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Como a estratégia da Netflix se pode aplicar à satisfação do paciente

Como a estratégia da Netflix se pode aplicar à satisfação do paciente

Navegamos na Netflix , um canal de filmes (streaming) por assinatura mensal, lançado em 1997 como a primeira loja de aluguer de filmes on line,  por Randolph e Hastings na Califórnia, EUA, e que tem fidelizado ao longo dos anos milhões de pessoas. Este é um caso paradigmático de aperfeiçoamento das escolhas e preferências dos clientes.

O Professor Johnson publica este ano (2021) um livro sobre os elementos da escolha dos utilizadores, e reflete, com base na Netflix, sobre cinco pontos que nos fazem decidir e usar os serviços de forma persistente: São eles: 1) Os caminhos plausíveis; 2) os padrões; 3) o número de opções; 4) a ordenação e ; 5) as opções de descrição.

Quadro 1. Os passos das escolhas persistentes

Johnson (2021), um especialista sobre decisão comportamental e comunicação explica que “o objetivo da arquitetura de escolha do Netflix é encontrar coisas que nos fazem felizes de forma barata”.

Como poderemos então fazer este paralelo entre a vontade persistente de viajar pelos filmes desta plataforma e a satisfação do paciente?

Passos estruturantes para a relação em saúde

As 50 técnicas de literacia em saúde. Um guia para a saúde (Vaz de Almeida, Moraes & Brasil, 2020) refletem sobre as estratégias que são apresentadas aqui e que servem também de guia para um melhor acesso, compreensão e uso da informação e dos recursos em saúde, conducentes a melhor tomada de decisão em saúde.

Acresce a estas estratégias, a necessidade de focalização no objetivo dos serviços prestados ao paciente que visam: proporcionar saúde e bem-estar num desempenho eficiente, equilibrado e equitativo onde existe respeito humano entre todas as partes, clareza na comunicação e positividade de esperança, de empatia e compaixão por todos os envolvidos, incluindo os profissionais de saúde.

1º PASSO: PERSONALIZAÇÃO – CONHECER O PERFIL DO PACIENTE

O primeiro passo é conhecer o perfil do paciente, tal como faz a Netflix. Só conseguimos personalizar se conhecermos primeiro.

Johnson (2021), explica que “um mecanismo de escolha interativo é personalizar a arquitetura de escolha”. Personalizar também o atendimento ao paciente parece ser um ponto fulcral.

Em que ciclo de vida esta? De que contextos vem? Quem o influencia? Que nível educacional tem? Que nível de literacia em saúde possui?

O modelo transteórico (Prochaska, Redding & Evers, 1997) alerta para a necessidade de se perceber em que estádio de mudança de comportamento se encontra o paciente. Um paciente que já tentou muitas vezes proceder a uma mudança de comportamento deve ser estimulado de forma diferente de um que esteja ativo e que tenha intenção e queira mudar (Decy & Ryan, 2000).

Aquilo que Johnson (2021), refere como “filtragem colaborativa” isto é, saber o que os utilizadores fizeram antes e escolheram como preferências ajuda  a prever o que as pessoas provavelmente desejarão no futuro. 

Pedir regularmente as avaliações do paciente pode ajudar a explorar novos caminhos da sua jornada.

Conhecer o paciente, a sua família ou quem dele cuida é um passo de confiança na relação em saúde. Saber o perfil, os gostos, as intenções do paciente é o que podemos dizer numa linguagem mais coloquial, “meio caminho andado”.

2º PASSO: NÃO FAZER ESPERAR O PACIENTE

O tempo de espera para os serviços de saúde tem sido sempre uma das reclamações mais evidentes no processo de auscultação da satisfação com os cuidados de saúde.

Conseguir diminuir os tempos de espera ou, em alternativa, caso não seja possível, comunicar ativamente com o paciente e a sua família sobre os momentos e os passos que estão a ser dados, para tranquilizar, parece ser essencial.

Quando a pessoa sabe com o que conta, fica mais ciente e mais capaz de esperar pela sua vez. Para isso a comunicação tem de funcional e não apenas o paciente como os seus acompanhantes devem saber claramente em que momento estão nesse percurso.

3º PASSO: SABER O QUE SATISFAZ O PACIENTE – UMA COMUNICAÇÃO ACP

Os pacientes querem ser bem tratados, com cuidado, com a atenção, como se fossem os únicos. E quantos profissionais de saúde dizem: “Naquele momento ele (paciente) sabe que eu estou ali para ele. Somente para ele”.

