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Eleições Autárquicas de 2025: Entre a Continuidade e a Mudança — Uma Leitura Científica das Sondagens e Dinâmicas Políticas na Madeira e em Portugal

Eleições Autárquicas de 2025: Entre a Continuidade e a Mudança — Uma Leitura Científica das Sondagens e Dinâmicas Políticas na Madeira e em Portugal

As eleições autárquicas de 12 de outubro de 2025 em Portugal representam mais do que um exercício democrático de proximidade: constituem um verdadeiro barómetro político do país e das suas regiões autónomas. Num contexto nacional de fragmentação partidária e erosão da confiança pública, a Região Autónoma da Madeira assume um papel particularmente simbólico. Historicamente governada pelo Partido Social Democrata (PSD), a Madeira vive um momento de tensão entre tradição e transformação, com novos atores políticos a desafiar as dinâmicas de poder local.

Como observam Lisi e Freire (2024), a volatilidade eleitoral que se tem registado em Portugal “é reflexo de um realinhamento estrutural entre valores cívicos, identidades partidárias e confiança nas instituições”. Compreender o comportamento eleitoral madeirense é, assim, também entender o reflexo periférico de um país que, politicamente, encontra-se em mutação. Esta análise propõe-se a interpretar cientificamente as eleições autárquicas de 2025, integrando dados de sondagens regionais (Aximage, 2025), barómetros nacionais (DN/Aximage, 2025) e um enquadramento teórico da evolução do sistema político português. A abordagem metodológica segue uma orientação mista, conjugando elementos quantitativos-descritivos e qualitativos-interpretativos, com base em literatura científica recente e fontes empíricas verificadas.

O cenário político português em 2025 caracteriza-se por uma crescente fragmentação eleitoral, fenómeno amplamente discutido por Magalhães (2024) e Lobo (2025), que o associam à “fadiga democrática” e ao declínio da fidelização partidária. As eleições legislativas de maio de 2025 confirmaram esta tendência: a coligação Aliança Democrática (AD) — composta por PSD e CDS-PP — venceu com 31,8% dos votos, enquanto o Chega e o Partido Socialista (PS) empataram com cerca de 22,8% cada, num contexto de dispersão eleitoral sem precedentes (Wikipedia, 2025). Sondagens subsequentes, como o Barómetro DN/Aximage de setembro de 2025, revelaram um dado histórico: o Chega ultrapassou pela primeira vez os demais partidos nas intenções de voto a nível nacional, com 26,8%, seguido da AD (25,9%) e do PS (23,6%) (DN, 2025). Segundo Freire e Magalhães (2024), este fenómeno exprime “uma polarização assimétrica, onde o populismo de protesto substitui a oposição programática tradicional”.

Em paralelo, o país enfrenta desafios estruturais ligados à descentralização administrativa, acelerada pela aplicação da Lei n.º 50/2018, que transferiu competências em áreas cruciais como a saúde, educação e ação social para as autarquias. Como destaca Carvalho (2025), a descentralização “exigiu capacidade técnica e autonomia financeira que muitas autarquias ainda não possuem”, agravando assimetrias entre o continente e as regiões autónomas. Assim, as eleições de 2025 assumem uma dupla função: funcionam simultaneamente como teste de gestão local e reflexo do descontentamento político e social de âmbito nacional.

A Região Autónoma da Madeira é um microcosmo revelador das tensões e transições da democracia portuguesa. Governada de forma ininterrupta pelo PSD desde 1976, a ilha conjuga estabilidade institucional com desafios à renovação política. Nas eleições regionais de março de 2025, o executivo liderado por Miguel Albuquerque foi reeleito com 43,4% dos votos, ficando a um deputado da maioria absoluta (Silva e Sousa, 2025). O crescimento do Juntos pelo Povo (JPP), que obteve 21,1%, e a queda do PS para 15,6% revelam um realinhamento do eixo político madeirense. Segundo Cruz (2024), o JPP “reconfigura o regionalismo madeirense ao substituí-lo por um populismo de proximidade”, centrado numa lógica de apelo emocional e rejeição das estruturas partidárias tradicionais. O PSD enfrenta, assim, o desafio de preservar a sua base histórica. Lisi (2024) sublinha que “os sistemas políticos de longa hegemonia tendem a gerar resistência à mudança e, simultaneamente, cansaço social”.

