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Reflexões e outras coisas – curto, médio e longo prazo

Reflexões e outras coisas – curto, médio e longo prazo

Permitam-me a rápida contextualização da presente composição. A mote foi lançada na minha página de uma rede social, no passado dia 7 de junho, com o seguinte exerto:

“Na maioria dos negócios, há muito que os relatórios anuais deram lugar a relatórios trimestrais. Avaliações mensais, reuniões semanais e até análises diárias aumentaram a pressão sobre todos para trabalhar num clima de urgência cada vez maior. Em muitos contextos, o pensamento de longo prazo foi…” (Morris, 2009)

Este excerto foi retirado do Livro de Tom Morris, “Se Aristóteles fosse administrador da General Motors – A alma do negócio”. Um livro que expõe “…como a sabedoria ancestral pode ser usada para otimizar a moral e a produtividade em empresas de qualquer dimensão.”. Um livro que permite refletir, noutra concepção de pensamento, sobre o que é necessário para um desempenho verdadeiramente, e sublinho o verdadeiramente, superior e resultados sustentadamente satisfatórios, numa ótica de liderança positiva. Citando o autor, este livro explica como “…uma boa dose de sabedoria antiga misturada com alguma filosofia contemporânea sobre motivação humana e excelência humana é precisamente do que a empresa moderna, com as suas importantes preocupações de lucro e prejuízo, precisa para estar à altura dos desafios concretos que enfrenta”.  Aconselho a leitura.

O desafio foi simples, pedi ajuda para concluir esta frase. As respostas foram as mais variadas, saliento aqui algumas:

  • Valter Vieira “…colocado de parte em detrimento do pensamento e metas a curto e médio prazo. Muitos negócios acabam por ter um visão “curta” e limitada face às preocupações e desafios do dia-a-dia. Por isso, hoje em dia, para ser um bom gestor há que, para além de olhar para o dia de “amanhã”, olhar para além disso. Só assim as empresas terão sucesso e estarão melhores preparadas para os desafios vindouros.”
  • Ana Cristina De Jesus “…foi abandonado em determimento de uma falsa urgência do “para ontem” . Hoje os negócios estão a ser idealizados para oferecer muito mais num só espaço de modo a que o cliente possa satisfazer o maior número de necessidades possível. Ou seja, estamos a perder, devido a nossa falsa falta de tempo, o conceito de negócio especializado de qualidade. Isto é um erro que vamos pagar caro em breve. E é perceptível que a nossa volta temos copias e copias do mesmo mas o que torna um negócio especial nem é a quantidade da oferta mas sim a qualidade da mesma. A falsa falta de tempo está a acabar com os negocios de qualidade. Aja coragem para inverter esta tendência, tanto dos consumidores como dos empresarios.”
  • Igor Aguiar “…adulterado. As métricas estão completamente erradas. O foco é cada vez maior para tudo o que é imediato dando pouca importância à rentabilidade a médio/longo prazo.”
  • Ana Cristina De Jesus “Igor Aguiar acho que não é bem dar pouca importância a rentabilidade. O imediato, se bem gerido, é rentável também muito devido ao impulso desenfreado da compra. E mais fácil de “montar”. Depende muito do tipo produto/serviço, da moda ou padrão actual de consumo, dos acontecimentos, consciência/maturidade do gestor. Este é um tema que pode ser visto por muitos prismas! Que maldade Luís F. Sardinha !! Estou eu aqui a pensar, o fato de termos avançado muito tecnologicamente e de estarmos impossibilitados de desligar verdadeiramente do comércio (o telemóvel torna-o omnipresente <=> “Deus”), sejamos consumidores ou empresários, faz com que estejamos “obrigados” à resposta “ao instante”. Isto faz com que, conforme o tipo de negócio, podemos perder oportunidades. O consumidor por sua vez, pressiona no sentido em que se não é servido no imediato, bate na porta do lado e se o outro for mais organizado, tem! E abrandar este ciclo não é fácil. A venda com prestação de serviço de qualidade associada torna-se desnecessária no imediato porque o importante foi satisfazer a necessidade na hora (algumas muitas vezes até podia esperar). Só no pós-venda é que o consumidor se dá conta, quando aparecem os problemas, de uma má opção de compra ou serviço. A questão aqui é, porque raio é que hoje já ninguém tem tempo para esperar? E decidindo esperar, qual o tempo de espera aceitável hoje em dia para cada negócio?
  • Ana Cristina De Jesus “A resposta a esta questão é que toda a gente hoje sabe quanto custa tudo mas já não sabe ver quanto vale esse tudo! Falta de tempo (preguiça, ignorância,…?!)…😁😉”
  • Alícia Teixeira “…Foi completamente desvirtualizado em detrimento da cultura do “aqui e agora”. Criou-se a ideia de que apresentar constantes atualizações quantitativas ou qualitativas (por vezes com pouco método, critério e ferramentas) dão maior credibilidade ao negócio/marca, sem analisar o custo ou esforço que isso poderá implicar para a empresa e para os seus colaboradores.”
  • Allen Pinto ““o pensamento de longo prazo foi” longo. A velocidade da informação reduziu o tempo de comunicação. Comunicar, planear ou pensar, se tornaram atos de curta duração, mas com intensidade sem precedentes. Ontem planejávamos o futuro para o futuro. Hoje planejamos o futuro para o final do dia.”.

