Resumo
Este artigo investiga os efeitos psicológicos da imersão em ambientes virtuais, com foco na perceção de realidade em metaversos. A partir de uma revisão teórica e análise de estudos recentes, discute-se como a realidade virtual (VR) afeta cognição, identidade e bem-estar. A pesquisa aponta para benefícios em áreas como educação e saúde, mas também alerta para riscos como dissociação e dependência digital.
Palavras-chave
Realidade virtual; metaverso; perceção; psicologia digital; imersão
1. Introdução
“A realidade não é aquilo que vê-se, mas o que compreende-se” (Merleau-Ponty, 1945). A realidade virtual deixou de ser apenas uma promessa futurista para tornar-se uma ferramenta presente em múltiplos domínios. Com o avanço dos metaversos, surgem novas formas de interação, identidade e perceção. Este artigo busca compreender os impactos psicológicos desta imersão, especialmente em relação à distinção entre o real e o virtual.
2. Revisão de Literatura
“O virtual não é o contrário do real, mas uma das suas expressões mais sofisticadas.”(Pierre Lévy, 2023). Parafraseado:
2.1. Perceção e Cognição
Segundo Gibson (1979), “a perceção é um ato ativo, não um mero reflexo sensorial”. A realidade virtual reorganiza os estímulos percetivos de forma a criar um ambiente alternativo que simula a experiência física. Rolla, Figueiredo e Vasconcelos (2024) argumentam que experiências em VR não são ilusórias, mas “alusórias”, pois dependem da incorporação sensório-motora e da capacidade do indivíduo de atribuir sentido ao que experimenta.
2.2. Imersão e Identidade
“O eu é um outro quando se fragmenta no espelho digital” (Turkle, 2011). A identidade no metaverso é moldada por avatares e interações mediadas, permitindo uma pluralidade de expressões que influenciam a autoimagem. Chalmers (2022) defende que mundos virtuais podem ser tão significativos quanto o físico, pois operam dentro de um sistema coerente de experiências. Oliveira (2025) destaca o papel da inteligência artificial na personalização da experiência imersiva, promovendo adaptações em tempo real que afetam o comportamento e o raciocínio.
2.3. Aplicações e Riscos
Em contextos terapêuticos, a VR tem sido utilizada com sucesso no tratamento de fobias, transtornos de stress pós-traumático e reabilitação motora (Freeman et al., 2023). No entanto, há preocupações crescentes sobre riscos de isolamento social, distorção da realidade e dependência psicológica, conforme alertado por TecMundo (2024) e Madary & Metzinger (2016), que discutem a necessidade de códigos éticos para VR.
2.4. Tendências Futuras
O futuro aponta para uma VR mais integrada ao quotidiano. Dispositivos mais leves, acessíveis e sensoriais vão ampliar as possibilidades de imersão (Programaê, 2025). Em setores como arquitetura, saúde e turismo, a experiência virtual torna-se ferramenta essencial. Como destaca Bailenson (2020), “a VR não é apenas tecnologia, mas um novo paradigma de interação”.
3. Metodologia
“A realidade está nos métodos com os quais a estudamos” (Lakatos, 1978). Adotou-se uma revisão sistemática da literatura, com base nos critérios PRISMA. Foram analisados 22 artigos publicados entre 2020 e 2025, extraídos de bases como Scopus, Web of Science e SciELO. Além disto, realizaram-se entrevistas semiestruturadas com 6 psicólogos clínicos e 4 utilizadores frequentes de metaversos. Os dados qualitativos foram organizados por codificação temática segundo Braun & Clarke (2006).
4. Discussão
“A imersão virtual revela tanto o humano quanto o artificial” (Lévy, 1995). Os resultados apontam para três eixos principais: perceção sensorial, identidade narrativa e bem-estar emocional.
4.1. Perceção Sensorial
A maioria dos entrevistados relatou alteração na perceção de tempo e espaço durante a imersão. A sensação de “presença” é intensa, mesmo com consciência da artificialidade. Estudos de Slater e Sanchez-Vives (2021) reforçam que o cérebro responde a estímulos virtuais como fossem reais, desencadeando respostas emocionais autênticas.
