O Calcolítico é o período crono-cultural da História que se reporta à emergência das primeiras sociedades fortificadas peninsulares, e que alcançou principal expressão na Estremadura portuguesa, composta pelos actuais distritos de Leiria, Lisboa e Setúbal. A ocorrência do Calcolítico começou por ser explicada pela teoria difusionista (vigente em Portugal entre a década de 1940 e de 1970) e a teoria indigenista (década de 1980). Na década de 1990 estabeleceu-se uma teoria de compromisso com base no modelo de Bosch-Gimpera, proposto em 1969. Nem sempre as teses com maior potencial de aproximação ao passado se desenvolvem no presente ou através da expectativa no futuro.
A teoria difusionista foi atribuída a Eugénio Jalhay e explica o fenómeno de calcolitização através da presença de indivíduos de naturalidade distinta da peninsular (alóctones), que terão provocado nos grupos autóctones a necessidade de defesa de pessoas e bens. A teoria indigenista surgiu da decomposição de uma teoria difusionista de Hermanfrid Schubart e Edward Sangmeister, em duas vertentes, versando sobre a possibilidade de competição entre grupos autóctones como motivo para o surgimento das fortificações como solução defensiva. A teoria de compromisso relaciona ambos os modelos, valorizando o contacto indirecto, por motivo de carácter comercial, entre os grupos de proveniência mediterrânea e os radicados na estremadura portuguesa. Esta teoria foi confirmada com base nos elementos arqueológicos disponíveis.
A distribuição geográfica dos principais e mais antigos povoados calcolíticos na Estremadura portuguesa verifica-se em Vila Nova de São Pedro (Azambuja), no Zambujal (Torres Vedras) e em Leceia (Oeiras). Estes partilham semelhanças arquitectónicas entre si, visíveis na presença de muralhas, torres ou cubelos, bastiões e entradas. Essa semelhança explica-se recorrendo à geografia e à economia, pois, todas estão integradas no mesmo ambiente meridional e mediterrâneo e todas foram condicionadas pelas mesmas circunstâncias sociais e económicas. Contudo, apesar de terem adoptado soluções arquitectónicas comuns, não se desenvolveram da mesma forma, tendo cada sociedade adaptado a sua fortificação às circunstâncias geomorfológicas específicas do seu território, à dimensão da sua população e sem esquecer que fora das muralhas também viveria população.
A influência mediterrânica teve expressões distintas no decurso do Calcolítico, detectáveis e estudadas através do registo artefactual da cerâmica, para a qual se considera a tipologia (ex.: construção, comum ou utilitária) e os motivos decorativos.
A tipologia permite identificar a sua função, utilidade e grau de importância de uma determinada actividade. Se um espólio é prolífero em cerâmica funerária, tudo indica que se trata de uma parte importante no quotidiano e na cultura dessa sociedade, como aconteceu com a cultura dolménica entre o V e o III milénio a.C. Se, pelo contrário, o espólio é rico em utensílios agrícolas e florestais, estaremos perante uma sociedade sedentarizada cuja sobrevivência depende do território envolvente ao seu povoado, conforme se verifica no Neolítico Final e no decurso do Calcolítico. Por sua vez, a decoração da cerâmica está relacionada com a identidade cultural de um determinado grupo podendo também indicar a existência de interacção entre grupos quando se encontram motivos decorativos em povoados distintos. Em suma, a cerâmica permite reconhecer as diferenças entre períodos crono-culturais e entre regiões.
A demarcação do Calcolítico Inicial (2800 a.C. – 2600 a.C.) do Neolítico Final, resulta da evolução interna do sistema agro-pastoril, que conduziu a uma expansão, exploração e demarcação territorial organizada, evolução tecnológica e aumento da produção. Ou seja, perante um território em redor do qual se organizavam e do qual dependia a sua subsistência – fosse através do cultivo de cerealíferas e leguminosas, do sistema de pastoreio, do de caça e de pesca, ou da actividade florestal –, perante a produção de bens excedentários e face à instabilidade social entre grupos, o conjunto destes factores tornou característico desta fase a edificação de construções defensivas que defendessem e preservassem a população dando continuidade ao seu florescimento. Os artefactos e estruturas que melhor documentam a importância das actividades agrícolas neste período são os machados, os sachos, os anzóis de cobre, as mós manuais, sistemas de irrigação primitivos, embasamentos de eiras, do povoado de Vila Nova de S. Pedro e Leceia. A decoração da cerâmica canelada, a qualidade do talhe bifacial lítico, as pontas de seta mitriformes, os ídolos com gola feitos de osso e os alfinetes de cabeça maciça torneada são elementos expressivos deste período.
As sociedades do Calcolítico Pleno (2600 a.C. – 2200 a.C.) afirmam-se em termos de organização social e desenvolvimento económico, generalizando-se o comércio transregional e intensificando-se a especialização das produções no quadro da Revolução dos Produtos secundários como se verificou com a exploração de jazidas cupríferas (cobre) para efeitos metalúrgicos, da qual é exemplo o espólio de sovelas, escopros e punções de Leceia. A fiação da lã e a produção de derivados de leite também integram o quadro de novidades tecnológicas. Esta especialização da produção serviu como veículo de difusão de novas técnicas, conforme aconteceu com o cobre, e de novas matérias-primas inexistente em território português, como o marfim ou as contas de minerais verdes, destinados à produção de objectos de expressão de prestígio social. Verificou-se a proliferação artefactos ideotécnicos de índole sagrada, como as placas de xisto e os báculos, abundantes em Vila Nova de S. Pedro e Leceia, também relacionados com a generalização do culto da divindade feminina comprovada neste período. As suas manifestações simbólicas, como as “pinhas” ou as lúnulas, relacionadas com a crença no renascimento, encontraram-se em sepulturas colectivas e grutas artificiais da Baixa Estremadura. A difusão de Norte a Sul de novas técnicas arquitectónicas funerárias, como as tholoi, sepulturas com falsa cúpula, também são adoptadas nesta fase.
Quanto ao espólio, as cerâmicas tipo “folha de acácia”, “crucífera” e campaniforme são representativas deste período e transversais aos povoados enunciados.
Bibliografia
CARDOSO, João Luís – Pré-História de Portugal. Documento PDF. Manual de Pré e Proto História. 1º ciclo de estudos em História. Acessível na Plataforma de E-Learning da Universidade Aberta.