Em primeiro lugar, tenho de agradecer o excelente exercício de reflexão que estes meus amigos apresentaram. Hoje em dia, em que temos uma resposta pronta na ponta dos dedos, a pura reflexão cai em desuso. Permitam-me então, que apresente também uma reflexão.

Não obstante da distinta forma de expressar os seus pensamentos através dos comentários, vejo que convergem nas conclusões.

De facto estamos numa “sociedade de organizações” (Sousa, 2009). Atualmente, as organizações atuam num ambiente em constante mudança, complexo e competitivo. As organizações emergentes bem como as que operam no mercado devem apresentar vantagens competitivas relativamente a terceiros. O sucesso de qualquer organização depende da sua competitividade. Para isso, a organização deve ser capaz de oferecer de forma sustentável, mais valor aos seus clientes.

Uma organização “…é um sistema social composto de indivíduos com os seus objetivos pessoais e que veem a sua colaboração com e na empresa como uma forma de os satisfazer.” (Sousa, 2009). As pessoas são o ativo mais valioso de qualquer organização. As especificidades de cada indivíduo, as suas ambições e expetativas, a forma individual de ver e encarar o mundo, torna complexa a tarefa de gerir estes recursos de forma justa e equitativa, valorizando e estimulando cada um dos elementos. O ecossistema de uma organização é verdadeiramente marcado por relações humanas, quer internamente, quer com o exterior. A combinação destas variáveis relações humanas, inovação/evolução, contexto competitivo levam a que se considere e padronize, se torne uniforme, dois conceitos temporais: curto e médio e longo prazo. Nos vários livros de gestão, podemos verificar que o conceito de curto prazo está associado a movimentos agilizados num prazo inferior a um ano já o conceito de médio longo prazo tem autores que defendem de 1 a 3 anos e outros que defendem de 1 a 5 anos. O curto prazo está maioritariamente associado a um contexto operacional e o conceito médio longo prazo a contexto estratégico.

A incerteza do futuro, leva-nos a pensar e agir no presente (a maioria de nós). É inato e muito mais seguro pensar dessa forma para muitos de nós. Todos nós reagimos prontamente e de forma positiva a esse estímulo, visto ser mais fácil pensar e agir no curto prazo. No outro dia ouvia: “…o pensamento humano está mais formatado para o pensamento proporcional e menos para o exponencial”. Permitam-me a seguinte analogia, certo que, alguns discordarão.  O curto prazo é isso, temos uma ação e queremos uma reação proporcional, sem complicações no imediato. Daí muitas vezes ouvirmos “o que eu ganho com isso?”. Todo o esforço feito exige uma consequência imediata. Torna-se lógico, tendo como premissa que as organizações são formadas por relações humanas, estas assumam os valores transmitidos por essas relações. Por outras palavras, se as organizações estão viradas para o curto prazo é porque as pessoas que as constituem, agem e pensam dessa forma. As organizações são nada mais que as pessoas que a constituem. O incremento exponencial eleva o pensamento e traduz-se numa forma de atuar, pensar, trabalhar como um todo. Numa organização e no nosso quotidiano materializa-se num pensamento em que o todo é maior que a soma das partes (já dizia Aristóteles), é algo que fazemos hoje para uma situação futura maior. Mas para isso é necessário trabalhar em equipa e ter organizações que valorizem o ativo humano. Posso acrescentar que a volatilidade, a celeridade dos eventos e procura por uma segurança e condições sociais mínimas estamos mais formatados para o curto prazo e pouco para o longo prazo. No entanto não deixamos reconhecer os feitos do longo prazo. Por exemplo o CR7 (Cristiano Ronaldo), ouvimos inúmeras histórias de quem o viu crescer como futebolista. Afirmam que após o término do treino este permanecia a treinar, mesmo que todos tenham ido embora. O pensamento dele, quiçá inconsciente, está formatado no dito longo prazo.