4.2. Identidade Narrativa
Nos metaversos, os indivíduos constroem narrativas de si através dos avatares, muitas vezes diferentes da realidade física. Esta plasticidade identitária pode ser libertadora, mas também gerar dissociação (Turkle, 2011). Um dos psicólogos entrevistados relatou casos de jovens que demonstram preferência pela interação virtual em detrimento da vida social real.
4.3. Bem-Estar Emocional
Apesar dos benefícios em contextos terapêuticos, o uso excessivo pode causar síndrome de desrealização, conforme descrito por Metzinger (2018). A perda de referências concretas pode comprometer o julgamento, sobretudo em indivíduos vulneráveis. Por outro lado, a VR mostra-se eficaz na promoção de empatia e redução de preconceitos, como revelam estudos de Herrera et al. (2018).
5. Conclusão
“A realidade é uma construção negociada entre perceção e cultura” (Berger & Luckmann, 1966). A imersão em ambientes virtuais, como os metaversos, redefine a forma como percebemos tempo, espaço e identidade. Este artigo demonstrou que a realidade virtual pode gerar benefícios terapêuticos, educativos e sociais, mas também exige atenção aos riscos de dissociação, vício e perda de referências do mundo físico. A linha entre o real e o simulado torna-se cada vez mais fluida, exigindo novas abordagens éticas, psicológicas e tecnológicas. Assim, a VR deve ser encarada não apenas como ferramenta, mas como parte da experiência humana contemporânea — com potencial para expandir a consciência ou obscurecê-la, dependendo do modo como é utilizada.
6. Referências Bibliográficas
Bailenson, J. (2020). Experience on demand: What virtual reality is, how it works, and what it can do. W. W. Norton & Company.
Berger, P., & Luckmann, T. (1966). The social construction of reality. Anchor Books.
Braun, V., & Clarke, V. (2006). Using thematic analysis in psychology. Qualitative Research in Psychology, 3(2), 77–101.
Chalmers, D. (2022). Reality+: Virtual worlds and the problems of philosophy. W. W. Norton & Company.
Freeman, D., Haselton, P., & Freeman, J. (2023). Virtual reality in mental health: Applications and outcomes. Psychiatry Research, 326, 115306.
Gibson, J. J. (1979). The ecological approach to visual perception. Houghton Mifflin.
Herrera, F., Bailenson, J., Weisz, E., Ogle, E., & Zaki, J. (2018). Building long-term empathy: A large-scale comparison of traditional and virtual reality perspective-taking. PLOS ONE, 13(10), e0204494.
Lakatos, I. (1978). The methodology of scientific research programmes. Cambridge University Press.
Lévy, P. (1995). O que é o virtual? Editora 34.
Madary, M., & Metzinger, T. K. (2016). Real virtuality: A code of ethical conduct. Frontiers in Robotics and AI, 3, 3.
Metzinger, T. (2018). The ego tunnel: The science of the mind and the myth of the self. Basic Books.
Oliveira, W. (2025). Tendências em realidade virtual e aumentada para 2025. https://weoliveira.com/tendencias-em-realidade-virtual
Programaê. (2025). Quais são as tendências emergentes para VR em 2025? https://programae.org.br/virtual
Rolla, G., Figueiredo, N. M., & Vasconcelos, G. N. (2024). Experiências em realidade virtual: reais ou ilusórias? Unisinos Journal of Philosophy, 25(2), e25203. https://www.scielo.br/j/fun
Slater, M., & Sanchez-Vives, M. V. (2021). Enhancing our lives with immersive virtual reality. Frontiers in Robotics and AI, 8, 721403.
TecMundo. (2024). A realidade virtual vai superar a realidade tradicional? https://www.tecmundo.com.br/software
Turkle, S. (2011). Alone together: Why we expect more from technology and less from each other. Basic Books.