Os dados disponíveis sobre as intenções de voto nos municípios madeirenses, embora ainda limitados, sugerem uma vantagem do PSD/CDS no concelho do Funchal, mas com sinais claros de erosão. De acordo com a sondagem Aximage/Diário de Notícias da Madeira/TSF Madeira (outubro de 2025), o PSD/CDS reúne 46% das intenções de voto, seguido do JPP (18,4%), Chega (13,7%) e PS (11,2%), com os restantes partidos e independentes a totalizarem 10,7% (ERC, 2025). A amostra, composta por 403 entrevistas e com margem de erro de ±4,9%, aponta para uma liderança relativa do PSD, já sem o domínio hegemónico do passado. Amaral (2022) recorda que “nas regiões insulares, o poder local é o espaço onde se mede a vitalidade da autonomia”, pelo que a perda de câmaras-chave como o Funchal ou Machico terá repercussões políticas profundas. Em Santa Cruz, base histórica do JPP, tudo indica que o partido manterá a presidência da câmara, com uma vantagem projetada entre 45% e 55%. Machico surge como território competitivo, com possível recuperação do PS, enquanto Câmara de Lobos e Ribeira Brava deverão permanecer sob liderança social-democrata, embora com margens mais estreitas. Nos municípios de menor dimensão — como Calheta, Ponta do Sol, Porto Moniz, Santana e São Vicente —, a força das redes comunitárias e o capital social dos candidatos mantêm-se como determinantes fundamentais. Pereira e Figueira (2024) assinalam que “em territórios de baixa densidade, a reputação pessoal e o capital social do autarca valem mais do que a sigla partidária”.

O caso madeirense reflete uma tendência nacional de erosão do bipartidarismo e de personalização do voto. O crescimento simultâneo de forças anti-sistema, como o Chega, e de movimentos localistas, como o JPP, evidencia uma procura por novos modelos de representação política fora do espectro tradicional. Segundo o Barómetro Edelman Trust (2025), apenas 43% dos portugueses confiam nas instituições políticas, valor abaixo da média europeia (Edelman, 2025). Esta desconfiança manifesta-se através do aumento da abstenção e da adesão ao voto de protesto. Lobo (2025) descreve o fenómeno como “o deslocamento do eleitor racional para o eleitor reativo”, impulsionado por perceções morais e afetivas mais do que por programas ideológicos consolidados. A crise da habitação, o aumento do custo de vida e as desigualdades regionais introduzem novas variáveis no processo de mobilização eleitoral. Apesar da relativa estabilidade económica da Madeira, persistem tensões sociais — nomeadamente no acesso à habitação e na dependência do setor turístico — que influenciam diretamente a perceção do eleitorado sobre a eficácia da governação local. Como nota Carvalho (2025), “as autarquias tornaram-se a primeira linha de resposta social, substituindo o Estado central em funções que antes lhe pertenciam”.

Esta leitura fundamenta-se numa metodologia mista: dados de sondagens nacionais e regionais são analisados de forma quantitativa, enquanto os discursos políticos, a cobertura mediática e a literatura especializada são interpretados qualitativamente. Como defende Creswell (2023), o método misto é particularmente útil “quando a realidade social é demasiado complexa para ser captada apenas por números ou narrativas”, permitindo, neste caso, uma compreensão mais holística dos comportamentos eleitorais e das tendências emergentes.