Noutro espectro apresento outro exemplo, algumas pessoas quando começam a prática de exercício físico ou mesmo uma dieta, ao fim de 2 semanas querem resultados. Sabemos que não é assim que funciona se queremos algo a longo prazo. Devemos sim, adotar estilos de vida saudáveis, através de uma prática regular de exercício físico e alimentação saudável, para termos uma mente e corpo são e como consequência dessa atitude ter os tão desejados efeitos na balança.

E então, o que separa estas pessoas?

Não alargando muito sobre este tema (que pode ser uma seca para alguns): Shmotkin e Eyal (2003) citado por (Bajec, 2019) refere que a perspetiva temporal é fundamental para a construção do tempo psicológico, que emerge dos processos cognitivos automáticos responsáveis pela divisão da experiência humana em quadros temporais passados, presentes e futuros. Grande parte da atividade humana é limitada no tempo, quer numa perspetiva cronológica quer numa perspetiva psicológica. A perceção subjetiva do tempo, na forma de duração percebida, sincronia, ritmo de vida e muito mais, bem como nossas perspetivas temporais estão profundamente fortalecidas (Sircova et al., 2014). A perspetiva temporal revela-se um ponto de vista importante para a perceção da existência humana (Kostal, Klicperova, Lukavská, & Lukavska, 2015). A compreensão da perspetiva temporal e um equilíbrio entre passado, presente e futuro são atualmente considerados pré-condições para o sucesso, saúde mental e felicidade pessoal. Por outro lado, a falta de visão de futuro e desequilíbrio entre as perspetivas tendem a causar falhas individuais e conflitos sociais (P. Zimbardo & Boyd, 2008). Zimbardo & Boyd (1999)  desenvolveram o Zimbardo Time Perspective Inventory (ZTPI), que mede cinco dimensões de tempo diferentes, definidas em termos de tempo passado, presente e futuro numa valência positiva e negativa.

Agora questiono: como as organizações pode melhorar a sua prestação?

São várias as respostas e as varáveis a ter em conta, mas uma devo referir: valorizar o ativo humano.

Em tempos li na obra de Covey (2017) que se fala muito em ativo ou mesmo capital humano, numa perspetiva de valorização dos recursos humanos, mas por exemplo a nível contabilístico os recursos humanos são classificados como um gasto.

Porque o trabalhador, as suas skills não são vistas como, por exemplo, um ativo intagível?

Em contabilidade podemos classificar um ativo ou passivo correntes como algo realizável num período até 12 meses e um ativo ou passivo não correntes, como algo realizável a longo prazo (Nabais, 2017). Mas os recursos humanos, são vistos como gastos. Um mercado que de alguma forma valoriza o recurso humano é sem dúvida o futebol. Numa equipa em jogo, temos 11 jogadores a jogar juntos com um objetivo em comum. Ganham todos o mesmo? Quando abre o mercado de trocas e vendas, os contratos são todos iguais, as cláusulas de rescisão são todas iguais? E todo o ambiente quer interno, quer externo que circunda uma equipa, reconhece e valoriza o jogador em questão. Então porque no mercado de trabalho isso não acontece? Porque ainda existe medidas e remunerações rígidas para toda uma classe, sabendo que existe profissionais que se destacam de outros. Será porque o bom é visto como uma ameaça, e não como um acréscimo de valor para toda a equipa, tal como acontece no futebol. No próprio percurso escolar, por vezes o “outlier” é convidado a juntar-se ao resto, apresentando no fim uma distribuição normal.

Deveremos considerar todos pela mesma bitola? Serão todas as organizações iguais? A mesma luneta serve para todos?

Então como mudamos isto?

O atual contexto social e organizativo deve procurar valorizar mais o ativo humano. As organizações com um plano estratégico com foco na produção e lucro devem mudar o seu paradigma e em vez de procurar controlar, devem procurar desenvolver capacidades e competências, desenvolver talentos. O ativo mais importante de uma organização é o ser humano. Uma organização que procure um crescimento sustentável no ambiente competitivo em que se insere, deve procurar valorizar esse ativo. As organizações são tão boas quanto as pessoas que as constituem. É fundamental o papel do gestor, desde o planeamento à organização e direção, bem como no seu controlo. A gestão de uma organização deve considerar todos os fatores aquando o planeamento da sua estratégia. Deve analisar fatores externos, bem como fatores internos, nomeadamente os recursos humanos. Cabe ao gestor harmonizar a interação entre objetivos organizacionais e pessoais. O gestor tem o dever de estruturar um plano para a organização que valorize a satisfação dos objetivos pessoais por parte dos colaboradores, e que assim estes contribuam de forma produtiva para o sucesso e cumprimento dos objetivos da organização. Torna-se assim essencial o gestor dominar o conhecimento de áreas como a motivação e a liderança, bem como as ciências da psicologia e sociologia.

