O ar limpo é considerado um requisito básico para o bem-estar e a saúde humana. Contudo, a poluição do ar continua a representar uma séria ameaça para a saúde mundial. Este tipo de poluição é a maior causa de morte prematura e de doença; na Europa constitui o maior risco ambiental para a saúde humana. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), este tipo de poluição causa anualmente mais de dois milhões de mortes prematuras. Diversos poluentes do ar são diariamente libertados por fontes naturais, mas principalmente por fontes antropogénicas.
Recentemente a Agência Europeia do Ambiente identificou o sector dos transportes e das indústrias, a produção de energia, a agricultura e o tratamento de resíduos como sendo os principais emissores de poluentes do ar na Europa. Alguns destes poluentes são persistentes pelo que permanecem no meio ambiente por longos períodos de tempo e acabam por se acumular no ambiente e na cadeia alimentar, afetando assim a vegetação, os animais e o Homem.
A matéria particulada é um dos mais relevantes e persistentes poluentes do ar ambiente que consistem numa complexa mistura de pequenas partículas sólidas e líquidas que se encontram suspensas no ar. São inúmeras as fontes de matéria particulada no ar ambiente e no ar interior dos edifícios (incluindo as nossas casas) entre as quais se destacam a queima de combustíveis fósseis como o petróleo e o carvão, incineração, queima de biomassa, fogos florestais, emissões agrícolas, emissões de tráfego e de complexos industriais, atividades de limpeza, confeção de alimentos, e o fumo do tabaco. Nos grandes centros urbanos as emissões do tráfego automóvel representam uma das principais fontes de emissão de inúmeros poluentes do ar, entre os quais a matéria particulada.
A matéria particulada é frequentemente classificada de acordo com o seu tamanho aerodinâmico em três principais frações: partículas grosseiras com tamanho superior a 2.5 µm (i.e., 0.0025 mm), partículas finas com tamanho inferior a 2.5 µm (PM2.5) e partículas ultrafinas com tamanho inferior a 0.1 µm (i.e., 0.0001 mm). O tamanho destas partículas é deveras importante uma vez que determina o local onde se poderão depositar no sistema respiratório humano. As partículas grosseiras com tamanho até 10 µm (designadas por PM10) conseguem naturalmente penetrar no sistema respiratório humano por inalação.
Estas partículas tendem a depositar no nariz, boca e na árvore traqueobrônquica enquanto que as partículas mais pequenas conseguem alcançar os pulmões e depositar nos alvéolos pulmonares e nas regiões onde ocorrem as trocas gasosas (ar-sangue); as partículas mais pequenas podem mesmo ser movidas para a corrente sanguínea. Deste modo, quanto menor for o tamanho das partículas a que um individuo está exposto, maior a toxicidade provocada por mecanismos de stress oxidativo e de inflamação causados no sistema cardiorrespiratório. Assim sendo, os potenciais efeitos da matéria particulada na saúde das populações expostas focam-se principalmente no desenvolvimento e/ou agravamento das patologias dos sistemas respiratório e cardiovascular. De um modo geral toda a população é afetada quando exposta, no entanto, a suscetibilidade varia com a saúde e idade do individuo. As crianças, mulheres grávidas, doentes crónicos e os idosos são grupos mais sensíveis pelo que estão mais propensos aos potenciais efeitos da exposição à matéria particulada. Os potenciais riscos da exposição aumentam com o tempo e o nível de exposição.
Em 2013, A Agência Internacional de Investigação para o Cancro classificou a matéria particulada como sendo cancerígeno para o Homem. Mais recentemente a Comissão Lancet para a poluição e a saúde estimou que a exposição a PM2.5 foi responsável pelo aumento de 20% do número de mortes humanas (variou de 3.5 para 4.2 milhões de mortes até 2015) sendo expectável que este número continue a aumentar até atingir cerca de 6.6 milhões de mortes (cerca de 50% de mortes). Existem poucas evidências científicas que apontem um valor limite mínimo de exposição, i.e., um limiar abaixo do qual nenhum efeito adverso à saúde tenha sido registado. Diversos estudos epidemiológicos demonstraram vários efeitos adversos em diferentes populações após uma exposição a curto- e a longo-prazo à matéria particulada. A OMS definiu a concentração anual média de 10 µg de PM2.5 por cada metro cúbico de ar (10 µg/m3) como sendo o valor limite para exposição a longo-prazo. Este limite representa o valor mais baixo da gama de concentrações, para o qual foram registados efeitos significativos na sobrevivência humana pela Sociedade Americana de Cancro.
No último relatório sobre a qualidade do ar emitido pela Agência Europeia do Ambiente foi revelado que a exposição a matéria particulada continuou a exceder os valores limites existentes na maioria do território europeu. Um total de 13% da população urbana dos 28 estados membros da União Europeia foi exposta a níveis que se encontram acima do valor limite diário para a exposição a PM10 (50 µg/m3), sendo que aproximadamente 42% da população esteve exposta a concentrações que excederam o valor mais restrito da OMS (20 µg/m3).
No que respeita à exposição a partículas finas (PM2.5), foi reportado que 6% da população urbana europeia esteve exposta a níveis acima do limite diário da União Europeia (25 µg/m3) com aproximadamente 74% da população a ser exposta a concentrações superiores ao valor do limite da qualidade do ar da OMS (10 µg/m3). Foi ainda estimado que a expectativa de vida entre a população europeia reduziu, em média, quase nove meses devido à exposição a matéria particulada. Vários estudos têm associado a exposição a matéria particulada com o aumento de internamentos e atendimentos de emergência das populações expostas, com o agravamento dos sintomas respiratórios e exacerbação de doenças respiratórias e cardiovasculares crónicas, em particular nos grupos mais vulneráveis da população.
A OMS recomenda um conjunto de medidas e melhores práticas nos diversos setores envolvidos para promover a redução da poluição do ar e para se implementar estratégias de mitigação. Segue, em seguida, uma lista de medidas para a promoção da qualidade do ar ambiente nas cidades e da qualidade do ar no interior dos edifícios:
– Tornar as cidades mais compactas e com uma maior eficiência energética;
– Reduzir o tráfego automóvel dentro das cidades;
– Promover e criar espaços seguros para a realização de caminhadas, a prática de ciclismo e de atividade ao ar livre;
– Criar mais espaços verdes que ajudem a remover a matéria particulada e a reduzir a temperatura média ambiente das cidades;
– Melhorar a gestão de resíduos urbanos;
– Substituir os combustíveis domésticos (gás, carvão, madeira, etc) por fontes com menor emissão e/ou recorrer ao uso de combustíveis mais limpos;
– Melhorar a eficiência energética das residências e prédios comerciais através de isolamento passivo e do uso de ventilação e iluminação naturais.
Algumas destas medidas começam a ser gradualmente implementadas nos grandes centros urbanos, porém nem sempre são bem compreendidas pela população. É importante que a população tenha conhecimento sobre quais são os principais poluentes do ar, as suas fontes de emissão e os riscos associados a essa exposição. Grandes centros urbanos tendem a possuir uma menor qualidade do ar, pelo que medidas de mitigação serão necessárias para promover a qualidade do ar que todos respiram. Uma população informada estará mais bem preparada e recetiva à implementação de medidas e estratégias de mitigação.
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