Três cenários principais podem ser projetados para o desfecho eleitoral na Madeira. O primeiro é o da continuidade mitigada, em que o PSD mantém a maioria das câmaras, mas com perdas simbólicas importantes, abrindo espaço a uma maior pluralização do sistema político regional. O segundo é o da mudança gradual, em que o JPP consolida a sua força em Santa Cruz e avança noutros municípios, como Machico e eventualmente o Funchal, forçando uma redistribuição do poder. O terceiro cenário é o da fragmentação competitiva, com o fortalecimento de partidos como o Chega e candidaturas independentes, o que poderá enfraquecer tanto o PSD como o PS e introduzir novas dificuldades na governabilidade local. As limitações metodológicas incluem a escassez de sondagens robustas, as margens de erro elevadas e a crescente influência do ambiente nacional sobre as perceções locais. Ferreira (2025) sublinha que “a política local é cada vez mais vulnerável aos ventos mediáticos e à instantaneidade digital”.

As eleições autárquicas de 2025 na Madeira constituem, portanto, mais do que um confronto partidário: são uma encruzilhada democrática entre a continuidade e a mudança. O PSD/CDS mantém-se como favorito, mas enfrenta uma erosão estrutural; o JPP consolida-se como força regional alternativa e o PS luta por relevância num espaço político crescentemente competitivo. A nível nacional, confirma-se a tendência europeia de fragmentação e volatilidade, colocando em causa os modelos tradicionais de representação e exigindo reformas profundas na relação entre partidos, cidadãos e território. Como sintetizou Almond (1998), “a democracia local é a arte de governar as pequenas incertezas”. No caso da Madeira, estas incertezas traduzem-se hoje em esperança, desconfiança e desejo de renovação. No dia 12 de outubro, as urnas indicarão se o arquipélago continua a ser bastião da estabilidade ou o prelúdio de um novo ciclo político nacional.

Referências Bibliográficas

Almond, G. (1998). Comparative Politics: A Developmental Approach. Boston: Little, Brown and Company.

Amaral, C. (2022). “Autonomia e identidade política nas regiões ultraperiféricas portuguesas.” Revista Portuguesa de Ciência Política, 10(2), 45–63.

Barómetro Edelman Trust. (2025). Relatório Global de Confiança 2025 – Portugal. Lisboa: Edelman.

Carvalho, J. (2025). Descentralização e governação local em Portugal. Coimbra: Almedina.

Creswell, J. (2023). Research Design: Qualitative, Quantitative, and Mixed Methods Approaches (6th ed.). Thousand Oaks: Sage.

Cruz, M. (2024). Regionalismo e proximidade: o caso JPP na Madeira. Porto: Edições Afrontamento.

DN/Aximage. (2025). Barómetro Político Nacional – Setembro 2025. Lisboa: Diário de Notícias.

Edelman. (2025). Trust Barometer 2025 – Global Findings. New York: Edelman Global.

Ferreira, F. (2025). “O poder local e a confiança cívica.” Política & Sociedade, 34(1), 11–27.

Freire, A., & Magalhães, P. (2024). A Democracia em Mutação: Polarização e Participação em Portugal. Lisboa: ICS.

Lisi, M. (2024). “Volatilidade e fadiga institucional no poder local português.” Revista de Ciência Política Comparada, 29(2), 80–95.

Lobo, M. (2025). Transparência e Responsabilidade na Política Local. Lisboa: Universidade Católica Editora.

Magalhães, P. (2024). O Eleitor Desencantado: O Estado da Democracia Portuguesa. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Pereira, D., & Figueira, A. (2024). Comportamento Político nas Regiões Ultraperiféricas. Coimbra: Almedina.

Silva, R., & Sousa, P. (2025). “Eleições regionais e reconfiguração partidária na Madeira.” Revista Lusitana de Estudos Políticos, 12(1), 57–75.

Wikipedia. (2025). 2025 Portuguese and Madeiran elections. https://en.wikipedia.org/wiki/2025_Madeiran_regional_election

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