Uma comunicação focada no paciente, baseada na assertividade do profissional de saúde, aumenta o envolvimento e confiança do paciente e melhora os resultados, especialmente a satisfação (Ahmed & Bates, 2016).

O respeito estabelecido através de uma relação assertiva, que implica todas as partes mostra que conduz e fortalece uma relação mais equilibrada e justa.

Uma comunicação com base no Modelo ACP – Assertividade, Clareza e Positividade tem surtido efeitos através do seu uso interdependente e agregado (Vaz de Almeida, 2021).

4º PASSO: ESCLARECER DE FORMA CLARA AS OPÇÕES

Para poderem decidir, os pacientes têm de ser esclarecidos. Não basta a informação. Dotar de mais conhecimento, mais motivação e envolvimento e baixar as barreiras, como apresentam Kim e Grunig (2011) com a sua teoria de resolução de problemas, é um caminho essencial.

Um dos grandes desafios dos profissionais de saúde é a necessidade do seu maior contributo na resolução dos problemas do paciente, que podem passar por falhas na compreensão e, assim relacionados com os processos comunicativos, sabendo que esta condição – a compreensão – é também necessária para uma boa adesão terapêutica (Bugalho & Carneiro, 2004).

5º PASSO: A PRIORIDADE DO PACIENTE

Qual a prioridade do paciente? 

Tratadas as questões biomédicas, a urgência da cura, segue-se a linha contínua da relação profissional – paciente que envolve, aquilo que Greenhalgh e Heath (2010) chamam de “conversa de cuidado”. Uma verdadeira parceria com o paciente (Beck, Ragan & Dupre, 1997).

E a prioridade do paciente pode ser também a prioridade do seu cuidador e família, e por isso devem também ser envolvidos nesse reconhecimento da “essência” do paciente (Egener & Cole -Kelly, 2014).

O profissional de saúde não precisa de saber sobre todos os assuntos em profundidade que interessam ao paciente. No entanto, deve poder saber quais são as suas prioridades, quais os temas que são importantes para ele. Johnson (2021) dá um exemplo que contribui para a satisfação do utilizador: “quando a Apple Music recomenda uma melodia, ela não sabe nada sobre o andamento, a batida, a letra ou a instrumentação da música, simplesmente sabe que pessoas com esse perfil, gostam dessa música também”.

6º PASSO: CHUNK & CHECK, REPETIÇÃO E TEACH BACK

Para poder haver compreensão e melhor literacia em saúde tem de haver técnica na forma como a informação em saúde é passada. Tal como na plataforma Netflix, as opções são mostradas passo a passo e com apoio para a melhor decisão. Assim também o profissional pode fazer uso das técnicas do chunk & check, da repetição da informação e do teach-back para mostrar as melhores opções que conduzem a melhores decisões. 

O Chunck & Check é uma técnica que permite dividir a informação em pequenos blocos. Só se passa ao tema seguinte, depois do primeiro ter sido explicado, de forma sucinta e repetida. 

Coleman, Hudson e Pederson (2017), Esteves e Lopes (2021), numa avaliação das melhores práticas de literacia em saúde destacam o uso rotineiro do “teach-back” .

O teach-back é uma técnica que faz recair sobre o profissional a responsabilidade de comunicar bem e por isso, depois da explicação de determinado procedimento, intervenção, solicita ao paciente que repita nas suas palavras para garantir que o profissional (ele mesmo) se fez entender bem. O peso da responsabilidade deve recair sobre o profissional, que quer verificar que se fez entender bem, e não sobre o paciente.

A repetição da informação também é favorável à sua recordação, pelo que repetir com outras palavras o mesmo conteúdo informativo, estimula a memória do paciente para uma melhor retenção.

CONCLUSÃO

Alguns modelos da psicologia social foram usados de forma eficaz em áreas da mudança de comportamentos, por exemplo na publicidade, como o Modelo da Elaboração da Probabilidade (Elaboration-Likelihood Model), de Petty e Cacioppo (1986) utilizado como uma estrutura geral para o estudo da persuasão no campo da psicologia social e no desenvolvimento de comunicação em publicidade. (Sholten, 1996, p. 98). 

