldeias, portanto muito sedentário, localizado e restrito em comunidades pequenas e fechadas. Já o segundo é urbano, cosmopolita, nómade, indireto e imaterial, distante, e com as últimas evoluções tecnológicas, pode mesmo operar de qualquer lugar, a qualquer hora, podendo agir com antecipação, e programação condensada, diferentemente do anterior que estará sempre adstrito às matérias com que lida diretamente, limitado por um espaço e uma temporalidade absoluta, para que possa existir e operar. Estes dois mundos criaram modelos ideais, e modos de vida tão diversos, que a vertente comportamental e de entendimento de cada um, consubstanciou paradigma absolutamente incomportável com o outro, mas não inconciliável, exigindo esta acomodação cedências, renúncias e alterações profundas, desfazendo erros e equívocos que se consolidaram. Eis a crise ambiental que nos bate à porta.
Não estaremos em situação de abrir mão de nenhum deles, evidentemente, conquistas da Humanidade que são, ainda que uns tontos queiram considerar o primeiro como primitivo, arcaico, rudimentar, esquecendo-se de se questionarem se podem viver sem ele, sem seus produtos alimentares, sem suas matérias primas que permitem ao segundo sua transformação e elaboração, sem a energia que ele fornece, etc… etc.. pensando que o (seu) dinamismo, o do segundo, que gera enorme riqueza, é verdade, poderia existir sem as bases do outro. Se não aceitarem-se, como tal, como mutuamente complementares e dependentes, e como duas opções de vida que se entrelaçam e completam, sendo necessárias ambas, e se quiserem-se enfrentar, como partes de diferentes corpos, quando não são, se destruirão mutuamente. O enfretamento político aí está, e o físico se vem manifestando a cada dia com mais força.
FIM DA ESQUERDA X DIREITA.
Na ânsia de poder, as expressões políticas resolveram oportunisticamente aproveitar das singularidades destes dois mundos, abandonando as estruturas gerais e filosóficas (Ideais, reguladoras de princípios amplos) abstratas e abrangentementes legislativas, o que gerava igualdade, para se dedicarem populista e causuisticamente a facções que lhes retribuem em votos, a atenção às suas diferenças, idiossincrasias e agruras eventuais, e características diversas das outras partes, e, talvez mesmo, causas, abandonando a antiga divisão geral de esquerda/direita, na qual sempre viveram os parlamentos, que geram o que se chama democracia liberal, ou das liberdades cidadãs, ou constitucionais, para darem vazão a peculiaridades circunstanciais convenientes, representantivas de frações diversas de minúscula expressão e poderes pequeninos, fragmentando demasiado a expressão democrática, gerando pequenas facções que se digladiam por atender a sua clientela, sabendo que nunca serão gerais e transversais os valores que defendem. A progredirem serão como os deuses hindus, um para cada cidadão.
Eu que fui e sou de esquerda, sempre aceitei que houvesse rotatividade no poder, porque sempre compreendi que não só os interesses do socialismo devem ser atendidos, mas também os do empresariado gerador e aglutinador de riqueza, mesmo o das grandes fortunas, sabendo que este empresariado, com sua ganância, típica da natureza humana, mais exacerbada, gera a riqueza de um país, esta que permite a criação de mais empregos, e em última análise a própria existência do Estado socialista, para que haja distribuição de riqueza efetivamente. Acredito que toda opção facciosa em si mesma é estúpida, e não vê o todo, logo distópica, por isso sempre fui partidário da alternância no poder de ambas as forças, essas a que se costumavam designar por esquerda e direita, suplantando-se alternadamente. O que não pode e não irá haver, é preponderância de nenhum desses pequenos grupos, e sua compreensível inclusão em blocos de poder, para que aqueles a quem representam vejam atendidas suas demandas e pleitos diminutos em meio ao todo da polis, o que não poderão nunca pretender, como sói hoje ocorrer, é o bloqueio, o impedimento, a perturbação ou mesmo a inviabilização da ação governativa. O Brasil é o caso expoente desta situação.
MAKE AMERICA GREAT AGAIN.
O Sr.Putin está cuidando disso hoje em dia, porque nada como uma real ameaça para aglutinar diferentes tendências, e unir interesses e capacidades afastadas e distantes. Entretanto a expressão, como sabemos, foi usada para realçar nacionalismos e valores, orgulho e brio, numa vertente de atração de grandes camadas populacionais momentaneamente enfeitiçadas com essa pretensão, justa ademais, mas que foi vendida como único caminho para a materialização de suas predisposições em meio à rarefeita atmosfera política que se criou digitalmente, como ambiente para que vingasse a trama de poder que se estava pretendendo impor. Sem nenhum interesse real de fazer a América grande de novo, que grande ela é, mais na busca da hegemonia do poder nos EEUU, com tal penetração que o partido republicano, depois de tudo que passou, e de ter perdido o poder, ainda não encontrou outro caminho que o relançasse para a disputa eleitoral, mantendo-se afastado dessa ideia de uma liderança espúria, contrafeita, que buscava o poder a qualquer preço, que por fim tentou UM GOLPE DE ESTADO na maior Democracia do Mundo, que, felizmente, não resultou, mas que cobrou vidas, descrédito, desordem, caos, como paga e resultado da tentativa. E é quase inacreditável que seu mentor não esteja na cadeia, nem haja ainda processo formado.