Quem estuda/estudou nas áreas das ciências económicas e empresariais é confrontado na atual literatura com a palavra proatividade. Comumente proatividade pode ser confundido com produtividade. Quem se foca em ser produtivo procura realizar várias tarefas em simultâneo, cumprir prazos. Quem é proativo, procura ver mais além, planeia, assume riscos e procura alcançar objetivos, curto mas também médio longo prazo. Conjugar estas atitudes numa atitude de liderança revela-se um fator diferenciador, quer para o individuo que apresente essas características, quer para a organização para qual ele exercesse a sua atividade. Covey (2017) refere a importância desta atitude, no seu livro “Os sete hábitos das pessoas altamente eficazes”. Ele distingue e analisa dois tipos de pessoas e seus discursos:

Colaborador reativo: “Não existe nada que eu possa fazer”; “Ele deixa-me fora do sério”; “Eu tenho de fazer isto”; “Eu não posso”; “Eu devo”; “As coisas estão piores”.

Colaborador proativo: “Vamos analisar as alternativas”; “Eu controlo os meus sentimentos”; “Eu vou escolher a resposta mais adequada”; “Eu escolho”; “Eu prefiro”; “Qual o caminho que vamos percorrer”.

Para este autor ser proativo é ter a capacidade de fazer com o que o nosso comportamento resulte de decisões tomadas conscientemente, e não de condições externas. Em suma, uma atitute proativa perante relações a diversos níveis (família, amigos, trabalho) traduz-se num ótimo instrumento para uma vida equilibrada.

Uma estratégia, de facto no longo prazo, deve valorizar os seus ativos, já dizia em alguém em conversa:

– Investes tanto na formação dos teus colaboradores, não tens medo que eles abandonem a empresa. Depois de saberem tanto.

– O meu medo é que não saibam nada e continuem a trabalhar na minha empresa.

Agora, no fim, devo agradecer aos que se juntaram a mim nesta reflexão: Valter Vieira, Ana Cristina de Jesus, Igor Aguiar, Alice Teixeira e Allen Pinto. Espero que estes e tantos outros, se juntem a outras reflexões e que este estranho hábito, refletir e questionar, nunca caia em desuso.

Bibliografia:

Bajec, B. (2019). Relationship Between Time Perspective and Time Management Behaviours. Psihologija, 52(2), 197–215.

Covey, S. (2017). Os 7 Hábitos das Pessoas Altamente Eficazes Lições poderosas para a transformação pessoal. (Gradiva, Ed.).

Kostal, J., Klicperova, M., Lukavská, K., & Lukavska, J. (2015). Short version of the Zimbardo Time Perspective Inventory ( ZTPI-short ) with and without the FutureNegative scale , verified on nationally representative samples. Time & Society, 0(0), 1–24. https://doi.org/10.1177/0961463X15577254

Morris, T. (2009). Se Aristóteles Fosse Administrador da General Motors – A alma do negócio. (D. Quixote, Ed.). Alfragide: Guide Artes Grágicas, Lda.

Nabais, C. (2017). Dicionário de Gestão. (E. Plátano, Ed.) (1a Edição). Corroios.

Sircova, A., Van De Vijver, F. J. R., Osin, E., Milfont, T. L., Fieulaine, N., Kislali-Erginbilgic, A., … Boyd, J. N. (2014). A global look at time: A 24-country study of the equivalence of the zimbardo time perspective inventory. SAGE Open, 4(1), 1–12. https://doi.org/10.1177/2158244013515686

Sousa, A. (2009). Introdução à Gestão. (Verbo, Ed.) (1a Edição). Lisboa.

Zimbardo, P., & Boyd, J. (2008). The Time Paradox. (Free Pass, Ed.). New York.

Zimbardo, P. G., & Boyd, J. (1999). Putting Time in Perspective : A Valid , Reliable Individual-Differences Metric. Journal of Personality and Social Psychology, 77(6), 1271–1288. https://doi.org/10.1037/0022-3514.77.6.1271

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