O Modelo da Elaboração de Probabilidade (Petty & Cacioppo, 1986) prediz uma mudança de atitude face a uma marca publicitada, onde a atitude se refere a uma avaliação geral da marca (Sholten, 1996, p. 98) e onde o consumidor muda a sua atitude na base de argumentos que vai elaborando e assimilando. Também na relação terapêutica, as características da interação entre o profissional e o paciente criam no processo cognitivo, e por isso envolvendo o conhecimento desse paciente, uma perceção e avaliação geral da qualidade da consulta (O’Connor, 2004), como um reflexo positivo dessa interação de qualidade (Campbell, Roland & Buetow, 2000). 

Aprender as técnicas de literacia em saúde para uma melhor prática dos cuidados em saúde parece ser um bom caminho para a maior envolvência do paciente.

Referências

Ahmed, R., & Bates, B. R. (2016). To accommodate, or not to accommodate: Exploring patient satisfaction with doctor’s accommodative behavior during clinical encounter. Journal of Communication in HealthCare, 9, 22-32. Disponível em: http://www.tandfonline.com/loi/ycih20

Beck, C. S., Ragan, S. L., & Dupre, A. (1997). Partnership for health: Building relationships between women and health caregivers. New York: Routledge.

Bugalho, A., & Carneiro, A. V. (2004). Intervenções para aumentar a adesão terapêutica em patologias crónicas. Lisboa: CEMBE.

Campbell, S.M., Roland, M. O., Buetow, S.A. (2000). Defining quality of care. Social Science and Medicine, 51(11), 1611-1625.

Esteves, S.C. L, & Lopes; A. S.L.  (2021). Educational Strategy in Digital Health Literacy: A Pedagogical Audiovisual Technique for Healthcare Professionals. In Vaz de Almeida, C. & Ramos, S, (Ed.). Handbook of Research on Assertiveness, Clarity, and Positivity in Health Literacy. DOI: 10.4018/978-1-7998-8824-6.ch005

Greenhalgh, T., & Heath, I. (2010). Measuring quality in the therapeutic relationship. An Inquiry into the quality of general practice in England. UK: The King’s Fund.

Johnson, E. (2021) How Netflix’s choice engine drives its business. Disponivel em: https://behavioralscientist.org/how-the-netflix-choice-engine-tries-to-maximize-happiness-per-dollar-spent_ux_ui/

Kim, J-N., & Grunig, J. E. (2011). Problem solving and communicative action: A situational theory of problem solving. Journal of Communication, 61, 120-149. 

O’Connor, R. (2004). Measuring quality of life in health. London: Churchill Livingstone.

Petty, R.E. & Cacioppo, J.T. (1986). The Elaboration Likelihood Model of persuasion. New York: Academic Press.

Prochaska, J.O., Redding C.A., Evers, K.E.  (1997). The Transtheoretical Model and Stages of Change. In: Glanz, K., Lewis, F.M, Rimer, B.K. (editors). Health Behavior and Health Education (2d ed.) San Francisco: Jossey-Bass. [Google Scholar

Scholten, M. (1996). Lost and found: The information-processing model of advertising effectiveness. Journal of Business Research, 37(2), 97–104. https://doi.org/10.1016/0148-2963(96)00058-6

Viswanath, K. (2008). Health Communication. Ed. W. Donsbach, The international encyclopedia of communication (pp. 2073-2087). Malden: Blackwell Publishing.

Williams, M. V., Davis, T., Parker, R. M., & Weiss, B. D. (2002). The role of health literacy in patient-physician communication. Family Medicine, 34(5), 383-389. Disponível em: http://www.stfm.org/Portals/49/Documents/FMPDF/FamilyMedicineVol34Issue5Williams383.pdf

Vaz de Almeida, C., Moraes, K. & Brasil, V. (2020) 50 técnicas de Literacia em saúde. Um guia para a saúde. Ilhas Mauritias: MoreBooks. Disponivel em: https://www.amazon.com/T%C3%A9cnicas-LITERACIA-SA%C3%9ADE-PR%C3%81TICA-Portuguese/dp/6202558822

Vaz de Almeida, C. (2021). ACP Model-Assertiveness, Clarity, and Positivity: A Communication and Health Literacy Model for Health Professionals. In Vaz de Almeida, C. & Ramos, S, (Ed.). Handbook of Research on Assertiveness, Clarity, and Positivity in Health Literacy. Disponivel em: https://www.igi-global.com/chapter/acp-model-assertiveness-clarity-and-positivity/288222

Imagem de capa: Pixbay

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