Os populismos e a loucura dos outros.
Os populismos que são como os cogumelos, alimentam-se da parte podre que há em todos os corpos, inclusive o social, e, como os cogumelos proliferam em substrato degenerado, multiplicando sua manifestação e forma, fragmentando ao máximo as energias criativas e criadoras do corpo social em que medram, com a manifesta retórica da incongruência que acolhem aos seus eleitores mais aos desavisados que temporariamente se empolgam com ela, na caracterização e sistemática afirmação de dois poderosos ingredientes, sendo um o da mentira sistemática, e o outro o da loucura dos outros. Eis o preço da Democracia, frágil flor.
Os limites do crescimento econômico.
Tudo que existe na economia, manifesta, como seu reflexo e projeção, realidade social, comportamental, e política, à qual gera e alimenta, e que delas se alimenta também. Há exatamente trinta anos, nos documentos que preparei para a Rio92, perguntava até onde pretendem levar o crescimento econômico, que é como quem diga aumentar o bolo. A pergunta é simples: Poderá a economia crescer indefinidamente, ou haverá um ponto a partir do qual será impossível crescer? – O PLANETA É FINITO. CONTINUAR A CRESCER É DISFUNCIONAL. Hoje nos parlamentos toda a discussão gira entorno dos níveis de crescimento econômico, como se fosse o maior dos crimes não crescer. Não aprenderam nada. Pergunto para que deve crescer mais uma Alemanha, um Estados Unidos da América, uma Suiça, já tão ricos e poderosos, ou mesmo Portugal cuja população diminui? O que deve haver é melhor distribuição de riqueza! Outras formas de continuar a gerar riqueza, isso sim. Por outro lado temos que o crescimento econômico cobra um preço ambiental que não podemos mais pagar, desde as matérias não renováveis, à poluição resultante dos elementos instalados, componentes deste crescimento, gerando o que o planeta não pode mais suportar: POLUIÇÃO. Como vamos resolver esse problema? Sem solidariedade e compreensão mútua será impossível. É muito importante compreender e valorizar outras realidades, numa ponta o direito ao progresso e conforto dos milhares de milhões de seres habitantes do mesmo planeta que nós, que se encontram excluídos desse conforto e progresso do qual desfrutamos. Citemos aqui a quase totalidade do continente africano e grande parte da Índia e do subcontinente, para começarmos a refletir na situação ‘Bangladesh’ dos outros. E, como teremos de pôr fim às múltiplas formas de desenvolvimento que geram poluição (Carvão, plástico, hidrocarbonetos e sua liberação de carbono, enxofre, gases com efeito estufa etc… para a atmosfera) às quais permitiram o acesso ao conforto todas as nações que primeiro se desenvolveram, e que agora (queremos) (temos) (devemos) (?) negar às outras para evitarmos a catástrofe ambiental, criando a mais elaborada forma de injustiça, a qual, quando estes ao clamarem por justiça, lançará os povos num confronto impossível, mesmo na forma como me referi no começo da crônica, mas só que agora sob outra vertente, e perspectiva ainda mais irrealizável, uma vez que muitos destes povos ainda não atingiram sequer o estado básico, ou estrutural, fase de uma consolidação pós-extrativista, muito menos a fase transitória da industrialização que se seguiria, mantendo-os num estágio onde é uma quimera a fase de uma sociedade pós-industrial, na qual estamos, configurando todas essas distorções e incongruências implantadas, como quase insuperavelmente estabelecidas.
Há 25 anos quando preveni às nações europeias e ao Brasil e EEUU, da importância de promoverem o desenvolvimento em África, que importa quase tudo que consome, até água mineral (O mais incrível dos absurdos é beber-se Perrier, Beaupré, San Pellegrino e Pierval, em locais como na Guiné Konacri, ou na Tanzânia ou Uganda, junto a rios caudalosos e imensos lagos.) – meus textos saíram então no ‘El País’ e no “Jornal do Brasil”, entre outros, se tivessem saído no Pravda ou no Diário do Povo, não poderiam ter sido mais certeiros, ou mais atendidos, porque eu falava até que o fizessem, promovessem o progresso em África, nem que fosse para terem mercado com poder de compra de bens mais caros de produção das nações muito desenvolvidas, pós-industriais. Passadas duas décadas, as mesmas do incrível desenvolvimento da China, quando essa nação foi alçada para a posição de segunda maior potência mundial, vemos que lá estão profundamente implantadas em África, a China e a Rússia, gerando imenso progresso, o que mostra que é possível fazer acontecer as mudanças, e para que sejam as necessárias e desejáveis só é mister um pouco de dignidade somada a vontade de promover o Bem geral, o que egoisticamente parece muito longe de acontecer, gerando com essas distorções A GRANDE TRAGÉDIA DE NOSSO TEMPO.